A Confederação Nacional de Municípios (CNM) informa a decisão do governo de repassar os recursos da multa da repatriação aos Municípios nesta sexta-feira, 30 de dezembro, segundo confirmação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN). Após um dia tenso e de muitos atendimentos aos prefeitos, a entidade comunica o anúncio de que o Tribunal de Contas da União (TCU) reconsiderou sua decisão, que suspendeu o crédito este ano, por medida cautelar, para que fosse transferido apenas no dia 2 de dezembro de 2017.

Além de defesa apresentada pela STN, os representantes do movimento municipalista se mobilizaram e pediram ao presidente da República, Michel Temer, para que a verba fosse créditada este ano. A notícia é recebida pelos prefeitos com alívio, e o desespero que os abateu durante todo o dia dá lugar a esperança de conseguir fechar as contas.

Diante disso, a CNM destaca que a atual gestão pode contar com a verba que é imprescindível para o enfrentamento da crise financeira nos Municípios. Dados da CNM estimam que cerca de 77% dos Municípios estavam com o fechamento de suas contas comprometidos, embora estes Entes já estejam cumprindo nos últimos anos austeras medidas de contenção de gastos, com enxugamento da máquina pública, diminuição de custos com pessoal e outras ações.

O presidente da Confederação, Paulo Ziulkoski, comemora a vitória. “Foi um ano difícil, mas chegou ao fim com importante conquista municipalista”, destacou Ziulkoski ao lembrar de todo caminho percorrido.

Histórico
Para que os governo locais tivessem direito aos R$ 10,5 bilhões, do total de R$ 46 bilhões arrecadados pelo governo, a CNM e o movimento municipalista tiveram de mostrar força, união de determinação. Instituído pela Lei 13.254/2016, o regime chamado de repatriação estabeleceu o pagamento de 15% a título de Imposto de Renda (IR) e 15% de multa sobre o montante a ser regularizado e trazido de volta para o país. O texto foi apresentado pelo governo, da então presidente Dilma Rousseff com a justificativa de ser uma forma de ajuste fiscal e de receita para equilibrar as contas públicas.

Como iria precisar de apoio para aprovação do texto no Congresso Nacional, o governo comprometeu-se em partilhar os 30% arrecadados com os demais Entes em forma de imposto e multa, por meio dos Fundos de Participação dos Estados e Municípios (FPE e FPM). A partir desse empenho, o movimento municipalista nacional, que representa os 5.568 Municípios, trabalhou pela a aprovação da matéria, que foi apreciada pelo Legislativo com os devidos compromissos assumidos.

Estimativas
A partir dessa garantia, a CNM apresentou aos prefeitos estimativas dos valores que poderiam receber, caso o montante previsto pelo governo fosse realmente conquistado, inicialmente R$ 70 bilhões no geral e R$ 21 bilhões de imposto e multa. Já o mercado financeiro previu um valor mais otimista – em torno de R$ 273 bilhões. Com base nesses números, a Confederação efetuou seus cálculos e mostrou aos gestores municipais os seguintes valores: caso a projeção do governo se confirmasse, R$ 21 bilhões seriam repassados aos cofres dos Entes, mas se a estimativa do mercado fosse alcançada, o valor aumentaria para R$ 82 bilhões.

Contrariando todas as expectativas dos prefeitos, após a aprovação da matéria pelo Congresso, a presidente Dilma vetou o artigo que previa a partilha da multa com os governos estaduais e municipais, retirando deles a metade dos recursos para aumentar a arrecadação do governo. Todo esse processo ocorreu em meio a um atípico cenário político, que culminou na perda do mandato da presidente petista, e na posse constitucional de seu vice, o pemedebista Michel Temer. Essa mudança de governo trouxe consigo uma inversão automática no apoio a pauta dos Municípios.

