Em meio à aflição e às milhares de histórias tristes causadas pela pandemia do novo coronavírus no Brasil, demonstrações de afeto, criatividade e amor ao próximo indicam que a população encontrou formas de lidar com o vírus em tempos de quarentena e isolamento social.
‘Charreata de fraldas’
O chá de fraldas do pequeno Lucas já estava programado pela mamãe Ana Paula, mas evento em Janaúna (MG) precisou ser cancelado por conta do período de isolamento social. No entanto, um grupo de amigos resolveu improvisar e fez uma surpresa para a gestante: eles criaram a ‘Charreata do baby Lucas’.
A entrada da casa de Ana Paula foi toda ornamentada, colocaram bolo, presentes e passaram de carro pela rua. “Ana Paula estava desanimada por não poder fazer o que planejou e achamos uma forma de ajudá-la. Foi muito emocionante”, disse Paula, uma das amigas.
“Nunca imaginei que iria passar por isso e estava frustrada por ter cancelado o chá, porque era um momento de reunir os amigos para confraternizar. Realmente, eu não esperava por essa surpresa, mesmo com o isolamento há outras formas de ressignificar os encontros e demonstrar amor e carinho”, contou Ana Paula.
Driblando a saudade
A quarentena está unindo avós e netos pela tecnologia. E quem não era muito conectado está aprendendo a lidar com a distância e espalhando carinho pela rede – com a surpresa do dia do aniversário, o prato preferido preparado pela neta e o filho ou simplesmente o contato diário para acompanhar o desenvolvimento das crianças.
Já os idosos de um asilo em Rio Verde (GO) ganharam de presente uma serenata feita por voluntários. Para que não houvesse contato, um palco improvisado foi montado do lado de fora da unidade. Os internos acompanharam a apresentação do lado de dentro, separados pelas grades do muro.
Proteção carinhosa
O Ministério da Saúde passou a recomendar, no início de abril, o uso de máscaras para diminuir o risco de contaminação pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2). Podem ser as de tecido, costuradas em casa, ou as descartáveis. Em muitas cidades o uso dela até já é obrigatório. E nos últimos dias foi possível ver a solidariedade aflorar e a personalidade das pessoas se destacar na utilização desse acessório.
Em Campo Grande (MS), a ideia da enfermeira Gláucia Villany foi amenizar o medo de uma paciente em meio a tanta tensão – ela desenhou um sorriso na máscara que estava usando.
“Ela começou a sorrir na hora e falou: ‘nossa, que legal’. E eu respondi: ‘eu não posso te abraçar, mas, posso fazer você sorrir’. E senti que ela ficou mais calma, principalmente, porque de máscara não tem como mostrar para a pessoa que a gente está sorrindo. E ela terminou dizendo: ‘Você ganhou uma fã!'”, ressaltou Gláucia.
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Em Sorocaba (SP), uma ONG de palhaços que teve as visitas suspensas aos hospitais achou uma forma de continuar levando a alegria para a população: começaram a produzir máscaras em prol da solidariedade.
“Foi e está sendo muito difícil. Através dessas costuras e de doações, está melhorando. Todo mundo querendo voltar e com saudade. Você cria um vínculo naquele hospital e faz parte da sua agenda […] Estou há mais de 60 dias dentro de casa, mas fazer as máscaras está melhorando a cabeça de todos. Vamos embalar tudo individualmente para fazer a entrega e distribuir”, destacou Maria José.
Ao invés de roupas, mãe e filha decidiram “estender solidariedade” em um varal em Piedade (SP). Por conta do distanciamento social, a dupla passou a confeccionar e distribuir máscaras no portão de casa.
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“Minha mãe comentou comigo de fazer o ‘varal solidário’. Foi quando compramos as cordinhas e os prendedores. Depois, fiz um vídeo nas redes sociais explicando a ação e o pessoal adorou”, disse Inara.
Em Blumenau (SC), um alfaiate aposentado de 95 anos é quem está fazendo máscaras para doação. Severino Antônio Bianchi faz cerca de 50 por dia e a cuidadora Adriana cuida da distribuição.
“Precisa usar a máscara para sair na rua, precisa também passar gel nas mãos, precisa passar álcool gel nas mãos, melhor dizendo. E nunca esqueça de usar a máscara quando sair na rua. Mas eu pediria, por favor, não saiam de casa, que é a melhor maneira de combater [o vírus]”.
Já em Vitória (ES), o enfermeiro Adriano Gonçalves é quem está otimizando o tempo: no trabalho no Pronto Atendimento de São Pedro e na produção de máscaras. A vontade de ajudar surgiu quando Adriano começou a perceber que muitos dos pacientes que chegavam ao pronto atendimento não usavam máscaras por falta de recursos para comprá-las.
Conscientização bem criativa
União solidária
Na falta de um contato mais próximo, as atitudes passaram a ser grandes demonstrações do carinho neste momento.
Em Belo Horizonte, foi dentro de um condomínio que a solidariedade surgiu. Mais de 100 moradores fizeram doações de cestas básicas, frutas, legumes e fraldas e contemplaram 28 famílias com esse gesto.
Já um mercado e uma padaria de Mogi das Cruzes (SP) colocaram cestas e cartazes divulgando a doação de pães e outros alimentos para quem precisa. “Devido ao desemprego, à suspensão de aulas nas escolas, creches fechadas, muitas pessoas têm a necessidade de dar um pãozinho para os filhos de manhã. Então tive a ideia de fazer essa doação todos os dias”, contou Elson Gonçalves.
Entretendo o tempo e aprendendo
A artista paraibana Minna Miná teve a ideia de criar bonecas de papel, que podem ser impressas e montadas. A artista fez sugestões de personagens, que podem ser coloridas, coladas ou criadas com articulações.
“Queria que as pessoas se sentissem convidadas a criar e pudessem manusear os bonequinhos de várias formas, podendo ser colorido, colado, montado, usado pra fazer stop-motion, marionete, ou até decoração”, ressaltou Minna.
Já a professora Beatriz Almeida resolveu dar voz aos personagens literários e criou uma contação de história online. Ela escolhe livros de autores que gosta, estuda os textos e a partir daí cria as tonalidades de voz dos personagens.
“O maior objetivo é divulgar a literatura infantil onde quer que as crianças estiverem. Sejam essas crianças pequenas ou grandes, como nós. Desconstruir também a ideia de que a literatura infantil é feita exclusivamente para as crianças pequenas e fazer com que adultos também se interessem”, contou Beatriz.