O Senado aprovou nesta quarta-feira (22), em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata da reforma eleitoral. O texto foi aprovado por 70 votos a 3, em primeiro turno, e por 66 votos a 3, em segundo turno.
A PEC tem origem na Câmara, onde foi aprovada no mês passado, com a previsão da volta das coligações partidárias nas eleições proporcionais (para escolha de vereadores e deputados).
Serão promulgados pelo Congresso Nacional os pontos aprovados nas duas casas legislativas — não é o caso das coligações, rejeitadas no Senado.
A formação de coligações permite a união de partidos — muitas vezes sem a mesma ideologia partidária — em um único bloco para a disputa das eleições proporcionais (deputados e vereadores).
O mecanismo favorece os chamados “partidos de aluguel”, que tendem a negociar apoios na base do “toma-lá-dá-cá”. Segundo especialistas, as coligações também possibilitam que candidatos com votação expressiva contribuam para a eleição de integrantes de siglas coligadas que receberam poucos votos.
O trecho que previa o retorno das coligações foi retirado pelos senadores após sugestão da relatora, a senadora Simone Tebet (MDB-MS).
A vedação das coligações, aprovada em 2017 pelo Congresso, passou a valer somente em 2020, na eleição para vereadores. Portanto, a regra ainda não foi aplicada em eleição de deputados.
A proposta aprovada pelo Senado mantém a mudança na data da posse de governadores e presidente a partir de 2026 e o “peso dois” aos votos dados a mulheres e negros para a Câmara dos Deputados.
O peso dois será usado para o cálculo de distribuição dos fundos partidário e eleitoral às siglas até 2030 (veja mais abaixo).
Argumentos da relatora
Ao propor a derrubada do dispositivo que permitia a volta das coligações, Tebet apresentou três argumentos principais:
- Distorção do sistema proporcional: para a senadora, a coligação distorce “sistematicamente” a proporcionalidade dos representantes do povo no Legislativo, “uma vez que partidos menores, coligados, podem, mediante concentração de votos, eleger deputados com auxílio dos votos conferidos aos partidos maiores”
- Fragmentação partidária: segundo Tebet, ao levar para o Legislativo parlamentares que não seriam eleitos sem a coligação, o modelo seria um dos “grandes mecanismos” da proliferação dos partidos. A consequência da regra seria, então, o aumento no número de siglas e a dificuldade dos executivos construírem suas bases de apoio parlamentar
- Deturpação da intenção do eleitor: a relatora apontou que a coligação permite, por exemplo, que votos dados a um partido de esquerda possam ser computados a outro partido, a ele coligado, de direita, e vice-versa. Para ela, isso causa uma “distorção sistemática de um percentual variável dos votos”, o que seria inconstitucional.
Ainda segundo Simone Tebet, Casas legislativas fragmentadas podem ser “prejudiciais ao bom funcionamento do sistema democrático” no presidencialismo.
“Muitos partidos implicam em muitos acordos, num investimento maior, portanto, de tempo e recursos políticos para construir e manter coalizões governamentais. O resultado pode ser paralisia decisória, descontentamento dos eleitores, perda de legitimidade dos governos”, argumentou Tebet.
O que foi mantido
O texto aprovado, por outro lado, deu aval para os seguintes pontos que foram propostos e aprovados pela Câmara:
- Mulheres e negros: a PEC prevê peso dois aos votos dados a mulheres e negros para a Câmara dos Deputados. O peso dois será aplicado no cálculo de distribuição dos fundos partidário e eleitoral, entre 2022 e 2030. Pelas regras atuais, servem como base para o cálculo de divisão de recursos dos fundos partidário e eleitoral os votos recebidos pelos partidos nas eleições para a Câmara dos Deputados — ou seja, legendas com melhores desempenhos nas eleições recebem mais verbas. Pela PEC, entre 2022 e 2030, votos em mulheres e negros serão computados em dobro, para fins do cálculo que define os valores a que cada legenda tem direito. “Parece ser um mecanismo eficiente para estimular os partidos a incluírem nas listas de candidatos nomes competitivos de mulheres e de negros”, disse Simone Tebet.
- Sanção a partidos incorporados: pelo texto, o partido que incorpora outras siglas não será responsabilizado pelas punições aplicadas aos órgãos partidários regionais e municipais e aos antigos dirigentes do partido incorporado, inclusive as relativas à prestação de contas.
- Data da posse: por acordo de senadores, a relatora acolheu uma mudança já prevista pelos deputados, que altera a data da posse de governadores (passa a ser 6 de janeiro) e do presidente (passa a ser 5 de janeiro). Hoje, as posses são sempre no primeiro dia de janeiro. A mudança, porém, só valerá a partir de 2026.
- Fidelidade partidária: se o partido concordar com a saída de um deputado ou vereador, o parlamentar não será punido por mudar de sigla. Hoje, vereadores e deputados só podem mudar de partido sem perder o mandato em casos específicos. A relatora, porém, defende que lei ordinária regulamente a questão – para, por exemplo, definir se a regra vale apenas para a anuência de partidos nacionais ou, também, de diretórios regionais.
- Plebiscito municipal: os plebiscitos propostos pelas câmaras dos vereadores serão realizados no mesmo período das eleições municipais. As consultas populares devem ser encaminhadas à Justiça Eleitoral até 90 dias antes do pleito.
O que mais foi rejeitado
Além das coligações, o Senado decidiu rejeitar outros pontos da proposta que veio da Câmara, entre eles:
- Projetos de iniciativa popular: os deputados aprovaram a possibilidade de tramitação de projetos de lei protocolados por eleitores quando houver, no mínimo, 100 mil assinaturas. A senadora Simone Tebet, porém, considerou a quantidade de signatários baixa, uma vez que, hoje, a Constituição exige apoio de, pelo menos, 1% do eleitorado nacional para a tramitação de proposta – isto é, cerca de 1,5 milhão de assinaturas.
- Anualidade nas decisões judiciais: o texto aprovado pela Câmara exigia que decisões jurisdicionais ou administrativas do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) relacionadas ao processo eleitoral fossem tomadas um ano antes para que valessem para o pleito seguinte. Hoje, esse princípio da anualidade vale para alterações feitas pelo Congresso.