No Tocantins, o mês de julho é conhecido e esperado por moradores e turistas por ser o mês da temporada das praias de água doce, além de coincidir com o período de férias de boa parte deste público. Aliado ao calor característico do clima da região, o banho de rio faz parte da cultura tocantinense, porém é necessário fazer um alerta para o cuidado com o risco de acidente com arraia, mais comum nos meses de julho a setembro, conforme dados a seguir:

Acidentes com arraia

O médico especialista em cirurgia geral do Hospital de Doenças Tropicais da Universidade Federal do Tocantins (HDT-UFT/Ebserh), Marcelo de Oliveira Melo, orienta sobre o procedimento correto ao paciente deste tipo de agravo. Os acidentes geralmente acontecem quando as pessoas pisam no dorso do animal, que introduz o ferrão na vítima, tendo, no entanto, como áreas frequentemente mais afetadas os pés, tornozelos e o terço distal das pernas.

De acordo com o cirurgião, existem três tipos de fatores importantes acerca do acidente com arraia: lesão perfurante, o efeito local do veneno presente no ferrão que causa muita dor e a necrose tecidual, e a infecção por bactérias inoculadas pelo ferrão. Conforme protocolo elaborado no HDT-UFT: a primeira orientação, após ocorrer o acidente com o animal, deve ser realizado aquecimento do local com temperatura entre 38° e 42° durante 30 minutos com água morna, ou fazer compressa. Esse procedimento leva a quebra das proteínas do veneno, diminuindo o efeito deste e evitando assim a necrose, além de diminuir a dor. Em seguida, o paciente deve procurar uma unidade de saúde imediatamente, Para realização de limpeza da ferida sob anestesia local e iniciado o tratamento com antibióticos.

O médico enfatiza que quanto mais cedo for realizado a compressa morna, e em seguida o desbridamento (limpeza do tecido, com a remoção da bactérias, e restos que ficam no fundo do rio, que são levados juntamente com o ferrão), menor o risco de infecção e uma recuperação mais rápida do paciente. “O atraso em procurar o atendimento médico e adequado pode levar a sequelas graves, como já observamos no HDT”, conclui.

A Chefe da Unidade de Serviços Gerais do HDT-UFT, Rosirene Alcanfôr conta sua experiência ocorrida em julho de 2019. Ela estava na praia com sua família quando ao sair do rio, na parte rasa, foi ferroada por uma arraia pequena. “É uma dor quase insuportável, que durou até o dia seguinte. Eu não conseguia andar, e só foi melhorando depois do atendimento médico”, disse, frisando que foram seis meses para recuperação efetiva da ferida.

Sobre as arraias

O biólogo e professor da Universidade Federal do Norte do Tocantins (UFNT), Sandro Moron esclarece que as raias são peixes pertencentes a Classe Chondrichthyes, a subclasse Elasmobranchii, podendo ser marinha ou de água doce. Pode-se usar a denominação raia ou arraia. Entretanto, o termo mais aceito é Raia.

Esse peixe cartilaginoso, ou seja, possui esqueleto constituído por cartilagem, visto como agressivo é na verdade dócil e só ferroa quando precisa se defender. Grande parte das raias são bentônicas e carnívoras. Em todo mundo são descritas mais de 400 espécies com tamanho variando de 0,15 a 7 metros de envergadura.

Em geral, a maioria das raias possuem formato de disco, com a cauda fina e comprida provida ou não de um ou mais ferrões venenosos, que podem causar ferimentos dolorosos. As nadadeiras peitorais são bem desenvolvidas e situam-se no mesmo plano da cabeça, projetando-se pelos lados da cabeça. A ondulação das nadadeiras constitui-se na principal forma de locomoção das raias.

Na parte inferior encontra-se a boca, pequena e transversa com dentes serrilhados. Essas características permitem que as raias se alimentem de plâncton, moluscos, crustáceos e outros pequenos animais. Na parte superior encontram-se os olhos e os espiráculos, fendas posicionadas atrás de cada olho, conectados à câmara branquial e fundamentais no processo respiratório.

Normalmente vivem solitárias, junto ao fundo arenoso, ou de pequenas pedras. Podem formar pequenos grupos durante a época da migração

As raias de água doce são exclusivas da América do Sul. Elas evoluíram a partir de um ancestral marinho que penetrou no continente durante invasões marinhas ocorridas no Eoceno, há 50 milhões de anos, até possivelmente o Mioceno, há 20 milhões de anos. Quando as águas do mar que penetrava a Amazônia recuaram, as espécies de raias de água salgada tiveram que se adaptar ao ambiente de água doce.

As raias de água doce pertencem a família Potamotrygonidae. Os quatro gêneros de raia reúnem 34 espécies. Apenas o gênero Potamotrygon compreende 27 espécies, sendo que 21 ocorrem no Brasil e 11 delas são endêmicas nos rios do país.

As raias da família Potamotrygonidae são conhecidas por seu apêndice de cauda longa, com a presença de um a quatro ferrões calcificados serrilhados, cobertos por um epitélio glandular cujas células produzem veneno. Além disso, as raias são cobertas por um muco que abriga bactérias de vários tipos e que podem provocar infecções bacterianas secundárias.

Prevenção

A maioria dos acidentes ocorrem em praias no período do verão, uma vez que o nível da água fica baixo e o ambiente fica mais propício ao animal e ao banho às margens dos rios, combinadas a restos de comida acabam atraindo as raias. Como forma de defesa a invasão de seu habitat, esses animais acabam usando o ferrão nos banhistas. Além das fortes dores, a ferroada pode causar infecções e morte de tecidos.

Os acidentes geralmente acontecem quando as pessoas pisam sobre o animal, então, é importante estar sempre calçado e atento, e de preferência arrastar o pé no fundo do rio, pois o contato faz com que o peixe se desloque para outro local.

Sobre o hospital

O HDT-UFT é o primeiro hospital universitário federal do Estado do Tocantins, oferta atendimentos especializados em doenças infectoparasitárias e faz parte da Rede da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) desde fevereiro de 2015. Saiba mais, clique aqui.