O Tocantins foi pauta nacional neste domingo, no Fantástico numa reportagem especial mostrando o afastamento de alguns desembargadores do Tocantins. A reportagem foi feita pelo programa junto com a TV Anhanguera no Tocantins.

 

No fim de abril, dia 27, o desembargador Ronaldo Eurípedes de Souza, ex-presidente do Tribunal de Justiça do Tocantins, foi afastado de suas funções. Há dez dias, o afastamento por um ano foi confirmado em sessão virtual do STJ. O desembargador Eurípedes é investigado por venda de decisões judiciais e por movimentações financeiras sem suporte nas suas atividades profissionais, desde que entrou no Tribunal de Justiça do estado, em 2012.
A função de um desembargador é julgar os casos em segunda instância. O Fantástico teve acesso a um levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre desembargadores envolvidos em processos por venda de sentença no Brasil. Na reportagem em vídeo, a repórter Ana Paula Rehbein mostra aos números e algumas vítimas desse crime.

Assista a íntegra da reportagem:

https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2020/06/07/exclusivo-fantastico-revela-como-funcionava-esquema-de-venda-de-sentencas-no-tocantins.ghtml

Veja a íntegra do texto da reportagem:

Desde que o Conselho Nacional de Justiça foi criado, em 2005, vinte desembargadores de nove estados e três tribunais federais foram acusados de vender decisões judiciais. Cinco casos foram só no Tribunal de Justiça do Tocantins. Isso significa que um de cada quatro desembargadores investigados por esse tipo de crime no Brasil trabalhou no Tocantins. (Veja no final da reportagem o posicionamento de todos os citados)

O TJ do Tocantins é o tribunal estadual mais novo de todo o país e foi criado há apenas 31 anos. “Inconcebível que um tribunal pequeno tenha tantos desembargadores envolvidos em supostos ilícitos penais. Em supostas ilegalidades. Em desvios de conduta. Recebemos com muita preocupação, com muita tristeza, mas vamos agir com muito rigor”, diz o ministro Humberto Martins, corregedor nacional de Justiça.
O caso mais recente a entrar no radar do CNJ no estado é o desembargador Ronaldo Eurípedes. Ele era responsável por julgar casos em segunda instância no Tocantins e foi afastado das funções por um ano no último dia 27 de abril. A decisão é do ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça e foi mantida em sessão virtual do STJ.
O magistrado entrou no TJ em 2012 e começou a ser investigado por movimentações financeiras suspeitas, que não têm suporte nas atividades profissionais dele. Em um dos casos, ele teria vendido um habeas corpus para o empresário Carlos Roberto Pereira, em 2013. Pereira é acusado de ser o mandante do assassinato de quatro pessoas da mesma família em Araguaína.
Os parentes das vítimas, que pediram para não ser identificados, relatam que até hoje recebem ameaças. “Para de procurar a polícia, para de acusar meu irmão, porque a gente já gastou demais. E a gente está conseguindo tirar ele, então para porque você sabe: quem manda é quem tem dinheiro. Isso é briga de pedra com ovo. Ele usava muito essa palavra com a gente. Que era briga de pedra com ovo, que a gente era ovo e eles eram pedra”.

Eurípedes teria recebido R$ 300 mil do empresário para conceder a soltura, mas a denúncia nunca foi investigada pelo Tribunal de Justiça do Tocantins. “O presidente do Tribunal simplesmente arquivou. E não mandou apurar nada. Nada! Nada foi apurado”, diz o conselheiro do CNJ, João Otávio de Noronha.
Mesmo com renda familiar de aproximadamente R$ 1 milhão por ano, o desembargador Ronaldo Eurípedes movimentou R$ 11 milhões apenas nos três primeiros anos como desembargador. Só em 2017 foram mais R$ 12 milhões. Ele teria feito compras de fazendas e gado e pagado valores superiores ao que declarou para a receita federal para ocultar o dinheiro.
Boa parte das movimentações financeiras era realizada por Luso Aurélio Sousa Soares. Ele é contratado como assessor e trabalhava de motorista de Ronaldo Eurípedes no TJ. Luso Aurélio ganha um salário de R$ 14 mil. Mensagens de áudio e texto revelam como era a relação dos dois. Em um dos trechos eles tratam do pagamento de R$ 19 mil.

