Maju Cotrim
Um sábado chuvoso na capital. Pouco movimento nas ruas. Numa fazenda na região sul da capital um grupo de mulheres prepara legumes, verduras e temperos.
De máscaras, com olhares fortes e desejo de superação as mulheres que são internas na Fazenda da Esperança tiveram um sábado diferente. Aprenderam com a mestre Val os segredos das saladas.
Atentas, elas pegaram os macetes e dali no futuro sairão várias saladeiras. A busca por espaço no mercado de trabalho é um dos desafios das mulheres que se recuperam na comunidade terapêutica, Fazenda da Esperança.
Atualmente são sete em busca de transformação de vida após a dependência química e alcoólica. A Fazenda completa 9 anos este mês com a marca de cerca de 90 mulheres atendidas. O tratamento e de um ano. A Casa acolhe mulheres sem distinção de cor ou situação. Faz pontes entre mundos.
Demorei uma hora para conseguir chegar na sede da Fazenda em Palmas neste sábado para registrar o curso. Me perdi em busca do endereço e quando cheguei lá para fazer a reportagem me deparei com aqueles olhares de esperança. Na hora pensei: como pude pensar em desistir de achar o endereço se aqui estão mulheres lutando para superar é justamente não desistirem de transformar suas vidas?
Parece simples mas não é. Uma carga emocional e social que precisa de ajuda e acompanhamento. O trabalho da Fazenda da Esperança abre as portas para este processo e a sociedade como um todo precisa apoiar. Em tempos cada vez mais virtuais acolher, amparar e se doar tem sido difíceis mas iniciativas assim provocam a sociedade a esse chamamento humanitário.
O curso de hoje foi promovido pela Empresa Recriar Vida do empresário e ex-Fazenda da Esperança, Ricardo Ribeirinha. Ele organizava cada detalhe acompanhado de sua filha de 3 anos Eloá, já aprendendo ali desde cedo a importância da solidariedade. Na cozinha, de toca e com a mão na massa estava sua esposa, a administradora Jucy Nascimento. Uma família exemplo de empatia e envolvimento social. Acolher mulheres em situação de vulnerabilidade social é sobre isso. “Um dos princípios do Frei Hans sempre é acolher sem nenhuma distinção. Este trabalho aqui é de resgate de vidas”, disse. Ribeirinha junto com outros sócios tem uma empresa referência na área de combate ás vulnerabilidades sociais.
Em conversa com as mulheres noto muita timidez mas esperança. A mesma que está no nome da Fazenda… cada uma delas tem sonhos e buscam a superação. “Estou feliz em poder aprender algo novo é uma profissão”, disse uma delas.
Conheci o interior da casa. Tudo organizado, berço para os bebês. Aliás: que visão humanitária ao não separar mães e filhos Neste processo de reconstrução de mulheres a fé é uma aliada da Fazenda da Esperança.
Que projetos como esse se ampliem no Tocantins onde há tantos homens e mulheres nesta situação de vulnerabilidade social.
De interna a coordenadora
A Casa na capital é coordenada por Jaqueline Silva Guimarães de 47 anos. Ela me conta como funciona a Fazenda. Jaque recebeu tratamento também na Fazenda e hoje é voluntária.
“É uma experiência incrível. À princípio, eu queria fazer minha recuperação e voltar para minha família, mas foi nascendo dentro do meu coração um desejo grande de estar fazendo pela comunidade aquilo que eu recebi, e de graça”, disse á Gazeta.
“Primeiro, eu me propus a ficar mais seis meses depois do meu tempo. E as coisas foram tomando essa proporção. Recebi o convite para vir para cá. Cheguei em Palmas, a fazenda precisava de alguém que se doasse, cuidasse, que tivesse a disposição das meninas, e eu senti que era Deus, né, no meu coração. Um chamado de Deus para eu me doar mais um pouco, e aceitei o desafio. Estou aqui e estou muito feliz. A Fazenda está comemorando nove anos esse mês”, conta emocionada.
Ela demonstrou a felicidade com o curso levado neste sábado, 20.
“Ganhamos esse presente da empresa Recriar, que é oferecer esse curso para as meninas de capacitação, para que elas possam voltar para o mercado de trabalho após a recuperação, existe essa preocupação, como vai ser a vida? São mães, são mulheres, são donas de casa que precisam também ter o recurso para continuar a vida. Então, a Fazenda também oferece esse recurso de qualidade de vida após recuperação”, comentou.
A rotina na Casa é variada. “Pela manhã tomamos o café, fazemos meditação, depois é feita a divisão de trabalho. Uma fica responsável pela cozinha, a outra pela casa, as outras pela padaria. Confeccionamos aqui bolachinhas, pão caseiro, que levamos para comercializar. O fruto desse comércio é revertido todo em benéfico da próprios Fazenda. Pagando as despesas, custeando algum remédio e alguma coisa que as meninas tenham necessidade”, conta.
Boas notícias
Enquanto estava na Casa recebo um áudio do senador Eduardo Gomes, entusiasta e apoiador da Fazenda, anunciando que em breve vai destinar mais recursos e terá mais boas notícias para o projeto. O senador foi crucial para que as vagas nas comunidades terapêuticas em todo o país fossem aumentadas.
A Fazenda da Esperança
Com 35 anos de experiência na recuperação de dependentes químicos, a Fazenda da Esperança é uma comunidade terapêutica, a maior obra da América Latina, que regenera vidas e famílias. Ao todo, são 130 unidades espalhadas pelo mundo. Desse montante, 86 estão distribuídas pelo Brasil, enquanto as outras estão espalhadas em 22 países do mundo.
O sucesso da Fazenda da Esperança, se deve ao programa de recuperação, o qual se baseia em processos pedagógicos que elevam a autoestima e resgatam a dignidade dos seus acolhidos, que em 2017 assistiu em média três mil jovens e suas famílias. Esse programa de recuperação é baseado em um tripé que consiste basicamente no trabalho, na espiritualidade e na convivência. Tanto que todos os acolhidos vivem numa irmandade que de tão unida é capaz de devolver aos acolhidos o real sentido da vida, do amor a si e ao próximo, bem como da importância da comunhão.
Além disso, a Fazenda da Esperança também trabalha junto à família, pois ela é uma das peças fundamentais para o sucesso da recuperação do jovem acolhido, através do Grupo Esperança Viva (GEV). O objetivo da ação é estruturar a família, mas mesmo quando ela não atende a esse convite – que não tem caráter obrigatório – o tratamento continua e o jovem recuperado tem a oportunidade de amar a sua gente como ela é.
No tocantins a Fazenda da Esperança conta com 4 unidades nas cidades de Dianópolis, Lajeado, Porto Nacional e Palmas.
Aquele que tiver interesse em fazer uma doação e/ou desenvolver atividades de voluntariado na ONG, pode entrar em contato com a Unidade a partir dos seguinte números de telefones:
Escritório: (63) 3225-3716
Fotos: Gazeta do Cerrado