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Previdência é passo importante, mas não garante retomada do crescimento, dizem economistas

Plenário da Câmara durante votação de destaques da reforma da Previdência nesta quinta-feira (11) — Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

A reforma da Previdência é um passo importante para a melhora da atividade econômica no país, mas, sozinha, não vai garantir um crescimento robusto sustentado ao longo dos próximos anos.

Com a reforma da Previdência encaminhada após a aprovação em primeiro turno na Câmara dos Deputados, o Brasil tem uma agenda extensa para a retomar o crescimento, avaliam os economistas.

A pauta de medidas engloba endereçar uma reforma tributária, melhorar o ambiente de negócios do país, avançar nos projetos de infraestrutura e promover a abertura da economia.

Por ora, os analistas avaliam que uma aceleração do crescimento econômico não deve ocorrer tão cedo. Para 2019, estimam um avanço do Produto Interno Bruto (PIB) abaixo de 1%. O relatório do início de julho de mercado, conhecido como “Focus”, divulgado pelo Banco Central, previa crescimento de 0,85%.

No ano que vem, há expectativa de uma aceleração, mas nada que empolgue muito. Dificilmente o crescimento deve chegar a 2%, ponderam os economistas.

A seguir veja a avaliação de economistas sobre a agenda pós-Previdência necessária para o Brasil retomar o crescimento.

Affonso Celso Pastore, presidente do Centro de Debate de Políticas Públicas e da consultoria AC Pastore

Affonso Celso Pastore durante congresso em Campos de Jordão — Foto: Divulgação/BM&FBovespa

Qual deve ser a agenda do governo pós-Previdência para retomar o crescimento?

AFFONSO CELSO PASTORE: O crescimento econômico requer outras reformas. São reformas extremamente importantes, como a tributária. É a reforma como a que foi proposta pelo Appy (Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal), que está na agenda da Câmara dos Deputados. Também precisamos abrir a economia para o setor externo, aumentar a competitividade da nossa indústria, fazer um forte investimento em infraestrutura. É necessária ainda uma extensa agenda de reformas econômicas que mexam com a produtividade do trabalho, com a produtividade do capital. Com isso feito, eu acho que o Brasil terá condições de adquirir um crescimento econômico sustentável.

Quando o país pode vislumbrar uma melhora do crescimento?

AFFONSO CELSO PASTORE: Nós temos hoje uma renda per capita que está 9% abaixo do patamar que ela estava no início do ciclo (recessivo, em 2014), e são 13 milhões de desempregados. Quer dizer, não podemos esperar que o consumo das famílias seja uma força propulsora da economia. O país tem uma capacidade ociosa na indústria muito grande, e a maturação dos investimentos em infraestrutura é longa, de forma que nós não temos o investimento sendo uma força propulsora. Não temos também impulso vindo das exportações. E, finalmente, não é possível usar estímulos fiscais porque o governo está fazendo o contrário, está fazendo um ajuste. Ele corta gastos. Isso significa que a recuperação da economia é lenta. Não há como sonhar uma recuperação muito forte.

Diante desse quadro, como fica o emprego no país?

AFFONSO CELSO PASTORE: Há um certo sonho de que a simples aprovação da reforma da Previdência produziria uma explosão de investimentos, e o Brasil voltaria a crescer como jamais cresceu no passado. Isso não é verdade. Infelizmente, nós vamos ver o declínio da taxa de desemprego lentamente ao longo do tempo, assim como a recuperação da renda per capita. Será mais rápido se o país andar mais depressa com as reformas, como a tributária, promover a abertura da economia, e fazer as medidas microeconômicas. Portanto, está na nossa mão acelerar essa recuperação. Se nós dormirmos na glória de termos feito a reforma da Previdência, infelizmente a recuperação será muito mais lenta.

Ana Carla Abrão Costa, sócia da consultoria Oliver Wyman

Ana Carla Abrão Costa, sócia da consultoria Oliver Wyman — Foto: Reprodução/GloboNews

Qual deve ser a agenda do governo pós-Previdência?

ANA CARLA ABRÃO: Há três conjuntos de reformas muito importantes. O primeiro ataca o mercado de crédito. O Banco Central já vem trabalhando nisso: há medidas que ampliam o acesso ao crédito e reduzem o custo para a população. Existem medidas voltadas para a infraestrutura. O país precisa retomar a capacidade de investimento, mas o governo federal e os estados não têm essa capacidade. O Brasil precisa atrair investimento privado e isso exige várias medidas, que também estão sendo formuladas no âmbito do governo federal e que vão ter de passar pelo Congresso. E terceiro, precisamos de reformas que tragam maior produtividade para o setor público.

Por ora, estados e municípios não foram incluídos na reforma. Qual é a sua avaliação sobre essa ausência?

ANA CARLA ABRÃO: A não inclusão de estados e municípios tem um impacto muito negativo que não aparece agora no curto prazo, mas que vai aparecer na frente. O déficit da Previdência dos servidores estaduais e municipais é muito grande. O economista Paulo Tafner calculou um déficit em torno de R$ 140 bilhões só em 2019. E esse déficit é crescente. Então, sem uma reforma, o que estamos economizando na reforma federal vai ter de ser desembolsado porque estados e municípios vão recorrer ao governo federal para cobrir seus déficits.

