Encontro realizado em Goiânia, em 2018, que se tornou um marco na organização das mulheres negras no país – Foto: Mariana Maiara
Apesar de serem maioria nas eleições de 2020, as candidaturas negras – considerando pretos e pardos – receberam 42% menos dinheiro dos fundos Partidário e Eleitoral que os candidatos brancos. Isso quer dizer que, de um total de R$ 1,1 bilhão oriundos dos fundos públicos, candidaturas negras ficam com apenas 36% contra 63% destinados a candidatos brancos.
Os dados são retirados das declarações entregues pelos candidatos ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e são compilados pela plataforma 72 horas, que faz o acompanhamento da distribuição dos recursos públicos de financiamento de campanha.
Além da diferença entre negros e brancos, também há desigualdades de gênero. A jornalista Fefa Costa, uma das idealizadoras da plataforma 72 horas, mostra que as candidaturas de homens brancos ainda são as mais bem financiadas dentro dos partidos, independentemente da ideologia. Além disso, ela explica que os repasses de verbas estão desequilibrados quando avaliamos gênero, raça e etnia.
“Nossos estudos demonstram que a cada R$ 1,00 repassado do Fundo Especial para candidatos homens e brancos, apenas R$ 0,08 foi repassado para candidatas mulheres pretas e R$ 0,0018 para candidatas mulheres indígenas”.
O total de repasses do fundo eleitoral declarado por candidaturas masculinas brancas até o momento foi de R$ 459 milhões. Já as mulheres pretas declararam ter recebido R$ 35 milhões.
Para fomentar as candidaturas negras, em agosto o TSE aprovou a imposição aos partidos de que o dinheiro do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral seja destinado de forma proporcional às campanhas de candidatas e candidatos negros. A obrigação passará a valer a partir da eleição de 2022, mas já pode ser aplicada para o pleito deste ano.
A deputada federal e candidata a prefeita do Rio de Janeiro, Benedita da Silva, diz que este financiamento é um passo importante na busca por mais representatividade. “Nossas candidaturas sempre estiveram nos partidos, só não éramos vistas. Sempre fizemos política, inclusive na cotidiana, na política da sobrevivência. Essa conquista não é o final, pois precisamos garantir que estejamos lá, nos espaços de poder”, afirma.
Segundo o cientista político Carlos Jacomes, essa disparidade é um problema estrutural, tanto da sociedade como da conformação política do país. “Tanto os partidos de esquerda como os de direita estão baseados em uma política embranquecida, pois foram fundados pela elite ou por pessoas brancas”, disse. Além disso, é importante perceber onde estão as candidaturas negras, se é em um território pequeno ou grande, com ou sem renda. “Avaliando os indicadores, pode-se avaliar a quantidade de recursos que essas candidaturas irão receber”, completa.
Para ele, quem detém este poder continua ocupando os cargos mais altos, os chamados cargos competitivos, para os quais são destinados a maior quantidade de recursos. “Um candidato a vereador que se declara branco reúne uma grande quantidade de candidatos a vereadores negros para que eles possam penetrar em espaços periféricos, por exemplo. Assim, ele conquista mais votos mas não elege candidatos negros”, explica.
Fefa Costa demonstra essa conformação estrutural. Na plataforma é possível perceber que candidatos como o Bruno Reis (DEM – BA), autodeclarado pardo, recebeu sozinho mais de R$ 8 milhões do Fundo Especial para a sua campanha para a prefeitura de Salvador, enquanto a verba total arrecadada pelo partido para custear campanhas de mulheres negras está na faixa dos R$ 7 milhões.
No Brasil, apenas 35% dos candidatos às prefeituras são negros. Benedita da Silva, percebe que, enquanto primeira senadora negra e única mulher negra na Constituinte, existe um aumento de candidaturas, o que não quer dizer que elas serão eleitas. “Queremos mulheres negras ocupando os espaços de poder. Aqui no Rio, por exemplo, só temos sete vereadoras mulheres e uma negra. Depois de 40 anos de vida pública, quero ser a primeira prefeita negra do Rio de Janeiro”.
Nailah Veleci, cientista política, ressalta que para uma pessoa se candidatar no Brasil é obrigatório que esteja vinculada a um partido político. “Na história do país, a entrada de negros nos partidos só vai acontecer na década de 80, pois o movimento negro era predominantemente composto por pessoas de baixa renda e não-letradas, e o voto para pessoas analfabetas só foi permitido em 1988”, explica.
Fonte: Congresso em Foco