O desembargador diz “Luso, vai agora lá. Procura o compadre. Compadre Gedeon tá te esperando…”. Ao que o assessor responde “Compadre resolveu comigo agora há pouco. Já quinze para as cinco. Aí tá comigo aqui. Vc quer que faça o quê? Põe na Caixa ou no Sicredi? Ou passa pra alguém?”.
O compadre seria Gedeon Pitaluga Júnior, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Tocantins.Ele é investigado por supostamente ser um dos advogados que participou dos ilícitos e dividiu o rendimento com o desembargador.
Além dele, os irmãos Fábio e Juliana Bezerra também são acusados de dividir honorários com Eurípedes. Os dois são filhos de um amigo do desembargador. O ex-procurador-geral de Justiça do Tocantins, Clenan Renault.

Em 2014 o escritório dos irmãos Bezerra foi contratado para negociar uma cobrança retroativa de imposto da Usina Hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães, em Lajeado. A cidade tinha direito a receber R$ 200 milhões do governo do estado, mas fez um acordo abrindo mão de R$ 100 milhões e repassando outros 20%, ou R$ 20 milhões, para o escritório dos irmãos.

O processo teve várias irregularidades, incluindo a aprovação de uma lei que permitia que a prefeitura abrisse mão dos R$ 100 milhões. “Nós não temos dúvida nenhuma de que ela foi aprovada no sentido de dar uma aparência legal no dia 12 de abril de 2014. Ocorre que o acordo entabulado pelo município de Lajeado do Tocantins, pelo governo do Tocantins, e o município de Miracema do Tocantins, esse acordo foi assinado no dia 31 de março”, conta o promotor João Edson de Sousa.
Seis dos onze vereadores da cidade teriam recebido propina para aprovar a medida. “Foi detectada uma quantidade enorme de transações praticadas pelo escritório Melo e Bezerra. Cheques nominais a vereadores do município de Lajeado com assinatura de Juliana Bezerra. De Fábio Bezerra. Pra esses vereadores”, conta o juiz Alan Ide, que bloqueou as contas dos dois irmãos e determinou a quebra do sigilo bancário deles.

E é aí que o caminho de Juliana e Fábio Bezerra se encontra com o de Ronaldo Eurípedes. “Ele suspendeu os efeitos da minha decisão e mandava liberar o patrimônio da indisponibilidade, bem como as quebras de sigilo fiscal e bancário que eu havia decretado para saber o caminho do dinheiro”, diz o juiz de primeira instância.
Em cinco anos, a advogada Juliana Bezerra ligou 229 vezes para o gabinete de Ronaldo Eurípedes. Uma das ligações foi no dia anterior a decisão dele favorecendo a investigada.
Outros casos
Além de Ronaldo Eurípedes, outros quatro desembargadores foram afastados do TJ nos últimos 15 anos. Um deles, não foi julgado até hoje. Amado Cílion já recebeu R$ 6 milhões em salários e auxílios desde que foi afastado em 2011. Se ele for punido com a aposentadoria compulsória, os nove anos sem trabalhar entram no cálculo do tempo de serviço.

“A morosidade desse processo dele ser julgado implica num prêmio para o réu”, diz Fabiano Engelmann, professor de Ciência Política na UFRGS que coordenou um dos poucos estudos já feitos sobre casos no CNJ.
Outro desembargador afastado no estado é Liberato Póvoa, que se aposentou antes de ser julgado. Ele recebia R$ 35 mil por mês até morrer em 2019.
Willamara Leila de Almeida, que foi presidente do tribunal e Carlos Luiz de Sousa, que foi vice-presidente na mesma gestão, foram condenados pelo CNJ há sete anos. Ela recebe uma aposentadoria de R$ 26 mil e ele de R$ 32 mil. Um terço da população do Tocantins, quase 600 mil moradores, vivem abaixo da linha da pobreza.
Confira as notas enviadas pelos citados na íntegra

Tribunal de Justiça

O Tribunal de Justiça ressalta que sempre esteve à disposição de todos os órgãos de controle disciplinares e jurisdicionais (CNJ e STJ), cumprindo integralmente as determinações superiores, sempre colaborando com as investigações já ocorridas desde a sua instalação.
Desta forma esclarece que em 2014 proferiu decisão de arquivamento de reclamação disciplinar contra o desembargador Ronaldo Eurípedes, no caso do Habeas Corpus dos ciganos. O procedimento seguiu os trâmites normativos do Conselho Nacional de Justiça e a decisão foi encaminhada para a Corregedoria Nacional em atendimento ao artigo 28 da Resolução 135/2011 do CNJ, a quem compete apurar eventuais faltas administrativas de desembargadores.
O Tribunal ressalta, ainda, que a regra que norteia a conduta de seus magistrados e servidores, sempre se pautou pela ética, transparência e lisura moral, de forma que, apesar das ocorrências anteriores, essa é uma construção diária do Judiciário tocantinense.