Ajustes
Os parlamentares que eram favoráveis à derrubada do veto presidencial, pelo Congresso, votaram pela permanência dele. Resultado que causou nova decepção aos prefeitos, principalmente por conta do encerramento do exercício. Eles contavam com a verba para ajudar a fechar as contas. Uma vez que a gestão municipal vem arrastando um cenário de crise, agravada pela desordem financeira federal, a decisão de não partilhar o montante da multa não foi bem aceita pelos gestores municipais.

Oficialmente, os parlamentares que apoiavam a divisão da multa justificaram que a manutenção do veto foi necessária para não atrasar a votação da meta fiscal do governo pelo Congresso Nacional, mas em seguida seria aprovado um mecanismo que viabilizasse esse repasse às Prefeituras. Promessa feita por conta da pressão dos prefeitos aos deputados, quebrada logo após a votação.

DivulgaçãoIndignação
A postura do governo despertou outro sentimento nos representantes municipais: indignação. Uma vez que o governo não se mexeu para garantir o cumprimento do compromisso assumido, sua intenção com a manutenção do veto deixou claro que a luta ainda seria longa. Passaram-se os meses e a falta de divulgação e a transparência sobre a arrecadação afligia os representantes do movimento municipalista. Apesar das solicitações de informações, a CNM não obteve nada além de anúncios informais e especulativos.

No entanto, os economistas a entidade CNM identificaram números positivos no FPM, a partir do segundo decêndio de abril, principalmente diante do real cenário financeiro nacional. Números positivos alcançados por conta do repasse de recursos da repatriação. O que deveria ser algo positivo se transformou em nova angústia, pois o governo não confirmava o repasse.

Esclarecimentos
A CNM protocolou um pedido de esclarecimento sobre os valores da repatriação, com base nos princípios da Lei 12.527/2011 de Acesso à Informação no dia 30 de agosto. A solicitação foi respondida no dia 10 de outubro da seguinte forma: os levantamentos para fins de divulgação serão realizados ao final do prazo para opção pelo Regime, ou seja, dia 30 de novembro.

Com o fim da vigência da lei, os valores arrecadados foram divulgados pela Secretária do Tesouro Nacional (STN), no dia 8 de novembro, em sua página na internet. De acordo com a publicação, recurso da repatriação, realmente, estavam sendo incorporados no FPM desde abril, sem nenhuma identificação ou transparência.

Tumulto
A postura da Receita causou grande tumulto entre prefeitos. Eles esperavam receber toda a verba da repatriação agora no final do ano para ajudar no encerramento dos mandatos. Apesar de o repasse mais significativo ter ocorrido em novembro e dezembro, os gestores locais voltaram a manifestar o desejo de receber os recursos da multa ainda este ano. Posicionamento incentivado por uma ação judicial apresentada pelo governado do Piauí, Wellington Dias, ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Essa ação teve decisão favorável da Corte, no início de dezembro e como no período ocorria os Seminários Novos Gestores promovido pela CNM e que reuniu prefeitos eleitos e reeleitos, o presidente da entidade Paulo Ziulkoski incentivou que os prefeitos também ingressassem com ações judiciais para se valerem do direito à verba.

Audiência
Paralelo a isso, o governo e o Congresso articulavam apresentar novo texto para reabrir o regime em 2017. Novamente, durante a tramitação do texto no Parlamento Federal, a CNM se mobilizou para garantir que a partilha da multa estivesse expressa no texto. Enquanto Temer garantia aos municipalistas a partilha dessa parte da cobrança para regularização de bens monetários, integrantes da sua equipe econômica o desautorizava. Ele convidou Ziulkoski e os representantes municipalistas regionais para audiência no Planalto.

O maior constrangimento veio com a apresentação do texto do governo ao Congresso, privilegiando os Estado com o direito legal e excluindo os Municípios. Porém, durante a votação da matéria no Plenário do Senado Federal, os Municípios foram novamente incluídos no texto. Assim, a matéria enviada à Câmara deixou expresso que os recursos da multa devem ser divididos com os Estados e Municípios.

