Conhecido como “berço das águas” ou “caixa d’água do Brasil”, o Cerrado abriga oito das 12 regiões hidrográficas do país e abastece seis das oito grandes bacias brasileiras. Mas o bioma também é conhecido pelos altos índices de degradação ambiental — a devastação da sua cobertura vegetal já alcançou 52%. O desmatamento afeta o ciclo hidrológico dos ecossistemas, prejudicando o abastecimento da população.

“Isso aqui é a vida nossa. Quando a gente vê que mais de 50% do Cerrado foi destruído, dá uma dor enorme no coração porque é muito difícil viver num local sem água”, lamenta Madalena Isabel Ferreira, de 24 anos, moradora de São João do Paraíso (MG).

A geraizeira — nome dado às populações tradicionais do Cerrado — defende o uso sustentável dos recursos naturais, como forma de garantir qualidade de vida para os filhos e netos.

Para João Ferreira, agricultor nascido e criado no território, a água é uma dádiva divina e está sendo afetada pelo mau uso do homem, deixando as comunidades sem esperança.

A recuperação dos recursos hídricos do Cerrado é um dos focos do Projeto Bem Diverso, fruto de uma parceria entre a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com recursos do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF). A iniciativa contribui para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, em especial sobre Água Potável e Saneamento (ODS 6), Vida na Água (ODS 14) e Vida Terrestre (ODS 15).

O coordenador do Bem Diverso e pesquisador da EMBRAPA, Anderson Sevilha, explica que viu a necessidade de recuperar áreas e águas do Cerrado ao chegar ao Território de Alto Rio Pardo (MG), onde trabalharia com o uso sustentável da biodiversidade.

“Dentro desse processo, estamos adaptando o trabalho com o manejo do uso da biodiversidade, pensando em como restaurar o Cerrado, as águas e, sobretudo, os povos deste território e sua cultura.”

Uma das técnicas já desenvolvidas — e que tem demonstrado sucesso na restauração ecológica do bioma — é a semeadura direta. O método consiste na reintrodução de todos os estratos de vegetação do Cerrado (ervas, arbustos e árvores) a partir da plantação de sementes nativas, coletadas pelos próprios moradores da região.

A cobertura vegetal do Cerrado é fundamental para garantir os fluxos hídricos. O bioma influencia o regime de chuva de diversas regiões do Brasil, carregando a umidade e o vapor d’água da Bacia Amazônica para o Sul e Sudeste do país.

O conhecimento das comunidades tradicionais sobre a ecologia do Cerrado, bem como sobre a interação das suas espécies com a água, o solo e o fogo, é determinante para o estabelecimento da rede de restauradores de Alto Rio Pardo.

O Bem Diverso capacita os moradores, jovens estudantes e parceiros locais para a realização de atividades a partir de uma unidade demonstrativa de restauração.

“Já fizemos a recuperação na beira das nascentes dos córregos com plantas frutíferas e nativas e, agora, estamos com o trabalho de cercamento de mais de 6 km de nascente para a contenção de água e o abastecimento do lençol freático”, conta o agricultor José da Silva.

O pequeno produtor afirma que o projeto foi importante para melhorar a vida de mais de 120 famílias e 360 pessoas da região. “Muitas delas chegam de comunidades vizinhas para pegar água de carro-de-boi, carroção”, acrescenta o morador da comunidade de Roça do Mato.

A recuperação do Cerrado não preocupa apenas os geraizeiros. As Nações Unidas declararam o período de 2021 a 2030 como a Década Internacional sobre Restauração de Ecossistemas. O período é uma oportunidade de fortalecer medidas para combater a crise climática e melhorar a segurança alimentar, o fornecimento de água e a biodiversidade.

Fonte: ONU Brasil

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