Para finalizar, o Poder Judiciário do Tocantins reafirma o seu compromisso com o cidadão na promoção da Justiça, o que se reflete no cumprimento de diversas metas, inclusive neste período de pandemia. Como comprova o Relatório de Metas Nacionais do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que traz o Tocantins como o primeiro do país em julgamento de processos relativos aos crimes contra a administração pública e improbidade administrativa, entre os tribunais estaduais, atingindo um percentual de 130,68%.

O levantamento mostra ainda que o TJTO bateu outras três das seis metas do segmento Justiça Estadual para 2020. Outro destaque foi para a Meta 8, que trata de julgamento dos processos relacionados ao feminicídio e à violência doméstica e familiar contra as mulheres. Além de ultrapassar a meta no 2º grau com 105,65%, o TJTO alcançou 200% no 1º grau, superando todos os tribunais estaduais nesta instância.
De acordo com o apurado no relatório, o Judiciário tocantinense bateu também a meta 2, que trata do julgamento de processos mais antigos, distribuídos até 31/12/2015 no 1º grau e até 31/12/2016 no 2º grau, alcançando o percentual de 106,54% no 1º grau, 109,15% no 2º grau e 106,97% nos juizados especiais e turmas recursais.
Ronaldo Eurípedes
A defesa do Desembargador Ronaldo Eurípedes, do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins, registra que respeita a decisão do Superior Tribunal de Justiça que determinou o afastamento do Magistrado do cargo e que mantém inabalável confiança no Poder Judiciário.
Relativamente ao patrimônio do Desembargador, este foi construído ao longo de mais de vinte anos de perene exercício da advocacia e produção rural, sendo, por inteiro, vindo de fonte lícita.
O curso do processo demonstrará que nunca existiu venda de qualquer decisão judicial por parte do Desembargador Ronaldo Eurípedes, no mais, quanto aos fatos imputados, a defesa se manifestará nos autos.
O Desembargador segue à disposição do Superior Tribunal de Justiça e todas as autoridades que atuam no processo, como Ministério Público e Polícia Judiciária.
Luso Aurélio
O escritório Alberto Geofre Advocacia Criminal, responsável pela defesa do Sr. Luso Aurélio, esclarece que as declarações infundadas prestadas pelo Sr. Heráclito Botelho, atribuindo grave conduta criminosa a Luso Aurélio, não se sustentarão com as provas que serão, em momento oportuno, carreadas ao processo, por meio documentos e testemunhas, sendo certo que, ao final da instrução processual, restará demonstrada sua inocência, como forma de justiça.
Por outro lado, é importante registrar que o Sr. Luso Aurélio é conhecido no Tribunal de Justiça do Tocantins, local em que trabalha há 7 (sete) anos, pela sua simplicidade, pelo desempenho fiel de suas atividades e, notadamente, pela sua honestidade e respeito aos hierárquicos, tendo sequer respondido qualquer ação penal durante seus 48 anos de idade, o que se denota – no mínimo – que não seria neste momento que iria participar de atividades ilícitas para denegrir sua reputação
Carlos Roberto Pereira
A defesa lamenta muito nesse ponto de dizer que o habeas corpus tenha sido comprado, fato este já comprovado pela polícia federal e apurado minuciosamente pela polícia federal, o que ocorreu na sessão de julgamento foi um empate na votação que favoreceu o réu a época 2013. Ele foi solto e cumpriu todas as determinações da Justiça visando buscar demonstrar sua inocência. Essa situação na época surgiu por força de acusações infundadas diante do inconformismo da parte das vítimas o que compreendemos até certo ponto. Porém lamentamos tudo.
Juliana e Fábio Bezerra
O escritório MELO & BEZERRA ADVOGADOS ASSOCIADOS 8/8 E SEUS SOCIOS refutam com veemência as acusações, sendo descabida a denuncia anonima que deu causa a investigação. Ressaltam que a Policia Federal já concluiu que os mesmos nunca realizaram qualquer transação financeira com o Desembargador afastado, o qual negou o pedido dos advogados mantendo bloqueado do pagamento dos honorários advocatícios decorrente da recuperação de crédito para o Município de Lajeado.
Afirmam também que não possuem qualquer relacionamento com qualquer membro do Poder Judiciário do Tocantins.
Quanto ao recebimento de honorários do acordo do ICMS de Lajeado, reafirmam a plena licitude dos mesmos, tendo referido acordo sido previamente submetido ao crivo do Ministério Publico que anuiu, advindo a homologação judicial do mesmo.
Posteriormente foi submetido e aprovado por diversos órgãos de controle, em especial, o arquivamento de procedimento investigatório criminal, aprovado por unanimidade, pelo Colégio de Procuradores de Justiça do MPTO, que foi acolhido pelo Poder Judiciário e pelo Tribunal de Contas.
Sobre suposta propina a vereadores para aprovação da lei do acordo, a acusação é igualmente infundada, posto que o direito de honorários é previsto em lei federal, nº 50 se vinculando a legislação municipal, não havendo qualquer solicitação dos advogados neste sentido.
Por fim, destacam que o acordo, por eles intermediado, incontestavelmente, trouxe benefícios ao Município de Lajeado, que saltou da 97ª classificação do ranking do IPM para a 3ª posição, tendo hoje a maior renda per capta do Estado do Tocantins. Classificam as investigações como simples perseguição.
Clenan Renault
Clenan Renaut de Melo Pereira foi membro do Ministério Público do Estado do Tocantins por 29 (vinte e nove) anos. Sempre atuou com ética e honradez no cumprimento de sua missão institucional, o que pode ser testemunhado por diversos colegas da carreira.
Está aposentado há mais de dois anos, nunca possuiu e não possui qualquer relacionamento com qualquer membro do Poder Judiciário. Jamais promoveu tráfico de influência para beneficio de seus filhos ou terceiros.
Carlos Sousa
Esclarece que nas suas contas, não foram encontrados recursos provenientes de vendas de decisões. E que não houve evolução patrimonial, conforme auditoria da própria polícia federal, e que todas as declarações de renda foram apresentadas à receita federal.

