Cerrado – Foto – Divulgação
A área desmatada no Brasil cresceu 22,3% em 2022 segundo o mais recente Relatório Anual de Desmatamento (RAD2022) do MapBiomas, que consolida dados de todo o território nacional e seus biomas. Foram identificados, validados e refinados 76.193 alertas, que totalizaram 2.057.251 ha de desmatamento no ano passado.
Em quatro anos (2019 a 2022), desde que o RAD foi implementado, foram reportados mais de 303 mil eventos de desmatamento totalizando 6,6 milhões de hectares, o que equivale a uma vez e meia a área do estado do Rio de Janeiro.
90% da área desmatada no Brasil em 2022 ficam na Amazônia e no Cerrado
A Amazônia e o Cerrado juntos respondem por 70,4% dos alertas e 90,1% da área desmatada em 2022. Embora o Cerrado tenha uma participação de apenas 8,3% no número total de alertas, a área total desmatada representa quase um terço da vegetação natural suprimida no país (32,1%) no ano passado devido ao tamanho dos alertas.
Houve incremento na área desmatada em cinco dos seis biomas brasileiros entre 2021 e 2022, com exceção da Mata Atlântica. Em termos de área, os maiores aumentos ocorreram na Amazônia (incremento de 190.433 ha) e no Cerrado (incremento de 156.871 ha). Em termos proporcionais, os maiores aumentos ocorreram no Cerrado (31,2%) e no Pampa (27,2%).
Do total de eventos de desmatamento em 2022, 62,1% ocorreram na Amazônia, com 1.192.635 ha desmatados (58% da área total desmatada no país). A Caatinga aparece em seguida, com 18,4% dos alertas e 140.637 ha (6,8% da área), seguida pelo Cerrado com 8,3% dos alertas (32,1% da área) e 659.670 ha. Mesmo com a maior parte da sua área florestal desmatada, restando menos de 29% da sua cobertura florestal, na Mata Atlântica foram desmatados 30.012 ha, o que representa 1,5% da área total desmatada no país.
Apesar de responder pela menor área de alertas (0,2% do total), o Pampa teve um aumento de 27,2% na área desmatada de 2021 para 2022, mas foi a primeira vez que o SAD Pampa foi incorporado ao sistema de monitoramento do MapBiomas. No Pantanal, observou-se uma diminuição no número de alertas validados (-8,9%), mas um aumento de 4,4% na área desmatada entre 2021 e 2022.
Pará mantém a liderança; Amazonas é onde mais cresce o desmatamento
O Estado do Pará lidera o ranking do desmatamento, com 22,2% da área desmatada no país (456.702 ha), seguido pelo Amazonas, com 13,33% (274.184 ha). A área desmatada no Amazonas cresceu 37% em relação a 2021, levando o estado a superar o Mato Grosso pelo segundo ano seguido.
Em terceiro lugar ficou o estado do Mato Grosso, com 11,62% da área desmatada (239.144 ha), seguido da Bahia, com 10,94% (225.151 ha). Ela ultrapassou o Maranhão, que teve 168.446 ha de desmatamento (8,2%). Juntos, estes cinco estados (PA, AM, MT, BA e MA) responderam por dois terços (66%) do desmatamento detectado no Brasil em 2022.
Quase dois terços dos municípios brasileiros tiveram desmatamentos
Dos 5.570 municípios brasileiros, 3.471 (62%) tiveram pelo menos um evento de desmatamento detectado e validado em 2022. Entre os 3.471 municípios que tiveram alertas em 2022, apenas 50 responderam por 52% da área total desmatada no Brasil, sendo que 17 desses municípios estão no estado do Pará e oito no Amazonas. O município de Lábrea, no Amazonas, com 62.419 ha desmatados, superou a área desmatada do município de Altamira no Pará, campeão de área desmatada nos últimos três relatórios. Considerando os últimos quatro anos, apenas 1426 municípios (25,6%) não tiveram desmatamento detectado.
Amacro e Matopiba: os hubs de desmatamento
No Matopiba concentrou-se 26,3% da área desmatada no Brasil em 2022. Foram 4.975 alertas e 541.803 ha desmatados – um aumento de 37% da área desmatada em relação a 2021. A região do Matopiba foi onde se concentrou a maior parte dos desmatamentos no Cerrado: cerca de 82,1% da área de supressão de vegetação nativa do bioma. Também é no Matopiba onde estão os 10 municípios que mais desmataram no Cerrado em 2022.
