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Cega, Dona Raimunda desabafa sobre títulos e prega valorização das quebradeiras

Especial Gazeta do Cerrado
A Gazeta do Cerrado entrevistou a Dona Raimunda,77 anos, ex-quebradeira de coco e ícone do Estado. Hoje ela está aposentada e vive com o marido e o filho adotivo no Bico do Papagaio. Dona Raimunda nos informou que está completamente cega dos dois olhos, devido à doença da Cataratas, além disso, ela também convive com a diabetes há 8 anos.
Dona Raimunda foi uma das fundadoras do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), criado em 1991 e atuante nos estados do Pará, Tocantins, Piauí e Maranhão. Devido à idade avançada e as doenças, Dona Raimunda está longe do ativismo, mas afirma que há outras mulheres à frente das causas nos Estados.
A ex-quebradeira de coco já quase não sai mais de sua casa, por isso, ela disse que é difícil o contato com as demais quebradeiras, e ainda completou “ Eu só vejo elas, quando vem aqui me visitar. Eu já não enxergo mais, é difícil sair de casa. ”
Devido sua atuação na defesa dos direitos das mulheres quebradeiras de coco, Dona Raimunda recebeu, em 2003, o prêmio Bertha Luz, concedido pelo Senado Federal às mulheres que tenham oferecido relevante contribuição na defesa dos direitos da mulher e questões de gênero no Brasil.
Em 2005, integrou a lista mundial das mil mulheres que concorreram ao prêmio Nobel da Paz. Em 2009, recebeu o título de Doutora Honoris Causa da Universidade Federal do Tocantins (UFT) e, em 2013, recebeu Diploma Mulher-Cidadã Guilhermina Ribeiro da Silva, da Assembleia Legislativa do Tocantins.
Nossa equipe questionou á Dona Raimunda sobre os títulos já recebidos durante sua vida, ela disse que se sente agradecida por eles, no entanto, avaliou que não mudaram sua vida nem da comunidade em que vive. “ Não mudou em nada, continuo da mesma forma, vivendo do mesmo jeito. ”, disse Dona Raimunda.
Dona Raimunda afirmou que as quebradeiras não são valorizadas como profissionais e completou: “ Eu queria que elas tivessem mais acesso á saúde, aos estudos, tivessem uma moradia melhor, melhor qualidade de vida, por que isso ainda não é visto como profissão e dificulta na hora de aposentar”.
Ela ainda expôs que a diferença das quebradeiras da época dela para as de hoje em dia é que agora elas têm mais informações. “ Hoje em dia melhorou por que elas têm mais conhecimento das coisas, na época do Lula ela melhor para elas. Agora está muito difícil”, informou.
Raimunda Gomes da Silva é protagonistas de um vídeo documentário produzido pelo Cineasta Marcelo Silva, o qual se chama “Raimunda, a quebradeira”.
QUEM SÃO AS QUEBRADEIRAS
Nos estados do Maranhão, Tocantins, Pará e Piauí, estima-se que um contingente de quase 300 mil mulheres vive de coletar o coco babaçu, nativo da região. De sua amêndoa, extraem o óleo vegetal, com o qual cozinham e produzem sabão. Da casca do coco, fazem lenha; da palha da árvore, cestos. Nada se perde.
Mas elas só utilizam para si o excedente da produção. O trabalho de coleta e quebra do coco é árduo e penoso, senão pouca será a amêndoa comercializada no final do dia. Para alcançar resultados, elas se juntam em grupo ainda na madrugada e adentram matas e fazendas. A mão-de-obra infantil se faz bem-vinda.
Sentadas embaixo das palmeiras de babaçu, com um machado entre as pernas, apoiam o coco sobre a lâmina e batem nele com um porrete. O movimento é preciso e se repete automaticamente até o cair do dia.
QUEM É DONA RAIMUNDA
Dona Raimunda, é uma mulher baixinha e corpulenta, de traços fortes. Com um linguajar simples, ela mescla temas cotidianos e toca em feridas sociais em seus discursos, esteja em comunidades agrícolas ou palácios de Governo, sem perder o tom diplomático. Nunca estudou, mas é uma líder nata, de visão política apurada.
Nasceu em Novo Jardim (MA), filha de agricultores pobres, em uma família de 10 irmãos. Casou-se aos 18 anos, mas, em meio a uma relação difícil, decidiu abandonar o marido 14 anos depois e criar sozinha os seis filhos, trabalhando como lavradora. Na sua constante migração à procura de serviço, chegou ao Bico do Papagaio, região desassistida onde moravam 52 famílias.
Para levar trabalho comunitário à região e proteger os moradores das ameaças de grileiros, começou a mobilizar a criação de sindicatos rurais.
Em sua trajetória, foi responsável pela Secretaria da Mulher Trabalhadora Rural Extrativista do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS) e uma das fundadoras da Associação das Mulheres Trabalhadoras Rurais do Bico do Papagaio (Asmubip).
Hoje, Raimunda está em seu segundo casamento, com o também aposentado Antônio Cipriano, e adotou seu sétimo filho, Moisés, órfão de um líder sindical assassinado na década de 1990.
Texto: Colaborou Hellen Maciel
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