Ícone do site Gazeta do Cerrado

“Gestões de Palmas”: O Garimpo humano, a empreiteira Orelha seca, relatos e a maior frustração de Eduardo Siqueira: “A Palmas de hoje está muito sofrida e orçamento não é de inclusão”; Assista!

Eduardo Siqueira Campos

Maju Cotrim

“Foi uma epopeia, parecia a Serra Pelada, um grande garimpo, mas era um garimpo cujo ouro a ser encontrado era a cidadania”. Essa frase é dele, filho da saudosa dona Aureny , que dá nome aos maiores bairros de Palmas, Aureny III, que é o maior bairro do Tocantins. Filho do governador Siqueira Campos, primeiro prefeito eleito da capital, quem participa hoje na nossa websérie é ele, Eduardo Siqueira Campos.

“Eu sou muito apegado, tenho um apego muito grande com as coisas históricas. E te confesso, Maju, que eu não me dava conta de que eu estava ali fazendo, construindo a história de uma civilização, de uma população, uma história de cidadania, uma história de união, acima de tudo de união, porque estávamos todos chegando, cada um de um jeito, cada um de um lugar, cada um com um destino, cada um com um objetivo, mas todos com um só desejo, morar numa cidade planejada, construir a última capital planejada dentre as unidades federativas. E é sobre isso, Palmas, sabe? Palmas é sobre o destino das pessoas, Palmas é sobre um centro de oportunidades, um centro de excelência na saúde, um centro de excelência na educação. Palmas é um grande acerto, eu diria que pode ser transformado também em um case de estudos para economistas, para os interessados na geopolítica, na arquitetura, no urbanismo e também na questão de orçamentos públicos versus inclusão social, cidadania”, disse.

Ele afirmou ainda: “Eu diria para você que Palmas é um caso completo, porque afinal de contas, Maju, é uma das cidades mais ousadas, principalmente pelos prefeitos na luta por recursos. Todos nós moramos em uma cidade. Essa aqui, de uma maneira muito especial, Maju, quem fala de Palmas tem um brilho nos olhos, sabe? Quem ajudou a fazer, quem pegou aquela poeira, quem conviveu com todas aquelas dificuldades, as pessoas têm um apego muito grande a toda essa história e principalmente a essa cidade”, relatou.

O início…

Ele relembrou os tempos do Caminhão Pipa e até a empreiteira dos Oreias Seca. “quando você tem a possibilidade de fazer um projeto de campanha, de eleger prioridades e começar uma gestão executando aquilo que é prioritário, você está falando talvez de uma cidade já existente, em que você debate com a população, elege aquelas prioridades, mas Palmas não tinha nem como separar uma prioridade. Mas eu acho que das demandas e das necessidades humanas, o homem não vive sem a água. Se você estiver no deserto e tiver para carregar um quilo de ouro, um litro de barril de petróleo ou um litro d ‘água, você vai sair dali com a água, porque assim talvez você vai sair vivo. Então, a questão dos Orelhas Secas e da água em Palmas foi assim”, conta.

Ele segue lembrando: “As quadras foram sendo abertas, entregues à população e de uma hora para outra houve um processo de invasão, muitas ocupações. E mesmo com as nascentes, com os córregos que nós tínhamos, com o Rio Tocantins, que naquele tempo sem o lago era mais distante, a água chegava na casa das pessoas através do caminhão -pipa. Então, o então governador Moisés Rogério Avelino fez um cercadinho, um quadradinho de tijolo na porta de cada casa e o caminhão -pipa parava ali, dava ré e saía com a mangueira e enchia aquele quadrado. E ali era a água das pessoas usarem, Maria José. Você imagina, essa água era pega em ribeirões, era transportada em caminhões -pipa que decididamente não tinham a condição de levar água tratada, não era uma água tratada. E muito menos o armazenamento. A gente estava vivendo no tempo do cólera, era exatamente o período do cólera. E aí era um desespero você chegar e ver as mães ali pegando um pouco daquela água, fervendo para dar para os filhos, pegando água para dar banho. Então, eu soltei um plano emergencial e olhei e falei assim, gente, não vai ter máquina que faça esse trabalho melhor do que o homem, porque era muita gente desempregada, era muita gente chegando. Então, quando se assemelha a Serra Pelada, é porque nós juntamos os trabalhadores, nós fomos dando a tarefa que é a metragem para cada cidadão e ele podia usar a mulher, os filhos, os cunhados, os parentes. E eles pegavam, por exemplo, 20 metros e saíam cavando e tinha que ter uma profundidade, a vala tinha que ficar preparada para receber o cano já. Então, olha, eram milhares de trabalhadores e isso aconteceu no Jardim Aureny, 1, 2, 3, 4, no Taquaralto, nas adjacências, nas Arnos, 31, 32, 33. Então, a cidade era assim, parecia um grande garimpo, mas o que eles estavam fazendo ali?”, relatou.

