Alunos usam máscara em escola de Lisboa, em Portugal — Foto: Rafael Marchante/Reuters
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020 vai ser aplicado a partir de 17 de janeiro, pouco tempo depois das festas de Natal e de Ano Novo. Segundo infectologistas, já há um agravamento da pandemia de Covid-19, com aumento no número de casos da doença após aglomerações nos feriados.
O Brasil voltou a registrar mais de mil mortes em 24 horas e a ter UTIs próximas à capacidade máxima de lotação. Segundo monitoramento do Imperial College de Londres, no Reino Unido, o índice de transmissão também subiu. Ainda assim, apesar da pressão de estudantes e de entidades, a Justiça negou o pedido de adiar o Enem.
“A curva [de infectados] vai subir. É um momento muito sério”, afirma Daniel Lahr, professor do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP).
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pelo Enem, garante que seguirá regras para evitar a contaminação: redução do número de candidatos por sala, disponibilização de álcool gel nos locais de prova, salas exclusivas para grupos de risco e espaçamento entre as carteiras. Quem tiver sintomas no dia, deverá fazer o exame em outra data.
Será que isso é suficiente para proteger os alunos? Quais os riscos? Como evitá-los? Veja abaixo os principais pontos:
Qual a quantidade máxima de pessoas por sala, para que não haja riscos?
Segundo Raquel Stucchi, infectologista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), não há como especificar uma quantidade máxima de candidatos por sala. O cálculo varia segundo:
- o tamanho do espaço;
- o tipo de ventilação;
- a distância entre as pessoas;
- a obediência aos protocolos sanitários (como uso de máscaras e de álcool gel).
É preciso manter de 1,5 a 2 metros entre as carteiras, no mínimo.
A Universidade de Colorado, nos Estados Unidos, elaborou uma calculadora que estima os riscos de contaminação segundo as condições de cada local. Em uma simulação, foram inseridos os seguintes dados:
- sala de aula de 25 m de largura, 35 m de comprimento e 4 m de altura;
- 30 pessoas;
- 28ºC de temperatura;
- 4 horas de exposição;
- dois domingos de aplicação da prova;
- 100% das pessoas com máscara adequada;
- ventilação natural.
Se houver um candidato contaminado, o risco de um dos outros 29 pegar a doença é de 4,25%, de acordo com a universidade.
Como deve ser a ventilação da sala?
Para menor risco de transmissão do novo coronavírus, a sala de aula deve ter ventilação natural.
Stucchi lembra que estamos no verão, quando as temperaturas são altas na maior parte do país.
“Se estiver muito calor, o ventilador e o ar-condicionado podem ser ligados, desde que as janelas estejam abertas”, diz. “Com tudo fechado ou se não houver janela, eles se tornam vilões que colaboram para a transmissão da Covid.”
O professor Lahr faz uma ressalva. “Há modelos de ar-condicionado com filtro que expulsam o ar do ambiente. São os únicos que não oferecem riscos”, diz.
O uso de máscara é mesmo importante? Quantas levar?
Lahr diz que, para combater o coronavírus, “o efeito da máscara é fantástico”, já que a principal forma de transmissão da Covid-19 é por gotículas de saliva.
“Mas existe também uma segunda via, por aerossóis. São partículas da respiração muito menores, que têm menos risco de chegar até outra pessoa. Só que, em um espaço pequeno, com muita gente, pouca ventilação e um tempo prolongado de convivência, o ambiente fica saturado. A máscara não vai conseguir segurar”, diz Lahr. Por isso, é tão importante manter o ar circulando.
Os especialistas afirmam que o ideal é usar, no mínimo, duas máscaras durante o exame. “No calor, a chance de o tecido ficar úmido com a respiração é grande. Aí, o candidato pode levar uma segunda máscara em um saquinho plástico para trocar. Se pegar transporte público para ir até o local da prova, é bom levar mais outra”, afirma Raquel Stucchi.
Pode tirar a máscara na hora de comer?
Sim. E segundo os especialistas, qualquer momento sem máscara representa um risco.
Para Daniel Lahr, o ideal, se possível, seria evitar fazer o lanche na sala.
“É um tempo muito prolongado de prova. Se for um espaço mal ventilado ou lotado, tirar a máscara traz um perigo seríssimo de contaminação”, diz.
“Pesquisas mostraram que, de todas as atividades flexibilizadas até hoje, os níveis maiores de transmissão da Covid são em restaurantes e bares, justamente onde as pessoas tiram a máscara para comer e beber.”
Mas como ficar mais de quatro horas sem se alimentar? Lahr diz que o ideal seria estabelecer um sistema de revezamento: a cada momento, um pequeno grupo de candidatos sairia da sala para fazer o lanche em um ambiente externo, com bastante distanciamento.
Como isso não está previsto no edital do Enem 2020, Raquel Stucchi dá outra sugestão: tirar a máscara muito rapidamente, apenas para colocar o alimento na boca, e colocá-la de volta logo depois, segurando-a pelo elástico.
“A gente já aprendeu que é possível mastigar de máscara”, afirma. Segundo a infectologista, se o candidato for fazer uma pausa grande e ficar 10 minutos comendo, há o risco de alguém próximo tossir e contaminar quem estiver desprevenido.
“O papel dos fiscais é importantíssimo. Eles precisam garantir que todo mundo esteja de máscara o máximo de tempo possível”, reforça. “A ‘vantagem’ do Enem é que os alunos ficarão em silêncio. Isso diminui os riscos de contaminação.”
Qual cuidado tomar imediatamente antes da prova?
Os especialistas pedem muita atenção nos portões dos locais de prova. É comum que os candidatos se aglomerem ali e deixem para entrar nas salas apenas quando faltar pouco tempo para o exame.
“O melhor é chegar cedo e entrar com calma, sem se juntar a grandes grupos”, diz Lahr.
O Inep anunciou que antecipará a abertura dos portões para as 11h30, justamente com a intenção de evitar aglomerações.
Stuchhi complementa. “Depois de entrar na sala, não é para ficar conversando com os outros candidatos. O ideal é manter o silêncio e ficar de máscara.”
E nada daquela história de deixar pai ou mãe esperando do lado de fora do prédio – é outro risco de contaminação.
Precisa limpar os objetos?
Segundo o Inep, as mesas serão higienizadas com álcool 70%. Mas a infectologista da Unicamp sugere que o estudante leve seu próprio potinho transparente, pegue papel no banheiro e faça a limpeza da carteira antes do início do exame.
E atenção: o ideal é levar a própria caneta. Se, na correria, o candidato esquecê-la em casa, deve comprar o produto e higienizá-lo com capricho.
Impedir a entrada de sintomáticos resolve a questão?
A orientação de não prestar o Enem se tiver com sintomas de Covid-19 é importante – mas não zera os riscos de contaminação.
Segundo Lahr, além dos assintomáticos, existem os pré-sintomáticos: aqueles que já estão doentes, mas ainda não manifestaram os sinais, como febre e tosse. “Podem não ter nada no dia da prova, mas já estarem contaminados, transmitindo o vírus. Vão se sentir mal só depois de uns dois dias”, explica.
Cronograma do Enem
- Provas impressas: 17 e 24 de janeiro
- Provas digitais: 31 de janeiro e 7 de fevereiro
- Reaplicação: 23 e 24 de fevereiro (para pessoas afetadas por eventuais problemas de estrutura)
- Resultados: a partir de 29 de março
Fonte: G1