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Advogada brasileira é uma das pessoas negras mais influentes do mundo

Quando estava fazendo o processo seletivo para trabalhar para a Microsoft, em 2013, a advogada Lisiane Lemos, 29, foi positivamente surpreendida. “Foi naquela entrevista a primeira vez que eu vi um executivo negro da minha vida. E eu pensei que queria ser exatamente assim”, fala, à Universa, a jovem natural de Pelotas, interior do Rio Grande do Sul. Em outubro deste ano, Lisiane, que é especialista de soluções na Microsoft, foi reconhecida como um dos jovens negros mais influentes do mundo. “Eu quero ter uma carreira de sucesso para motivar outras pessoas, mulheres, como fui motivada ao ver aquele executivo. Foi naquele momento que comecei a pensar sobre a questão da igualdade no mercado corporativo”

A advogada foi uma das premiadas na categoria empreendedorismo do Most Influential People of Africa Descent (MIPAD), da ONU (Organização das Nações Unidas). O reconhecimento veio pela criação da ONG Rede de Profissionais Negros, que trabalha pela inserção de pessoas negras no mundo corporativo. Atualmente, apenas 4% dos cargos de liderança são ocupados por afrodescendentes, de acordo com levantamento do Instituto Ethos.

A ideia da ONG surgiu da troca de experiências que Lisiane teve com outros profissionais negros de outras multinacionais. “A gente se inspirou nos grupos de afinidades. Começamos com encontros, happy hours”, diz. “Depois, empresas procuravam a gente porque estavam interessadas em ter um quadro de funcionários mais diverso”

Segundo Lisiane, companhias estão procurando contratar mais pessoas de grupos vulneráveis não só por uma questão ética. “Há estudos que dizem que empresas com um time diverso têm mais lucro e se mantêm mais tempo no mercado”, fala a advogada. Um levantamento da empresa de consultoria empresarial McKinsey dá conta que a diversidade étnica aumenta em 33% as chances de uma companhia ser mais lucrativa do que as menos inclusivas. Já a diversidade de gênero representa um crescimento de 21%. A razão do aumento de lucratividade seria, de acordo com a advogada, o caldeirão de realidades e contextos sociais. “O mercado se ligou de que pessoas com conhecimentos diferentes, com experiências diversas, traz inovação, novidade e pensamento mais ágil”, fala.

O maior obstáculo, no entanto, ainda é o racismo estrutural que um funcionário negro sofre. “Precisamos vencer, primeiro, esse mito de que vivemos em uma democracia racial, de que racismo não existe no Brasil”, nota Lisiane. “Nosso país é desigual e precisamos mudar isso dentro das empresas”. A própria Lisiane nunca sofreu o racismo explícito, mas já teve situações em que sentiu que as pessoas achavam que ela não merecia estar no lugar em que está. “As micro-agressões são as que mais me afetam. Perguntar se sou mesmo advogada quando mostro a minha carteirinha da OAB, achar que só entrei na Microsoft por indicação”, exemplifica. No entanto, a advogada garante que há muitas pessoas .

Inclusão

Apesar de não trabalhar diretamente com igualdade dentro da Microsoft, Lisiane, que já foi pesquisadora de direitos humanos, sempre foi interessada pelo assunto. Em 2014, a advogada e outros funcionários abriram a filial brasileira do Black at Microsoft, grupo de afinidade interno da multinacional. Ela acumula, ainda, o cargo de uma das líderes do Comitê de Igualdade Racial no Grupo Mulheres do Brasil e é participante do grupo consultivo do Fundo de Populações das Nações Unidas Educação sobre igualdade…

Segundo Lisiane, grupos de afinidade, onde pessoas com vivências parecidas trocam experiências, são importantes, mas as empresas precisam ir além. “Programas de mentoria ajudam pessoas que não estão acostumadas a um ambiente corporativo se sentirem mais seguras e acolhidas”, explica. Este tipo de ação permite que um funcionário tenha um mentor a quem ele pode abordar com questões que vão desde como escrever um e-mail adequado até como criar um bom plano de carreira.

São decisões que contribuem para um ambiente corporativo mais amigável. Lisiane afirma, no entanto, que o próximo passo é a inclusão. “A gente ainda não sabe como acolher essas pessoas. Como é receber aquela pessoa no primeiro dia, como defendê-la se acontecer algo”, diz. “Nós vamos ter que pensar cada vez mais como incluir uma pessoa que vem da periferia, uma mulher em situação de violência ou uma pessoa em processo de adequação de gênero”.

Por isso, o plano de carreira de Lisiane, atualmente afastada da ONG Rede de Profissionais Negros por estar se dedicando a outras iniciativas voltadas à juventude negra, tem como ponto de chegada a cadeira em um conselho administrativo. “É onde as inovações são feitas, as decisões são tomadas e eu quero estar lá”, declara. “Não quero negros nas páginas policiais, mas em revistas como a ‘Forbes’. Que nem eu”.

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