Comunidade quilombola da Ilha de São Vicente

 

O Movimento Estadual de Direitos Humanos do Tocantins (MEDH-TO) protocolou ao Ministério Público Federal (MPF) na sexta-feira, 06, denúncias sobre as graves violações de direitos humanos, ameaças à segurança da comunidade quilombola e destruição ambiental no território da Ilha de São Vicente. Área localizada no município de Araguatins, região do bico do papagaio.

Conforme o documento enviado ao MPF, a comunidade quilombola, oficialmente titulada em 2023, enfrenta invasões constantes e ameaça de extermínio cultural e físico. O território é alvo de interesses econômicos intensificados pela localização estratégica na região do MATOPIBA (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) e pelo projeto Hidrovia Araguaia-Tocantins, que visa facilitar o escoamento de commodities.

Na defesa desta comunidade, e de acordo com as informações repassadas ao MEDH-TO por lideranças desta Comunidade, destacam-se invasões e destruição ambiental; venda Irregular de Lotes; falsificação de documentos; e ameaças racistas e institucionais. Diante dessas violações, a entidade solicita ao MPF investigação de crimes de grilagem, racismo e falsificação de documentos relacionados ao território; garantia da desintrusão de invasores, além de apurar a conduta abusiva de autoridades públicas locais e estaduais.

 

Assinaram o documento a coordenadora do MedhTO, Maria Vanir Ilídio, representando a comunidade de São Vicente, Cristina Queiroz de Freitas e Maria Luiza Cardoso da Silva Barros.

 

No documento, os quilombolas também citam representações políticas que vão contra os interesses da comunidade local. A exemplo do deputado federal Ricardo Ayres e do prefeito Aquiles, que juntos falaram publicamente, em suas redes sociais, sobre o assunto, indo contra o direito quilombola à posse exclusiva da terra.

Para a Coordenadora do Movimento Estadual de Direitos Humanos do Tocantins (MEDH-TO), Maria Vanir Ilídio, a situação vivenciada pela comunidade quilombola da Ilha de São Vicente é um reflexo cruel do descaso histórico e da violência institucional contra os povos tradicionais no Brasil. “Nossa luta não é apenas pela titulação do território, mas pela garantia do bem viver, da segurança e da dignidade dessa comunidade, que já foi tão castigada ao longo da história. Esperamos que o Ministério Público Federal atue com urgência para investigar as denúncias que nós apresentamos”.

A estudante Maria Luiza Cardoso Silva Barros, 19 anos, ressalta que a omissão do poder público agrava mais ainda a situação. “O mais grave é a postura do prefeito de Araguatins, que não só se omite diante dessa situação, mas também espalha fake news, dizendo que nosso Quilombo foi criado apenas no ano passado. Isso é completamente falso. Estamos neste território há mais de 100 anos, e é revoltante ver nossas raízes sendo tratadas com tanto descaso”.

 

Os quilombolas afirmam no documento que estão no território há mais de 100 anos. Foto divulgação MedhTO

 

Maria Luiza reforça ainda: “Nosso território não é algo que se possa vender ou trocar; ele é um patrimônio material do Brasil e carrega nossa história e nossa resistência. Lutamos pelo direito de viver onde nossos ancestrais viveram, onde eles sangraram por nós, e hoje nós sangramos por eles. Essa luta não é só nossa, é pela memória, pela cultura e pelo futuro de todas as comunidades quilombolas”.

 

Contexto

 

O território, reconhecido como área de posse ancestral da família Barros, remonta ao século XIX, após a abolição da escravatura. A luta pela titulação, consolidada em 2023, foi liderada pela quilombola Fátima Barros, figura internacionalmente reconhecida na defesa dos direitos das comunidades tradicionais. No entanto, mesmo com o reconhecimento legal, o território segue marcado por conflitos, incentivos à ocupação irregular e ações que ignoram a legislação.
Assinaram o documento protocolado no Ministério Público Federal, juntamente com a coordenadora do MedhTO, Maria Vanir Ilídio, representando a comunidade de São Vicente, Cristina Queiroz de Freitas e Maria Luiza Cardoso da Silva Barros.