Na região Amacro, foram 7.055 alertas e 231.955 ha desmatados em 2022 – 11,3% da área desmatada no Brasil e aproximadamente 19,4% do que foi perdido na Amazônia. Houve um incremento de 12,3% do desmatamento nessa região em 2022 em relação a 2021.
Velozes e furiosos
O desmatamento em 2022 indica que a atividade é executada em larga escala: foram 234,8 ha por hora, ou 5.636 ha por dia, na média – um incremento de 24,3% em relação a 2021.
Somente na Amazônia foram 3.267,5 ha desmatados por dia, ou 136,1 ha por hora. Isso equivale 2,3 ha por minuto e significa que cerca de 21 árvores foram derrubadas a cada segundo. O Cerrado está em segundo lugar, com 1.807,3 ha por dia, o equivalente a 75,3 ha por hora. O aumento da velocidade foi constatado em todos os biomas, menos na Mata Atlântica, onde se manteve estável.
A velocidade média por alerta também teve um incremento em 2022: 0,18 ha/alerta/dia em 2021 passou para 0,20 ha/alerta/dia. Foram detectados e validados, em média, 239 novos eventos de desmatamento por dia em 2022; em 2021 foram 191.
A velocidade média máxima de desmatamento para um único evento de desmatamento foi alcançada no alerta de código 617708, no município de Alto Parnaíba, no Maranhão. Foram 239 ha/dia de Cerrado, permitindo que 1.913 ha fossem desmatados em apenas nove dias, entre 11/06/2022 e 19/06/2022. Na Amazônia, a maior velocidade média máxima observada foi de 36,3 ha/dia no alerta de código 600321, localizado no município de Novo Aripuanã, no Amazonas. Já no Pantanal, o alerta com maior velocidade média máxima observada foi de 25,5 ha/dia, em Corumbá, no Mato Grosso do Sul.
A velocidade pode ser ligada ao alto investimento na atividade: desmatadores têm dinheiro para desmatar nessa velocidade, com maquinário.
Áreas devastadas cada vez maiores
Houve um aumento de 19,3% na quantidade de desmatamentos com mais de 100 ha por alerta em 2022. Apesar de representarem apenas 4,8% do total de alertas, eles respondem por 60,6% do total desmatado no país. As áreas desmatadas com menos de 25 ha representam 81,9% do total de alertas, mas somente 15% da área desmatada.
Como consequência direta da maior velocidade de desmatamento, a área média desmatada por alerta alcançou 27 ha, um aumento de 14,8% em relação a 2021. No Cerrado e na Amazônia, porém, o crescimento foi bem maior: 48,7% e 21,2%, respectivamente. Mas é o Pantanal o bioma com a maior área média desmatada por alerta: 117,3 ha. O Cerrado vem em seguida, com 104,8 ha.
A Mata Atlântica e o Pampa possuem as menores áreas médias por desmatamento (3,8 ha e 7,4 ha, respectivamente), o que pode ser explicado pela maior fragmentação da paisagem e pela estrutura fundiária, com propriedades rurais de menor tamanho, na comparação com os demais biomas.
Florestas: as mais desmatadas
A partir do cruzamento da área desmatada com o mapa de cobertura e uso da terra do MapBiomas, observa-se que em 2022 houve o predomínio de desmatamento na formação florestal (64,9%) e na formação savânica (31,3%), sendo o restante predominantemente sobre formação campestre (3,6%).
Quilombos e terras indígenas: os mais preservados
Comunidades Remanescentes de Quilombos (CRQ) e Terras Indígenas (Tis) permanecem como os territórios mais preservados do Brasil. Os desmatamentos em TIs representaram 1,4% da área total desmatada no Brasil em 2022 e 4,5% do total de alertas validados no período. A maior parte dos alertas (91%) e da área desmatada em TIs (26.598 ha) se encontra no bioma Amazônia. Pelo segundo ano consecutivo, a maior área desmatada em TI ocorreu na TI Apyterewa (PA), com 10.525 ha desmatados em 594 eventos de desmatamento.
