Ícone do site Gazeta do Cerrado

Dormindo mal? Saiba como funciona a glândula que regula o sono

Desenho de um cérebro dentro do crânio humano mostrando a glândula pineal atrás do hipotálamo — Foto: Getty Images

Desenho de um cérebro dentro do crânio humano mostrando a glândula pineal atrás do hipotálamo — Foto: Getty Images

É verdade que existem poucas coisas mais agradáveis do que um sono reparador depois de “cair nos braços de Morfeu”. Outra grande verdade é que passar uma noite em claro acaba com o nosso humor.

Dormir bem é um dos processos fisiológicos de maior impacto no nosso bem-estar diário. Na verdade, a ausência de sono a longo prazo tem efeitos negativos em nossa saúde.

Regulação do sono

 

O sono é regulado pela combinação de dois processos. Por um lado, ritmos circadianos. Por outro lado, o acúmulo de substâncias indutoras do sono no cérebro, como a adenosina. Sua quantidade depende de vários fatores. Entre outros, o tempo que ficamos acordados (mais tempo, mais adenosina) ou a qualidade do sono.

Nosso ritmo circadiano controla o chamado ciclo vigília-sono, dividido em uma fase de repouso (escuridão-sono) e uma fase de alerta (luz-atividade). Eis o motivo pelo qual está relacionado ao nosso comportamento ao longo do dia.

O ritmo circadiano (ou ciclo circadiano) em nossa espécie dura cerca de 24 horas, e o corpo precisa sincronizá-lo com os sinais ambientais. O sincronizador externo mais importante de nosso ritmo biológico é o ciclo claro-escuro.

Dormir bem é um dos processos fisiológicos de maior impacto no nosso bem-estar diário — Foto: Getty Images

Sincronizando nosso relógio biológico

 

A glândula pineal ou epífise é um agente cronobiótico. Isso significa que ela sincroniza nosso relógio interno com o ciclo claro-escuro. Na ausência de luz, esse pequeno órgão cerebral de apenas 120 miligramas produz o hormônio que nos leva ao mundo dos sonhos: a melatonina.

Em alguns animais (peixes, répteis e anfíbios), essa glândula está localizada sob a pele e é capaz de receber informações de luz diretamente. Por isso também é conhecida como “o terceiro olho”.

No entanto, na espécie humana, assim como na maioria dos vertebrados, esse órgão em forma de abacaxi e do tamanho de uma ervilha está localizado dentro do crânio. Portanto, você precisa de maneiras mais complexas para saber se é dia ou noite.

A retina registra a informação da luz, que atinge o núcleo supraquiasmático (SPQ) do hipotálamo (veja o diagrama).

A regulação do sono em humanos. Esquerda: a luz é capturada pela retina. O sinal de luz é transmitido pelo cérebro e impede a liberação de melatonina pela epífise. À direita: à noite, a ausência de luz estimula a produção do hormônio do sono. — Foto: Gráfico feito via Mindthegraph.com

Esta é a estrutura do cérebro responsável por controlar o ritmo circadiano como um relógio biológico. O núcleo informa a glândula pineal, estrela desse processo, para esta sintetizar e liberar melatonina no escuro.

Melatonina, indutora do sono e promotora da saúde

 

Quando nosso relógio interno fica fora de sincronia com os ritmos do ambiente, desencadeia-se um problema.

É o que acontece, por exemplo, quando fazemos uma viagem cuja origem e destino têm fusos horários diferentes (transoceânicos), desencadeando o famoso jet-lag ou síndrome do jet lag.

Nesses casos, é necessária uma fase de adaptação ao novo ritmo adquirido, mais difícil se viajarmos para leste, devido à perda de horas que acarreta.

Às vezes, tomar comprimidos de melatonina é usado para sincronizar com o novo cronograma.

Outro exemplo é o trabalho por turnos, em que o ciclo claro-escuro é alterado.

Durante a noite há uma exposição artificial a condições de alta luminosidade que inibe a produção de melatonina, confundindo esse sistema.

Essas situações podem causar distúrbios do sono e outros efeitos prejudiciais.

Os turnos de trabalho noturno podem causar distúrbios do sono que são prejudiciais — Foto: Getty Images

Esses efeitos ocorrem porque a melatonina não só desempenha um papel fundamental na indução do sono, mas também tem um efeito hipotensor e inibidor da atividade tireoidiana.

Como se não bastasse, esse hormônio noturno é também um antioxidante, neuroprotetor, modulador do sistema imunológico e oncostático, já que controla o desenvolvimento de tumores.

Na prática, a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC) classificou os turnos noturnos de trabalho como “provavelmente cancerígeno para os humanos” (o chamado grupo 2A). Existem vários estudos que apontam para uma maior incidência de câncer de mama em mulheres que trabalham em turnos rotativos por longos períodos de tempo.

Até o comportamento sexual é afetado pela melatonina, cujos níveis aumentam no outono e no inverno devido ao prolongamento das noites. Isso produz uma atrofia ovariana e testicular que diminui a produção de hormônios sexuais. Portanto, a atividade sexual e reprodutiva é reduzida. Esses efeitos são mais evidentes em animais reprodutores sazonais.

Finalmente, foi descrito que em períodos de pouca luz há uma maior incidência de transtornos depressivos. É o caso do transtorno afetivo sazonal, mais frequente nas latitudes mais setentrionais (países nórdicos, por exemplo).

Transtorno afetivo sazonal é causado por pouca luz durante o inverno — Foto: Getty Images

A importância da higiene do sono

 

É importante observar que certos distúrbios graves do sono estão relacionados a algumas doenças mentais. Além disso, a insônia é um fator de risco para o desenvolvimento de depressão. No entanto, os mecanismos subjacentes a esses transtornos são bastante complexos e dependem de muitos outros fatores.

O que é evidente é que a higiene adequada do sono é essencial para o nosso bem-estar físico e mental. Para tanto, a Sociedade Mundial do Sono (WSS na sigla em inglês) propõe uma lista de dez recomendações simples. Isso inclui definir um horário de sono, monitorar a ingestão de cafeína ou praticar exercícios regularmente.

Conhecida a relação entre luminosidade e estado de espírito, poderíamos dizer que o filósofo francês René Descartes (1596-1650) não se enganou quando se referiu à pineal como a própria “sede da alma”. Segundo o filósofo, desse lugar remoto, no centro do cérebro, a alma dirigiria a relação entre o corpo e a mente.

É possível que essa mesma observação espiritual esteja relacionada à dimetiltriptamina (DMT), substância com propriedades alucinógenas produzida na pineal e também utilizada como perigosa droga de consumo. Por esse motivo, a DMT foi chamada de “droga dos deuses” e foi associada a experiências de quase morte.

*Raquel Sánchez Varo, Diego Teófilo Bermúdez Flores e Juan Antonio López Villodres são professores da Faculdade de Medicina da Universidade de Málaga (Espanha), especializados em Histologia (área que estuda os tecidos biológicos).

Fonte: G1

Sair da versão mobile