Estados e municípios vão, inevitavelmente, enfrentar um problema?

ANA CARLA ABRÃO: O país vai gastar lá na frente para ter de socorrer estados e municípios que vão colapsar por falta de recursos para cobrir esses déficits e, obviamente, vão bater em Brasília para pedir recursos no governo federal. Os 26 estados e o Distrito Federal precisam de uma reforma da Previdência porque, do contrário, teremos mais situações como a do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro. O problema da Previdência nos estados está contratado. É estrutural.

Marcos Lisboa, presidente do Insper

O economista Marcos Lisboa, em entrevista ao G1 — Foto: Marcelo Brandt/G1

Qual deve ser a agenda do governo pós-Previdência?

MARCOS LISBOA: Há três áreas essenciais para avançar. Não estou falando de grandes reformas. Estou falando em fazer a faxina da casa, arrumar a disfuncionalidade em que o país entrou com uma série de pequenas medidas. Primeiro, a questão tributária. A estrutura tributária brasileira se tornou disfuncional e está asfixiando as empresas do país. A mesma coisa acontece com o comércio exterior. Tem um dever de casa de acertar as tarifas, as barreiras não-tarifárias, a burocracia do comércio exterior. Terceiro, infraestrutura. A gente não vai ver a volta do investimento em energia e transporte com a confusão que se tornou o país para investir em infraestrutura. Você começa um projeto, aí só depois vem as obrigações ambientais e sociais, que podem surpreender. Essa insegurança do investimento em infraestrutura está afastando o setor privado.

Qual será a consequência se o país não endereçar essa agenda?

MARCOS LISBOA: Se não acertar a questão tributária, do comércio exterior e da infraestrutura, a notícia é ruim. O país chegou na situação em que chegou por tentativas precipitadas de descobrir um atalho, inventar uma novidade, desonerar a folhar, dar um crédito do BNDES, dar um estímulo para um determinado setor. Essas medidas precipitadas é que geraram esse caos institucional que a gente vive no ambiente de negócios. É preciso desfazer o que foi feito na última década para que o investimento volte a crescer e o país volte a gerar mais renda. Essa agenda está demorando para avançar. E quanto mais demora para andar, piora a estagnação.

Nos últimos anos, o PIB per capita caiu e o Brasil ficou mais pobre. Como você vê isso?

MARCOS LISBOA: É bem preocupante. Já há algumas décadas o Brasil vem ficando para trás. Para dar um dado, entre 1995 e 2016, a renda dos países emergentes fora da América Latina cresceu quase 130% por trabalhador. Nos Estados Unidos, avançou 48%. E no Brasil, cresceu 18%, 19%. Esse problema se agravou a partir de 2010. Até então, o Brasil não crescia tanto como os emergentes, mas pelo menos a gente crescia como o resto do mundo. Era um crescimento menor, medíocre, mas estava de bom tamanho frente ao que viria depois. A partir de 2010, o Brasil descolou do resto do mundo. Estamos ficando mais pobres, estamos ficando para trás e, quanto mais demorarmos para enfrentar esta agenda de melhora institucional e das contas públicas, mais para trás nós vamos ficar.

Alessandra Ribeiro, responsável pela área de macroeconomia da consultoria Tendências

Alessandra Ribeiro, economista e sócia da Tendências Consultoria Integrada — Foto: Divulgação

Qual deve ser a agenda do governo pós-Previdência?

ALESSANDRA RIBEIRO: O governo tem de agilizar algumas agendas e a principal delas é a do investimento. É preciso avançar no programa de concessões de infraestrutura — rodovias, portos, aeroportos e ferrovias — para o setor privado e, dessa forma, acelerar os efeitos desses investimentos para a atividade econômica e para o emprego. Há outras agendas importantes, certamente, como a reforma tributária, mas essa é uma agenda que vai demorar. É preciso, inclusive, entender qual é o projeto do governo. Isso vai demorar um pouco. Mais imediatamente é agilizar a agenda de investimentos.

O desemprego está elevado, o que também dificulta uma recuperação. Quando será possível ver uma reversão do quadro?

ALESSANDRA RIBEIRO: A Tendências projeta um crescimento da economia um pouco abaixo de 1% neste ano. No ano que vem, um avanço de 2%. A economia ganha um pouco mais de tração a partir de 2021. Nesse cenário, a taxa de desemprego cai muito gradualmente, ainda estimamos taxa de desemprego em 11% ao final de 2022. Mas isso não significa que a economia não está gerando emprego. Está, mas é um trabalho mais informal. Nós esperamos este ritmo de criação de emprego ganhando mais tração, crescendo ao redor de 1,5% ao ano, mas com uma mudança na sua composição, de menos informal e mais formal.

E qual é a expectativa para renda?

ALESSANDRA RIBEIRO: Esperamos um crescimento da renda mais próximo a 1% este ano. Ela ganha um pouco de tração com a mudança de composição de trabalhador menos informal e mais formal. O trabalhador com carteira tem um salário médio um pouco maior. Então, isso contribui para o aumento do rendimento a partir de 2022 e 2023. Quando nós olhamos a massa de renda, que considera tanto a geração de emprego quanto o salário médio real, a massa de renda deve crescer na casa de 2,5% ao longo dos próximos anos.

fonte: G1 Portal de Noticias da Globo

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