Já os desmatamentos que se sobrepõem às CRQs representaram 0,05% da área total desmatada no Brasil em 2022. Do total de 456 CRQs certificadas, apenas 62 (26,1%) tiveram pelo menos um alerta de desmatamento detectado e validado em 2022 com pelo menos 0,3 ha. A CRQ com maior área desmatada foi Kalunga (GO), onde 258 ha de vegetação nativa foram suprimidos – parte dentro da Área de Proteção Ambiental Pouso Alto, no entorno do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros.
90% da área desmatada no Brasil cruza com apenas 1,1% dos imóveis registrados no CAR
A área de desmatamento com sobreposição total com áreas com CAR alcançou 1.729.099 ha, o que representa 83% da área desmatada no país em 2022. Porém, quando se considera a área dos alertas que cruzam também parcialmente com o CAR, este número sobe para 1.887.247 ha, ou 90% da área desmatada no Brasil. O Pantanal e o Cerrado são os biomas que apresentaram a maior proporção da área total de alertas que cruzam total ou parcialmente com CAR: 99% e 98%, respectivamente.
Apenas 1,1% dos imóveis cadastrados no CAR tiveram registro de desmatamento em 2022 no Brasil. Porém esse pequeno percentual respondeu por 79% dos alertas do país. Ao todo, 60.183 alertas identificados em 2022 se sobrepõem total ou parcialmente com áreas com CAR.
A maior concentração de imóveis no CAR com desmatamento está no bioma Amazônia (118.711 imóveis, 56%), seguido do Cerrado (49.405 imóveis, 23%) e da Caatinga (28.364 imóveis, 13%). Dos imóveis cadastrados no CAR com desmatamento validado em 2022, 39.063 (52%) foram reincidentes, ou seja, tiveram registro de desmatamento em mais de um ano.
Considerando o período de quatro anos (2019 a 2022) foi detectado pelo menos um desmatamento em 212.884 CARs, o que representa 3,1% do total de CARs. Isso indica que nos últimos quatro anos não houve detecção de desmatamento em 96,9% dos quase 7 milhões de imóveis rurais cadastrados no CAR.
Agropecuária continua sendo o principal vetor de desmatamento
A agropecuária respondeu por 1.969.095 ha, ou 95,7% do total de 2.057.250 ha desmatados no Brasil em 2022, consolidando-se como o principal vetor de supressão de vegetação nativa. Para efeito de comparação, o garimpo respondeu por 5.965 ha e outras atividades de mineração por 1.128 ha.
O calendário da destruição
Embora a dinâmica de desmatamento nos biomas apresenta diferenças, o dia com maior área desmatada em 2022 foi 25 de julho, com 6.945 ha desmatados. Isso equivale a 804 m2 por segundo ou 4,8 ha por minuto. Em apenas 24 horas, foi desmatada uma área equivalente a 8.400 campos de futebol.
Os picos de desmatamento por bioma, no entanto, variam. Na Caatinga, o ápice do desmatamento aconteceu na primeira quinzena de fevereiro. Na Mata Atlântica, foi no final de março, diferentemente de 2021, quando o auge foi alcançado em agosto. No Cerrado, o pico aconteceu no início de abril. No Pantanal, foi na primeira quinzena de junho. Na Amazônia, foi no final de julho. No Pampa, foi na segunda quinzena de setembro.
A irregularidade impera no desmatamento
Além da sobreposição com áreas protegidas em TI e UC, o relatório inclui outras evidências de irregularidades, como a sobreposição de desmatamento com Áreas de Reserva Legal (RL) e Áreas de Preservação Permanente (APP). Essas áreas não são passíveis de desmatamento, exceto em condições muito específicas e autorizadas. No entanto, os pesquisadores identificaram 39.661 alertas sobrepostos em pelo menos 0,3 ha sobre a Reserva Legal em 2022. Isso significa que metade (52%) dos alertas tem sobreposição com RL. Em termos de área, 699.189 ha se sobrepuseram com RL, o que representa 34% da área total desmatada em 2022. Todos os biomas tiveram um aumento de área desmatada em Reserva Legal em 2022 quando comparado ao ano anterior (2021), com exceção do Cerrado.
Para a análise de desmatamento em Área de Preservação Permanente ao longo dos rios foram considerados os dados autodeclarados pelo proprietário de terra no SICAR, que são subestimados. Ainda assim, em 2022, houve sobreposição de 6.867 alertas (9% do total) com pelo menos 0,3 ha em APP. Já em termos de área, a sobreposição foi de 23.839 ha, ou 1,1% do total desmatado no país. No Brasil e em todos os biomas, houve aumento da área desmatada em APPs em 2022 em relação a 2021.
