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Crianças do povo Ãwa estão sem aula desde início do ano e situação gera revolta

Indígena Kamutaja enviando oficio solicitando extensão da escola, em 17 de fevereiro deste ano – Foto – Divulgação

O Instituto Indígena do Tocantins (INDTINS) recebeu uma denúncia de que as crianças do Povo Ãwa, que vivem no acampamento indígena Itaro, na Ilha do Bananal, estão sem aula desde o início de 2022.

Quem faz a denúncia é Kamutaja Ãwa, presidente da APÃWA-TO, associação do seu Povo, e conselheira fiscal do INDTINS. Kamutaja conta que entregou o ofício à Secretária de Educação e Cultura do Tocantins (SEDUC-TO) solicitando a extensão da escola indígena Inãwébohona em 17 de fevereiro.

Nesta terça-feira, 21 de junho, a Diretoria Regional de Ensino (DRE) de Paraíso informou à Kamutaja Ãwa que o pedido não pode ser atendido, pois, de acordo com o Recursos Humanos da SEDUC geraria ‘deficit’ de professores e não é possível realizar a contratação de novos discentes devido ao período eleitoral. Para atender as crianças e adolescentes Ãwa dois professores/as devem ser contratados/as.

Essa é a segunda recusa da SEDUC à solicitação, a primeira aconteceu no início do processo que foi recusado devido ao baixo número de estudantes a serem atendidos, depois a própria Secretária voltou atrás na recusa, emitindo parecer favorável a abertura de turmas, mas demorou a efetivar a abertura e agora a DRE de Paraíso  alega impossibilidade devido ao período eleitoral.

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O Povo Ãwa não possui terra demarcada, e até outubro de 2021 vivia entre o Povo Javaé, hoje os Ãwa vivem no acampamento Itaro, em área cedida, em 2022 as crianças e adolescentes do Povo foram desvinculados da escola do Povo Javaé e estão a 6 meses sem nenhum acesso à educação. (Veja nota na íntegra no final da reportagem). 

Kamutaja Awã relata que houve uma grande burocracia no processo e se revolta com a negativa: “Eleição não é justificativa, nosso pedido foi feito antes das eleições”.

A ativista relata que desde a pandemia a educação dos meninos e meninas Ãwa estava sendo prejudicada, já que a maioria dos Povos Indígenas do estado não têm acesso à internet, assim as crianças e adolescentes ficaram impossibilitados de acompanhar as aulas online. Agora mesmo com a volta da educação presencial os meninos e meninas de seu Povo seguem sem aulas.
A assessoria de comunicação do INDTINS entrou em contato com a SEDUC a respeito da extensão da escola indígena, mas até o momento não obteve respostas.

A Gazeta do Cerrado entrou em contato com a Secretaria Estadual de Educação (Seduc). Em nota o órgão disse que os estudantes do Povo Ãwa-Canoeiro, que atualmente vivem no acampamento indígena Itaro, na Ilha do Bananal, eram atendidos pela Escola Indígena Tainã, da Aldeia Canoanã, e pela Escola Indígena Iny Webohona, na Aldeia Boto Velho.

Ressaltamos que a Pasta busca atender a atual demanda, surgida em razão do fluxo migratório dos povos indígenas do Tocantins, sendo que está estudando a abertura de uma turma de Educação de Jovens e Adultos (EJA) no acampamento indígena Itaro.

A Seduc destaca que tem atuado com comprometimento para o processo de revitalização dos saberes e cultura do povo Avá-Canoeiro, tendo um olhar específico para esta demanda.

Abaixo confira na íntegra nota de repúdio da Instituição:

Nota de repúdio

O Instituto Indígena do Tocantins repudia a negativa da Diretoria Regional de Ensino de Paraíso à solicitação de extensão da escola Inãwébohona que atenderia os meninos e meninas do Povo Awa. A solicitação foi feita em 17 de fevereiro e ainda assim a DRE de Paraíso alega impossibilidade de atender as crianças e adolescentes Awa por não poder contratar dois professores ou professoras, devido ao período eleitoral.

A inércia e lentidão da Secretária de Educação e Cultura do Tocantins (SEDUC-TO) em atender o pedido do Povo Awa fez com que os meninos e meninas desse Povo ficassem 6 meses sem nenhum acesso à educação. Conforme o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), meninos e meninas devem ser prioridade na prestação de políticas públicas e a educação e o convivo familiar e comunitário são direitos fundamentais indispensáveis ao desenvolvimento de toda criança e adolescente.

Negar o pedido de extensão da escola Inãwébohona é um atentado ao ECA, à Constituição Federal, que também admite a educação como direito de todos e de dever do Estado, e é ainda, uma afronta aos direitos dos Povos Indígenas também assegurado na Constituição Federal desde 1988. A educação, a cultura e autodeterminação são nossos direitos conquistados através de séculos de luta e para os quais o Governo do Tocantins têm, historicamente, fechado seus olhos.

Deixar crianças indígenas sem acesso à educação é negar a elas e a todo o seu Povo a possibilidade de crescimento e de ocupação de espaços de representatividade onde nós temos sido expulsos desde a colonização. A falta de escolas indígenas no território é a imposição direta a seus pais e responsáveis da única alternativa diante da falta de escola indígena: abandonar a floresta, indo para à cidade longe da sua cultura, do seu Povo para possibilitar a matrícula nos meios urbanos, onde estarão expostos à violência e ao racismo.

Negar a educação às crianças e adolescentes originárias é contribuir para o Genocídio indígena, o que é ainda mais grave levando em conta que a negativa foi dada ao Povo Indígena tocantinense que mais resistiu a colonização no século XVIII e foi massivamente morto pelas forças do Estado que tomaram seu território e reduziram uma população de milhares de indígenas a uma única família que hoje ainda luta pela demarcação de seu território.

É vil e maldoso retirar direitos das crianças e adolescentes de um Povo que ainda batalha para sobreviver. O Instituto Indígena do Tocantins Repudia essa retirada e exige que o Governo do Tocantins, a SEDUC e a DRE de Paraíso tomem as medidas necessárias para providenciar de imediato a extensão da escola indígena Inãwébohona.

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Por Karina Custódio – Assessoria Inditins

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