Equipe Gazeta do Cerrado

Um grupo de tocantinenses composto por advogados, empresários, servidores públicos, quilombolas, e de moradores do Jalapão, elaboraram uma representação enviada ao Procurador Geral da República (PGR), Augusto Aras, para fins de aferição sobre viabilidade jurídica da da Lei Estadual n. 3.816, de 25 de agosto de 2021, com o objetivo de deflagrar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI).

Esta nova Lei permite a concessão e demais parcerias público-privadas em relação aos serviços, áreas ou instalações para a exploração de atividades de visitação voltadas à educação ambiental, à preservação e conservação do meio ambiente, ao turismo ecológico, à interpretação ambiental e à recreação em contato com a natureza, precedida ou não da execução de obras de infraestrutura, nas seguintes unidades de conservação estaduais

O Tocantins possui quatro parques: o Parque Estadual do Jalapão; Parque Estadual do Cantão; Parque Estadual do Lajeado; Monumento Natural das Árvores Fossilizadas.

O grupo é composto pelos advogados Célio Henrique Magalhães Rocha, Jander Araújo Rodrigues, Edy Cesár dos Passos Júnior. Pelos empresários, João Marcello de Sousa Lima e Tarcilio Carreiro Quixabeira. Pelo ex-deputado estadual, Paulo Mourão. Pelo servidor público, Joelson Guida Pinheiro. Pelo Procurador da República, Mário Lúcio de Avelar. Pela coordenadora da Coordenação Estadual  das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO), Maria Aparecida Ribeiro de Sousa. Pelo quilombola, Zuraildo Matos da Silva. E pelo morador de Mateiros, Tarcilio Carreiro Quixabeira.

No documento, o grupo argumenta porquê a Lei 3.816 deve ser impugnada.

Segundo a representação, a referida Lei ignorou os termos da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que, dentre outros, consagra o direito às comunidades tradicionais de serem consultadas de forma prévia, livre e informada diante da proposição de medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente. É dizer, as comunidades quilombolas não tiveram o direito assegurado de previamente participar das discussões legislativas, de construir o desejável consenso decisório. Tudo isso é o prenúncio de que os contratos de concessão serão firmados ao arrepio das comunidades da região e em termos social e ambientalmente inaceitáveis.

O grupo ainda afirma que as comunidades remanescentes dos quilombos possuem uma forte relação de pertencimento com a terra. Para as comunidades remanescentes dos quilombos a terra é o espaço onde os descendentes de escravos cultivam a sua identidade, produzem o seu sustento e fazem a sua cultura. Daí que a terra, para eles, não se enquadra no conceito civil de propriedade; ela não é objeto de valor mercadológico, mas espaço de vida, cultura e identidade. É no território que se trava a luta pela reprodução material e cultural; sem território não existe vida, pertencimento, identidade.

O documento destaca que o Poder Legislativo estadual desconheceu a necessária participação da sociedade no instante de elaboração da lei, assim como os próprios Conselhos Gestores das Unidades de Conservação relacionados. Sobre este aspecto, ressalta-se que a única iniciativa de consulta se limitou a uma audiência pública realizada em 19 de agosto de 20211, convocada após a publicização do assunto pelos órgãos de imprensa e da forte manifestação contrária advinda de setores da sociedade civil.

Para o grupo, a promulgação da Lei coloca em risco os atributos naturais do Cerrado existentes nas diversas Unidades de Conservação, bem como as populações tradicionais que dependem diretamente das suas formações florestais para a sua sobrevivência. Essa circunstância é agravada pela abrangência e, ao mesmo tempo, inexistência de quaisquer condicionantes estabelecidas na Lei para efeito de elaboração dos respectivos contratos de concessão. Sem dúvida, a Lei abre ampla margem para que atividades econômicas associadas à lógica do mercado subvertam os objetivos estabelecidos de proteção da
fauna, da flora e das populações tradicionais sobrepostas e localizadas no entorno das Unidades de Conservação afetadas, em evidente inobservância ao disposto no art. 23, VI e VII, e artigo 225, § 1º, incisos I, II, III e VII, da Constituição Federal.

Confira a documento na íntegra:

REPRESENTACAO – PGR – DESESTATIZAÇÃO – JALAPÃO – VF (1)