Ao cruzar os dados de desmatamento autorizados, que respeitam a Reserva Legal, Áreas de Proteção Permanente, nascentes e sem sobreposições com áreas protegidas (tais como Unidades de Conservação e Terras Indígenas), observa-se que apenas 228 dos 76.193 alertas, ou seja 0,3% (0,7% em área), atendem aos critérios estabelecidos pelos especialistas para indícios de legalidade. Isso significa que há indícios de ilegalidade da área desmatada no Brasil acima de 99%, considerando os dados oficiais disponibilizados.
A impunidade ainda domina o desmatamento ilegal
O Relatório analizou as as ações realizadas pelos órgãos de controle ambiental para conter o desmatamento ilegal incluindo autuações e embargos. As ações de autuação e embargo realizadas pelo IBAMA e ICMBio até maio de 2023 atingiram apenas 2,4% dos alertas de desmatamento e 10,2% da área desmatada identificada de 2019 a 2022.
Quando considerados os 59 municípios definidos como prioritários pelo Ministério do Meio Ambiente para o combate ao desmatamento na Amazônia, este índice é um pouco melhor: 4,1% do total de alertas e 17,7% da área desmatada.
Quando se somam os esforços estaduais, o percentual de alertas com autorizações e ações sobe para 9,7% e, em termos de área, chega a 35,5%.
No período de 2019 a 2022, os estados com a maior proporção do desmatamento respondido com algum tipo de ação (seja autorização, autuações ou embargos) pelos órgãos ambientais e ministérios públicos foram Espírito Santo (73,7% dos alertas no estado), Rio Grande do Sul (55,6%), São Paulo (40,3%), Mato Grosso (37,3%). Os estados que apresentaram menor atuação foram Pernambuco (0,8%), Maranhão (1,6%) e Ceará (1,9%).
Sobre o Relatório Anual de Desmatamento – O RAD-Relatório Anual de Desmatamento do MapBiomas reúne dados consolidados de desmatamento de todo o Brasil e todos os seus biomas. Ele analisa os alertas de desmatamento detectados no Brasil de 2019 a 2022 e que foram validados e refinados sobre imagens de satélite de alta resolução pelo MapBiomas Alerta. Nesta quarta edição, os alertas gerados pelo DETER (Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real do INPE, nos biomas Amazônia e Cerrado), SAD (Sistema de Alerta de Desmatamento do Imazon, na Amazônia), SAD Caatinga (Sistema de Alerta de Desmatamento da Caatinga, desenvolvido pela UEFS e Geodatin), GLAD (Global Land Analysis and Discovery da Universidade de Maryland, para o Pampa), SIRAD-X (Sistema de indicação por radar de desmatamento na Bacia do Xingu, na Amazônia e no Cerrado, desenvolvido pelo ISA), SAD Mata Atlântica (Sistema de Detecção de Alerta de Desmatamento na Mata Atlântica desenvolvido pela SOS Mata Atlântica e ArcPlan), e SAD Pantanal (Sistema de Detecção de Alerta de Desmatamento no Pantanal desenvolvido pela SOS Pantanal e ArcPlan) e SAD Pampa (Sistema de Alerta de Desmatamento do Pampa, desenvolvido pela GeoKarten e UFRGS) foram utilizados como referência para localizar os alertas de desmatamento nas imagens de satélite diárias de alta resolução espacial (3,7 m).
Para cada alerta validado e refinado, é gerado um laudo com imagens de antes e depois do desmatamento. Também são identificados possíveis cruzamentos com áreas do Cadastro Ambiental Rural (CAR), Sistema de Gestão Fundiária (SIGEF), Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (SINAFLOR), Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC), Terras Indígenas (FUNAI), e outros limites geográficos (ex. biomas, estados, municípios, bacias hidrográficas), além do histórico recente da área nos mapas anuais de cobertura e uso da terra no Brasil do MapBiomas (Coleção 7.1).
Todos os dados e laudos são disponibilizados de forma pública e gratuita em plataforma web para que órgãos de fiscalização, agentes financeiros, empresas e sociedade civil possam agir para reduzir o desmatamento ilegal. O relatório completo com todos os dados está disponível no site do MapBiomas Alerta.
Fonte – Ascom MapBiomas