O fenômeno se repetiu durante os três dias da convenção – outros estandes, como Frozen e Piratas do Caribe, tinham bom público, mas nada se comparava à mini Wakanda de Anaheim. No último dia, um grupo de alunos de uma escola predominantemente negra fazia o tour de Wakanda guiados por dois professores. Um dos alunos não saía de frente do imenso cartaz do filme. Quando o professor lhe perguntou por que não saía de lá, o menino respondeu: “É que nunca vi uma coisa assim antes. Nunca vi heróis que se parecem comigo.”
Este, entre outros, é o grande triunfo de Pantera Negra, o mais recente lançamento da parceria Marvel-Disney que já é um sucesso antes mesmo de chegar às telas (nos EUA, o filme estreia dia 13; e, no Brasil, dia 15 de fevereiro). Estudos de audiência – feitos com base em exibições-teste, antes que as primeiras resenhas, altamente positivas, fossem publicadas depois da première dia 29 de janeiro — estimam uma renda de 150 milhões de dólares apurados apenas no primeiro fim de semana na América do Norte.
A previsão já foi, em parte, confirmada: a empresa Fandango, maior vendedora de ingressos antecipados dos EUA, revelou que o ritmo de compra para Pantera Negra é o maior que a empresa já teve, nesta época do ano, ultrapassando os recordes anteriores de Jogos Vorazes, em 2012, e A Bela e a Fera, em 2017; suas pesquisas de intenção de compra corroboraram as da Disney – 88% das amostras de público revelaram interesse espontâneo (não motivado por publicidade) no filme. “Não é apenas um outro filme de super-herói, é um acontecimento cultural”, afirmou Erik Davis, executivo da Fandango.
Se todos esses prognósticos se confirmarem, Pantera Negra será o filme da Marvel de maior sucesso entre todos os que foram lançados neste período ( o atual recordista é Guardiões da Galáxia Vol.2, com 146 milhões de dólares no lançamento) e ficando atrás apenas de Star Wars: O Útimo Jedi (209 milhões de dólares) e A Bela e a Fera (175 milhões de dólares) em bilheteria de estreia.
Será também — provavelmente sua estatística mais potente — a maior bilheteria de estreia de um filme dirigido por um afrodescendente (Velozes e Furiosos 8, dirigido por F. Gary Gray, é o atual recordista, com 100 milhões de dólares) e, possivelmente, a maior bilheteria de um filme com um elenco predominantemente negro (Straight Outta Compton: A História do N.W.A., também dirigido por Gray, é o atual recordista).
O sucesso anunciado de Pantera Negra é a coroação de um projeto que vem norteando a Disney há duas décadas: a agregação de todas as faixas de público, em todas as categorias sociais, culturais e étnicas, ao universo Disney. De Mulan,em 1998, a Viva – A vida é uma festa, em 2017, e agora com Pantera Negra e, em breve, com Uma Dobra no Tempo (dirigido por Ava du Vernay e com um elenco multiétnico), o projeto está se tornando realidade.

“A pergunta essencial que fiz a mim mesmo, quando disse “sim” a este projeto foi “o que quer dizer ‘ser africano’? Não ‘negro’, não definido unicamente por um elemento externo, mas algo mais profundo, o que é ‘ser africano’”, diz o diretor Ryan Coogler, numa ensolarada tarde de inverno em Los Angeles, na cobertura de um hotel de luxo (que também faz parte do império Disney). “Que efeito este termo tem sobre mim, como pessoa, como isso influencia os caminhos que escolho ou como as pessoas me veem. Todas essas perguntas estão integradas ao meu filme.”
Aos 31 anos, Coogler tem uma breve e fulminante carreira que começou em 2013 com o sucesso indie Fruitvale Station (premiado na seção Un Certain Regard de Cannes) e continuou com uma inesperada releitura do icônico personagem Rocky, em Creed, sucesso de bilheteria em 2015. Coogler é a etapa final de um longo processo que começou em 1992, quando Wesley Snipes, no auge de sua carreira, anunciou que tinha comprado os direitos do personagem Pantera Negra e estava desenvolvendo um filme com as bênçãos de Stan Lee. O projeto andou por quatro anos, John Singleton e Mario Van Peebles foram anunciados como diretores, mas acabou não indo adiante, e Snipes acabou se dedicando a outro super-herói Marvel, o vampiro Blade.
Singleton (Os Donos da Rua, Shaft e a série de TV Snowfall) reemergiu em 2007, quando a Marvel estudava uma aliança com a Paramount para um pacote de 10 filmes – mais uma vez roteiristas foram contratados, esboços de roteiros foram criados, e nada aconteceu. A aquisição da Marvel Entertainment pela Disney, em dezembro de 2009, deu novo ânimo ao projeto. A Marvel chegou a anunciar que o herói e seu país fictício, Wakanda, apareceriam em Homem de Ferro 2, de 2010. Uma nova lista de diretores entrou em jogo, encabeçada por Ava du Vernay. O sucesso comercial anterior de Creed selou a escolha. Em janeiro de 2016 ele começou seu trabalho em Pantera Negra, colaborando com o roteirista Joe Robert Cole, formado pelo curso de roteiristas da Marvel e premiado pela Writers Guild, o sindicado dos roteiristas, por seu trabalho em televisão.