A cada dia que passa, novas pesquisas pintam um cenário sombrio da poluição dos oceanos por lixo plástico. A mais recente, publicada nessa segunda-feira, 19, na revista científica Frontiers in Marine Science, encontrou minúsculas partículas plásticas no estômago de quase três em cada quatro peixes que habitam zonas remotas no Oceano Atlântico.
O estudo, realizado por pesquisadores da Irlanda e Reino Unido, coletou peixes em uma região a 1.200 quilômetros da costa da província canadense de Terra Nova e Labrador. Eles foram retirados de uma profundidade de 300 a 600 metros da chamada zona mesopelágica, que abrange uma faixa de 200 até 1.200 metros de profundidade.
Alguns desses animais são capazes de migrar entre as zonas e nadar até as faixas superiores do oceano para se alimentar, e, por meio dessas migrações verticais, contribuem para o transporte de carbono e nutrientes para as camadas mais profundas do oceano.
Apesar do seu importante papel nos ecossistemas marinhos, os peixes mesopelágicos têm sido relativamente pouco estudados no contexto dos microplásticos. Daí a importância do novo estudo, que desvendou uma quadro preocupante: 73% do total de 280 peixes capturados e analisados em laboratório continham resíduos plásticos no estômago e intestino.
No total, 452 fragmentos microplásticos foram extraídos dos sistemas digestivos dos espécimes, o que dá uma média de 1,8 fragmentos de microplásticos por peixe, a maior parte de polietileno, o tipo de plástico mais comum no mercado.
A descoberta é preocupante, pois os peixes da zona mesopelágica podem espalhar microplásticos pelo oceano. E mais: eles são presas de peixes maiores, como o atum e o peixe-espada, que por sua vez são popular na dieta dos próximos animais da cadeia alimentar, no caso, nós humanos.
Os detritos plásticos são contaminantes complexos e persistentes do ponto de vista ambiental. O plástico é quase indestrutível e, no meio ambiente, só se divide em partes menores, até mesmo em partículas em escala nanométrica (um milésimo de um milésimo de milímetro). Ainda assim, a natureza é incapaz de “digeri-lo”.
Independentemente do tamanho do detrito, os plásticos muitas vezes contêm uma ampla gama de substâncias químicas usados para alterar suas propriedades ou cores e muitas delas têm características tóxicas ou de disrupção endócrina (imitam hormônios capazes de interferir no sistema endócrino).
Para piorar, os plásticos também podem atrair outros poluentes presentes na água, incluindo dioxinas, metais e alguns pesticidas, tanto que muitos pesquisadores que estudam poluição marítima usam plásticos como indicadores de contaminação.
Os pesquisadores destacam, ainda, que apesar dos peixes da zona pelágica não serem comercialmente explorados para alimentação humana, isso pode mudar no futuro para atender a demanda por fontes de proteína para alimentar a população em crescimento, o que pode aumentar a exposição humana a alimentos contaminados
Com isso, o estudo se junta a uma crescente leva de pesquisas científicas sobre os riscos que os microplásticos representam aos ecossistemas marinhos e, por tabela, à saúde humana, conseqüência de décadas de lixo plástico entrando nos mares.
Por Vanessa Barbosa, do Exame