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Relatora nega que novo código eleitoral ajude os “fichas-sujas”, mas projeto é alvo de críticas

Urna Eletrônica - Foto - Divulgação

Sob críticas de que fortaleceria os “fichas-sujas” e um pedido de informações do Supremo Tribunal Federal (STF) provocado por denúncias de irregularidade em sua tramitação, o projeto novo código eleitoral teve a urgência para análise aprovada pela Câmara nesta terça (31). Em jogo estão alterações que, apontam especialistas, podem afrouxar leis como a do Ficha Limpa. A matéria, no entanto, tem a benção do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL) e deve ser levada a plenário na quinta (2). Em posição de defesa, a relatora, Margarete Coelho (PP-PI) nega retrocessos e fala que, uma vez aprovado, o Novo Código eleitoral “traz avanços”.

De acordo com a relatora, o projeto do novo código eleitoral (PLP 112/2021) permitirá uma visão mais clara da legislação que rege as eleições do país. “A ideia é de sistematização das normas afetas ao processo eleitoral. São muitas leis e resoluções incidindo sobre a mesma matéria o que tem promovido muita incerteza e insegurança jurídica”, disse a deputada.

O projeto traz alterações a alguns pontos que tratam sobre a Lei da Ficha Limpa, a quarentena para candidatos do Judiciário e das forças de segurança pública, a transparência na prestação de contas de partidos, a descriminalização de delitos eleitorais, entre outros. As mudanças foram amplamente criticadas por grupos da sociedade civil e parlamentares.

O anteprojeto tenta atualizar um texto de 1965 – assinado por Humberto Castello Branco, o primeiro general da ditadura militar – e conta, em sua versão mais recente, com 902 artigos – bem mais que os 383 atualmente vigentes.

Margarete Coelho destaca que o PLP é uma tentativa de reunir na lei o que antes eram apenas resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ela destaca que cerca de 70% dos artigos previstos já estavam vigentes, mas ainda não estavam dispostos devidamente no código eleitoral. Os outros 30%, acrescentou, se dedicam a atualizar a legislação com regras definidas para novas questões que surgiram, como campanhas em redes sociais, fake news e disparo de mensagens por robôs.

A parlamentar afirma, ainda, que era esperada a resistência ao apresentar o projeto, mas que a Câmara já amadureceu a discussão dos pontos controversos e alcançou o que chamou de “união de forças para uma leitura equilibrada da realidade”.

Críticas

Deputados de oposição divergem do ponto de vista da deputada, e afirmam que a discussão que precedeu a elaboração do texto foi prematura.

As bancadas do Novo e do Podemos, por exemplo, ingressaram no Supremo questionado a tramitação da matéria na Câmara, o que resultou no pedido de informação assinado pelo relator da ação na corte maior, Dias Toffoli.

Parlamentares de outras bancadas também se pronunciaram contra. Para o deputado Fábio Trad (PSD/MS), a análise completa por parte dos deputados dos mais de 900 artigos apresentados na última sexta-feira (27) levariam por volta de mais 3 a 4 meses. Ele questiona a rapidez com que a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) pautou o PLP, e defende que ainda é cedo para discutir o projeto no Plenário.

“Se perguntar para os deputados sobre os pontos do projeto, a maioria vai dizer que não sabe, porque precisa de tempo para analisar. Estamos sem condições de dizer o que é bom ou não no projeto”, afirma.

O grupo de trabalho para alterar o código eleitoral brasileiro foi instituído logo após a posse de Arthur Lira (PP-AL) como presidente da Câmara, em fevereiro deste ano. No passo seguinte, a comissão marcou audiências públicas – o site da Câmara indica que houve sete delas, durante o prazo de 35 dias entre 9 de março e 13 de abril.

Nos bastidores, há o entendimento de que o governo tem pressa em passar o novo código eleitoral. Isso porque só valerão para 2022 as mudanças nas regras eleitorais que estiverem em vigor até a data de 1º de outubro. Até lá, o PLP 112/2021 precisa ser aprovado na Câmara e no Senado, e só depois segue para sanção do Planalto.

Entenda os principais pontos do projeto

As principais críticas são sobre dispositivos que tratam de alterações no prazo de inelegibilidade de candidatos disposta na Lei da Ficha Limpa, a transparência na fiscalização de gastos dos partidos políticos, a descriminalização de delitos ocorridos no dia da eleição, a quarentena de candidatos do Judiciário e das forças de segurança pública, e censura na divulgação de pesquisas de opinião em dias de votação.

Para os esclarecimentos, o Congresso em Foco conversou com Marcelo Weick, advogado especialista em direito eleitoral da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral Político), um dos responsáveis pela condução do grupo de trabalho que ajudou na elaboração do projeto.

Inelegibilidade de 8 anos

O novo texto garante que o prazo de inelegibilidade de 8 anos, já disposto no código em vigor, seja respeitado. Atualmente a morosidade dos processos na Justiça fazem com que esse prazo seja estendido, permitindo que o candidato seja penalizado por maior tempo.

Para isso, foi alterado o tempo de início da contagem do prazo para a partir do momento da condenação por um colegiado, e não após o término do cumprimento da pena, como é feito hoje.

Auditoria de gastos dos partidos

Atualmente é de responsabilidade do TSE receber e auditar os gastos dos partidos políticos. Essas análises são feitas anualmente pelo órgão, e caso encontrada um desvio, a aplicação da sanção é demorada e acaba recaindo sobre uma gestão diferente da que cometeu a irregularidade.

Para corrigir isso, o novo código permite que os gastos partidários sejam auditados complementarmente por empresas privadas, estas credenciadas pelo TSE. Segundo o especialista, a análise das contas pelo tribunal ainda se faz obrigatória. A diferença está na possibilidade de se acompanhar os processos com ferramentas privadas pensando na celeridade dos processos.

“Uma auditoria aponta uma irregularidade, mas também a solução. A Justiça Eleitoral é exclusivamente repressiva, não tem uma atuação preventiva ou educativa. Já a auditoria privada constrói uma educação contábil”, afirma. Weick completa que o artigo em questão foi criado a partir da ideia da autonomia partidária, uma vez que as siglas são entidades de pessoa jurídica de direito privado.

Diminuição de crimes eleitorais

O novo código prevê a descriminalização de condutas como a boca de urna e o transporte irregular de eleitores, mas que agora passam a ter multas avaliadas de R$ 5 mil a $ 100 mil reais. A alteração foi justificada devido à baixa solução de ocorrências destes tipos penais uma vez que a pena definida pelo texto em vigor é considerada pequena.

Pesquisas de intenção de voto

O PLP censura a publicação de pesquisas eleitorais a partir da véspera da votação. Hoje a lei permite que a divulgação das pesquisas seja feita até o horário de início da votação.

Também fica proibida a realização de pesquisas financiadas com recurso da própria empresa, a não ser que se trate de levantamentos de empresas jornalísticas.

Quarentena estendida

Determina que candidatos membros das forças de segurança pública, como militares e policiais, e integrantes do Judiciário, como juízes e servidores do Ministério Público, deverão desocupar seus cargos por, no mínimo, 5 anos antes de lançar uma candidatura. Hoje esse prazo é de 6 meses antes da eleição.

O dispositivo foi muito criticado por membros das instituições enquadradas na regra. Em contrapartida, há um consenso entre especialistas em direito eleitoral e parlamentares de que o prazo deve sim ser entendido, uma vez que tais classes são de grande influência no meio político.

Fonte: Congresso em Foco

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