O biomédico guripiense Ikaro Alves de Andrade perdeu a bolsa paga pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). No doutorado, a bolsa é de cerca de R$ 2,2 mil mensais.
Ele está trabalhando no sequenciamento genético dos casos do novo coronavírus no Distrito Federal — estudos deste tipo estão sendo feitos em todo o Brasil, e são fundamentais para entender o comportamento da epidemia.
Ele foi em 1º lugar no programa de doutorado em biologia microbiana da UnB.
Fiquei sabendo (que não teria bolsa) alguns dias atrás. Primeiro fiquei sabendo da Portaria 34 (da Capes), e que estávamos sofrendo sucessivos cortes de bolsas. Depois, liguei para a coordenação do meu curso, perguntando. E aí me disseram que as bolsas estavam comprometidas (cortadas)”, contou Ikaro à BBC News Brasil na tarde da terça-feira (31).
Ele se mudou para a capital federal há alguns anos, para o mestrado. Sua situação econômica o habilitou a usar a assistência estudantil da universidade — o que inclui um alojamento para alunos da pós-graduação.
As regras da UnB determinam, porém, que ele deve deixar o local depois de concluir o mestrado. Contando com a bolsa do doutorado, ele alugou um imóvel próximo à universidade. Mas, agora, não sabe se conseguirá honrar o compromisso.
“Sendo bem honesto: sem a bolsa, sem o financiamento, eu não consigo me manter fazendo a minha tese. Porque, infelizmente, Brasília é uma cidade cara. O custo de vida aqui é alto”, diz ele.
“Eu não consigo me manter só com a ajuda da minha mãe. Não vou conseguir contribuir para o meu país como pesquisador, e me aprimorar na pesquisa da microbiologia”, diz ele. Ikaro diz que seu objetivo, depois de concluído o doutoramento, é atuar como professor universitário.A Portaria mudou os critérios para a concessão de bolsas de pesquisa no país — mas o órgão nega que ele tenha resultado em cortes no número total de pesquisadores apoiados.
O Laboratório de Virologia da UnB, onde Ikaro trabalha, é apenas um dos vários grupos que estão fazendo o sequenciamento genético dos casos do novo coronavírus no Brasil.
No caso da UnB, o trabalho é feito em parceria com os laboratórios da rede Sabin (privada) e do Lacen (Laboratório Central de Saúde Pública) do DF.
“O sequenciamento serve para nós conhecermos a organização genômica do vírus. O sequenciamento ajuda a tentar entender os parâmetros de como o vírus pode se espalhar no território nacional. E uma outra questão é que serve para monitorar os eventos de mutação (do vírus)”, diz Ikaro.
“Esse monitoramento serve para verificar se essas mutações poderão afetar alguma característica biológica do vírus. Por exemplo, reforçar o caráter de patogenicidade (a capacidade de provocar doenças)”, explica ele.
O doutorando é orientado por dois professores da UnB: os virologistas Tatsuya Nagata e Fernando Lucas de Melo. Este último diz que, por enquanto, a “equipe” no laboratório de virologia conta com apenas duas pessoas: ele mesmo e Ikaro.