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Projeto do TJ ajuda na recuperação de homens que praticaram violência doméstica no TO

Projeto Homem Consciente – Foto – TJ-TO/Divulgação

Falhar, reconhecer, se arrepender e buscar alternativas para seguir em frente. O caminho para a recuperação é longo, mas pode ser percorrido de forma lúcida quando guiado por iniciativas de reeducação e incentivo ao diálogo, como é o caso do Grupo Reflexivo Homem Consciente.

O projeto da Justiça Restaurativa na Comarca de Guaraí, por meio do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) com o apoio do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), reúne homens que respondem infrações previstas na Lei Maria da Penha, nº 11.340/2006.

Segundo dados da Coordenadoria de Gestão Estratégica, Estatística e Projetos, de março de 2022 a fevereiro de 2023, o Judiciário tocantinense registrou mais de oito mil processos de violência doméstica, entre medidas protetivas e casos de feminicídio. Na tentativa de reduzir esses números, o Grupo Reflexivo Homem Consciente já recebeu mais de 50 homens, e concluiu sua quinta edição.

 

“Durante a pandemia da Covid-19 cresceram ainda mais os números de casos de violência doméstica, e em Guaraí, infelizmente, isso também foi uma realidade. E como o Cejusc atua na promoção da cidadania, nós pensamos em trabalhar algo relacionado à orientação de mulheres vítimas e, de alguma forma, os homens, relata a diretora de Secretaria do Cejusc da Comarca de Guaraí, servidora Carla Reis”.

 

Um novo olhar

De todos casos atendidos, apenas uma reincidência, conta a magistrada e coordenadora do polo Cejusc em Guaraí, juíza Gisele Veronezi. “Isso é um resultado significativo que gera certeza da necessidade de continuidade do projeto. As normativas para evitar a violação dos direitos das mulheres têm se mostrado insuficientes e por isso precisamos de novas formas de abordagem e tratamento. De um espaço de escuta ativa e troca de experiências que despertem um novo olhar sobre mulheres e homens na sociedade contemporânea. Vivemos numa sociedade machista, de violência estrutural, e precisamos tratar disso”.

Entre as atividades desenvolvidas, o projeto oferece rodas de conversa, dinâmicas de grupo, exibição e discussão de vídeos, entre outras ações mediadas pelos facilitadores Vitor Martins e Sérgio Mota. Durante o processo, segundo eles, é perceptível o despertar dos participantes para reflexões sobre os atos que os levaram até ali.

“Homens, no geral, são mais fechados em relação aos sentimentos. Nas primeiras reuniões, eles chegam receosos pois enxergam a participação como forma de punição. Mas quando entendem que a proposta não é de julgamento e sim de entendimento e compreensão da comunicação não violenta, eles desinibem e ficam mais participativos”, explica Sérgio Mota.

O reconhecimento de realidades semelhantes, diz Vitor Martins, também contribui para o processo de reflexão dentro e fora do coletivo. “Quando uma pessoa é transformada, passa a fazer a diferença em todos os ambientes que estiver. Então, se, por exemplo, ele vê um colega no trabalho na mesma situação, vai auxiliar e aconselhar, pois ele já viveu aquela experiência”, completa.

Nemildes Bezerra tem 51 anos e trabalha como pedreiro em Guaraí. Os desentendimentos com a ex-companheira foram levados à justiça e ele, além do cumprimento de medida protetiva, foi integrado ao Grupo Reflexivo Homem Consciente. “Antes eu era uma pessoa muito agressiva, tinha dificuldade de ouvir e de me comunicar. Mesmo que eu nunca tenha agredido alguém fisicamente, eu agredia com palavras. Aqui nas reuniões eu busco ser uma pessoa melhor, mais paciente para ouvir e entender o momento certo de falar. Isso me fez reaproximar da minha família, ter um relacionamento melhor, abraçando e sendo abraçado”.

Prevenir para o futuro

Além do trabalho de mediação, acontecem palestras com assistentes sociais e profissionais da saúde, como médicos e psicólogos. Paula Andréia Almeida é psicóloga e no projeto promove a discussão de um novo olhar sobre a masculinidade. “Reunir homens para conversar sobre o machismo deveria ser em caráter preventivo. Mas o tema ainda não é discutido de forma efetiva na educação infantil, nem no ambiente familiar. Isso acaba sendo um costume negativo que lá na frente dá origem a grupos como esse. Aqui trabalhamos de forma preventiva para o futuro, com base nas experiências negativas que esses homens vivenciaram, trazendo um novo significado e, consequentemente, novas escolhas para suas vidas”, relata.

O Grupo Reflexivo Homem Consciente conta também com o apoio do Ministério Público do Tocantins (MPTO). O promotor de Justiça da Família, Infância e Juventude, Fernando Sena destaca que medidas protetivas relacionadas à Lei Maria da Penha não se restringem apenas à mulher, mas abrangem toda a família. “No contexto de conscientização deste grupo reflexivo, o homem, além de resolver sua questão processual, passa a ser um multiplicador dessas ações de não violência dentro de casa, quebrando um ciclo que possivelmente afetaria seus filhos e futuramente os filhos dos seus filhos”.

Diferente em tudo

Nemildes Bezerra pretende olhar para frente, ciente de escolhas, falhas e dos caminhos que pretende seguir. “Hoje eu tenho uma nova família, e pretendo ser mais calmo, tranquilo, atencioso. Diferente em tudo, não é? Meus filhos ficaram felizes quando contei para eles que eu estava participando do grupo. Com fé em Deus a gente vai seguindo em frente buscando não errar mais”, conclui.

Além de atender demandas oriundas de processos da Lei Maria da Penha, o Grupo Reflexivo Homem Consciente está aberto a voluntários que se identifiquem com a proposta e queiram participar dos encontros. A 6ª edição deve começar no mês de maio e os interessados devem procurar a secretaria do Cejusc no foro da comarca de Guaraí, de 12 às 18 horas, ou pelo telefone (63)3464-1042.

Fonte – Ascom TJTO

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