Publicidade

O 1º prefeito eleito segue contando: “A construção da cidadania, eles estavam fazendo ali o serviço de água tratada e nós terminamos o primeiro ano de 1993 com 5 .700 ligações de água, Maju. Nossa! Mas aí, água tratada. Bom, mas aí a gente está falando das valas. Aí a empreiteira Orelha Seca, porque tinha outra empreiteira no Brasil que chamava -se OAS. Aí a gente fez a EOS, que era a Empreiteira Orelha Seca. E esses trabalhadores cavavam a água, as valas que iam levar a água para a sua casa. Então, veja, enquanto nós cavávamos essas valas, nós tínhamos que furar os poços artesianos. E, mais uma vez, o governador Moisés Avelino, ele tinha mandado furar alguns poços, mas falou assim, olha, ele só cave e eu só pago até 100 metros. E aí eu fui atrás da CPRM, que é uma empresa pública nacional, e nós fizemos, assim, todo um estudo geológico e me cravaram 12 poços artesianos, onde, cavando mais de 250 metros, a gente encontra a água. Nós estamos diante de baixo ou em cima de um grande aquífero, um dos maiores aquíferos do Brasil. E nós marcamos aqueles poços, enquanto a população cavava o vale, eu perfurava o poço artesiano. Mas, Ju, nós tivemos uma vazão maravilhosa, espontânea, era água jorrando nesses poços. Nós construímos caixas d ‘água de 500 mil litros. E em um ano, eu vou te dar a conta, 5 .600 ligações, você coloca aí a média de 5, que é a média de pessoas dentro de uma casa em Palmas, nós colocamos água tratada na casa de 25 mil pessoas no primeiro ano de gestão. Caramba! Olha, são números expressivos, foi uma epopeia e isso faz parte da vida das pessoas. Nunca correu tanto dinheiro da mão das pessoas nos bairros que eu pagava semanalmente. E nunca houve uma alegria tão grande, mas aí ficou um problema. Talvez o meu primeiro grande problema na gestão. O que fazer com os caminhões pipas? Que eram 30, 40 caminhões cujas famílias ganhavam a sua vida com aquele serviço. Nós rapidamente tínhamos trazido, fomos buscar o Ailton Lelis, que no primeiro momento não pôde vir. Aí entra a figura do atual secretário Marcelo Lelis. Nós fizemos o departamento de parques e jardins, nós fizemos o viveiro das mudas e, de repente, nós começamos a plantar e a fazer o urbanismo de Palmas. Então, a gente fez a despedida do caminhão pipa enquanto transporte de água para a população e os colocamos para regar os canteiros e fazer de Palmas já uma cidade florida, bonita, que elevou muita estima. Foram dois momentos. Aquela iluminação que foi feita para o Natal, que eu lembro que foi um dos momentos que Palmas se revestiu de muito orgulho. E quando nós plantamos as flores nos canteiros, fizemos o departamento de parques e jardins e agregamos um programa bonito. Neste dia nasceu Amigos do Meio Ambiente. Maju, nós colocamos milhares de crianças num projeto de inclusão, num projeto de renda mínima e esse programa ficou no coração. Você anda para a cidade e alguém fala, ei, Eduardo, eu sou do AMA, Amigos do Meio Ambiente. Esse foi um dos programas importantes”, conta.

As lembranças não param: “Veja, trabalhador cavando vala ganhando dinheiro, criança lidando com viveiros em um programa de renda mínima. Havia uma rede de proteção social e Palmas cresceu assim. A população se acostumou com pioneiros mirim, Amigos do Meio Ambiente, com o nosso de cada dia, com o PET e com grandes obras. O pai trabalhava na obra, o filho tinha programa social. Foram construídas as grandes escolas e as famílias tinham a certeza do trabalho, a certeza do cuidado com as crianças e renda. Eu te diria que isso tudo está fazendo muita falta hoje. As pessoas lembram com muita saudade disso”.

Para Eduardo, seu maior aprendizado na experiência de ser gestor da Mais Nova Capital do País foi Cuidar das pessoas. Então, eu posso te falar hoje que, com toda a dificuldade daqueles dias iniciais, rodava mais dinheiro na mão dos bairros, das pessoas, elas compravam mais nos mercados locais do que hoje. Então, essa Palmas de hoje, ela é uma Palmas que está muito sofrida, Maju. Você vai nesses bairros, eu vejo que esse orçamento que é muito robusto, é muito grande, ele não é um orçamento de inclusão. E quando o governador Siqueira Campos me mostrava o Tocantins com o Vale dos Fertilizantes, com o ciclo da mineração, com a plantação de eucalipto -paracelulose, com o Vale do Araguaia produzindo grãos, produzindo gado de corte, a pecuária, ele falava aqui, Palmas, meu filho, ela não é uma cidade que tem que ser mantida pelo serviço público ou por funcionários públicos. Ela é uma cidade que vai ser o centro de excelência, onde terão o centro de educação, o centro da medicina, as grandes bancas de advocacia, a sede das empresas e um comércio que propicie, vamos dizer assim, aliás, uma atividade econômica que propicie dinheiro para que haja consumo. O grande problema, Maju, é que essas pessoas estão afastadas da condição de consumo. E aí vem o que eu digo que é a exclusão. Com o orçamento que Palmas tem, nós podemos sim ter uma cidade de inclusão social. Eu digo que nesse momento não está acontecendo. Veja, eu não estou falando da prefeita Cíntia. Aliás, eu quero deixar alguém tranquilo que eu não vim aqui e não irei nessa campanha que se aproxima tomar o lugar de quem escolheu que é a pessoa que bate na prefeita Cíntia. Não quero esse título. Tem coisa melhor para fazer, sabe, Maju? Falar dos problemas que essa cidade tem. Em vez de falar da prefeita, vamos tentar corrigir os problemas”, comentou.

Frustração

“Eu estava fazendo a Escola Técnica Federal. Maju, aquele era um convênio federal que eu conquistei, um projeto que nós elaboramos na prefeitura, junto com os mesmos autores do projeto de Palmas, e ela não ficou pronta na minha gestão. Aí eu posso dizer para você, muita gente não sabe que o IFTO de hoje foi projeto meu. Eu não sabia. Foi uma proposta minha. Eu comecei ele e não consegui concluir, porque o convênio era federal. E, infelizmente, os convênios federais não tinham a facilidade que tem hoje emendas parlamentares, o deslocamento de recursos rápidos. E eu não concluí o IFTO. Então, eu te diria que foi uma frustração eu não ter entregue ele pronto”, comentou.

Ouça aqui em podcast:

Sair da versão mobile