Ação
Nova reunião foi solicitada pelos municipalistas com o presidente da República. Como não obtiveram resposta, a CNM disponibilizou em seu portal um modelo de ação, e conforme os gestores locais entravam em contato com a entidade, em busca de informações sobre a matéria, eram incentivados a ingressarem na justiça. Fontes da presidência comentaram, inclusive, que as mais de 1,5 mil ações causaram transtornos à República.

Após tantas cobranças e insistências, o presidente anunciou a divisão da verba com os Municípios antes da virada do ano. A promessa feita durante evento em Pernambuco foi confirmada durante evento com a presença de municipalistas no Ceará. Porém, a Medida Provisória (MP) 753/2016, que estabeleceu a partilha com Estado e Municípios, previu o repasse imediato aos governadores e aos prefeitos apenas a partir de 1.º de janeiro de 2017.

DivulgaçãoTratamento
Essa diferença de tratamento levou a uma intensa mobilização da Confederação junto à presidência da República e aos parlamentares. Em atendimento à reivindicação municipalista, a MP foi alterada e a nova publicação ocorreu dia 20, prevendo o crédito para a partir de 30 de dezembro. Novamente, a Confederação se mobilizou para garantir a entrada do recurso ainda em 2016.

No dia 26 de dezembro, um comunicado da STN garantiu o crédito para o dia 30 de dezembro. Mas ainda não era o fim da angústia dos gestores municipais, pois ainda foi necessário enfrentar a informação de que no dia o repasses era uma data de feriado bancário. Para auxiliar os prefeitos nesse novo desafio, a Confederação buscou informações e soluções junto às instituições financeiras para garantir o atendimento aos Municípios ainda neste exercício contábil. A entidade inclusive divulgou nota técnica com explicações detalhadas. Por fim, as instituições bancárias comunicaram às Prefeituras que as transações online seriam processadas até ás 11h desse dia, e até o final do dia a verba já teria sido repassada a todos os cofres municipais.

STF
Se não bastasse toda a angústia dos Municípios e os milhares de atendimentos feitos pela equipe CNM, orientando sobre as medidas, a ministra e presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármem Lúcia, proferiu decisão, na noite do dia 27 de dezembro, sobre liminar que tratava da data do repasse. Mais uma vez, a entidade municipalista divulgou esclarecimentos aos prefeitos explicando que a decisão se tratava do primeiro texto da MP, que previu a data para 1.º de janeiro e como a redação já havia sido alterada a decisão não bloqueava o repasse confirmado pelo Tesouro.

Surpreendidos novamente com decisão contrária, na noite do dia 28 de dezembro, a STN recebeu decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que impedia o crédito no ano de 2016. Com essa informação, a Confederação contatou a STN e pediu para que se manifestassem em defesa do crédito para os Municípios já desesperados. A representação alegava que a antecipação de recursos por parte da STN configura indício de descumprimento da Lei 4.320/1964 – que dispõe sobre as normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos – uma vez que a execução de receitas extraordinárias somente poderia ocorrer com a previsão de despesas na Lei Orçamentaria Anual (LOA) de cada Município.

Conquista
A representação também indica a inviabilidade de o crédito ocorrer no dia 30 por conta de feriado bancário. Em resumo, o procurador maranhense afirma não haver tempo hábil para os Municípios efetuarem todas as providências legislativas e administrativas para o cumprimento da lei em relação ao repasse adicional além de sinalizar vulnerabilidade na entrada desses recursos por conta do período de transição de gestão.

Novamente, diversos contatos foram feitos junto ao Palácio do Planalto para que o presidente Temer solicitasse ao TCU a mudança da sua decisão. Por fim, já na noite da quinta-feira, 29 de dezembro, a STN, em comunicado aos Municípios, garante o crédito na última sexta-feira do ano.