E nega qualquer acusação de venda de decisões. Acredita que sofreu perseguições: políticas e dentro da própria magistratura.
O desembargador também afirma que não teve oportunidade de se defender no processo que levou a sua aposentadoria compulsória no CNJ! E que entrou Mandado de Segurança no STF contra a decisão do Conselho. O Ministro Barroso decidiu que procurasse as vias ordinárias contra o CNJ.
Quanto a ação penal no STJ, o desembargador informou que teve que recorrer a DPU porque não tem condições financeiras de custear honorários advocatícios. E disse que existe um parecer do vice-procurador da República, se manifestando por desmembrar o processo APN 690, e remeter a Primeira Instância, que até agora não foi decidido.

E por fim declarou que não teve apoio das associações da magistratura para se defender. Asmeto e AMB.
Amado Cilton
Nenhuma das acusações contra o Des. Amado Cilton Rosa foi comprovada. Ele tem demonstrado sua inocência por meio de diversas provas documentais e testemunhais já apresentadas perante as autoridades competentes nos processos que estão em trâmite, atendendo todos os questionamentos e colocando-se sempre à disposição para colaborar com a Justiça.
Willamara Leila
A defesa de Willamara afirma que a sua condenação por parte do CNJ não foi amparada por provas. Willamara refuta de forma veemente todas as imputações lançadas contra si. Informa que a decisão do CNJ e objeto de ação anulatória que tramita perante a justiça federal do Distrito Federal e que se encontra em fase de julgamento. Informa que já foi reconhecida a sua inocência em procedimentos correlatos e que existe farta prova na ação judicial em curso que certamente resultará no reconhecimento da sua inocência. Willamara confia na justiça e aguarda o julgamento final do seu pedido.
Família de Liberato Póvoa
Eu sua esposa, suas filhas e seus familiares sempre acreditamos na inocência dele.
Sabemos que ele era um homem íntegro, de respeito, amante da justiça e um ilustre tocantinense. Amava a sua profissão como ninguém.
É uma pena que tenham tentado manchar a sua brilhante trajetória como juiz e como cidadão.
Tenho certeza que ele adoeceu (foi acometido de um câncer) por ter sofrido tanta contrariedade com estes processos.
Morreu defendendo e afirmando para mim que o acompanhou até o último instante, suas filhas e seus amigos que iria provar sua inocência.
Infelizmente não teve tempo, mas nós acreditamos na sua inocência.

 

Fonte: G1 e Fantástico