“Com quantos anos poderei me aposentar?”, “Vou ter direito ao benefício integral?”, “Essa reforma da previdência é necessária mesmo?”. Perguntas como estas estão tirando o sono de muitos trabalhadores e as respostas nem sempre são fáceis de encontrar. Para esclarecer as principais dúvidas e explicar as polêmicas envolvendo a proposta do governo para mudar as regras da aposentadoria, o Itaú Unibanco preparou um guia respondendo às 15 principais perguntas sobre o tema. A proposta de reforma da Previdência (PEC 287) foi enviada ao Congresso Nacional como parte do ajuste fiscal. Abaixo você lê os pontos mais importantes:
1. O que é a Reforma da Previdência proposta pelo governo?
A Reforma da Previdência é a proposta de emenda constitucional (PEC 287) que, de acordo com o Itaú, “unifica e racionaliza” as regras para acesso aos benefícios previdenciários para homens e mulheres, trabalhadores do setor privado e setor público, com domicílio urbano e rural. Ela estabelece que uma pessoa deve ter no mínimo 65 anos de idade e 25 anos de contribuição para poder se aposentar, independentemente de gênero, domicílio e tipo de trabalho. Homens acima de 50 anos e mulheres acima de 45 anos estão em uma regra de transição, devendo trabalhar 50% a mais em relação ao tempo restante para a aposentadoria nas regras atuais.
O valor da aposentadoria concedida será 51% da média dos salários de contribuição, adicionados de 1 ponto percentual desta média para cada ano de contribuição do trabalhador, até o limite de 100%, respeitado o piso do salário mínimo e o teto da Previdência. A reforma propõe ainda medidas do lado das receitas da Previdência rural, com o fim da desoneração sobre as receitas de exportação do setor rural e a regulamentação de uma contribuição previdenciária rural.
Nas pensões por morte, a proposta estabelece um valor básico de 50% dos proventos do servidor aposentado, acrescentados de 10 pontos percentuais para cada dependente, sendo proibida a acumulação com outro benefício previdenciário. Nos benefícios assistenciais do LOAS/BPC, a idade mínima de elegibilidade será aumentada de 65 para 70 anos, em uma transição de 10 anos, cabendo a lei ainda a ser enviada ao Congresso definir novas regras, em relação ao valor e os requisitos financeiros para acesso ao benefício.
2. A reforma é necessária?
O Itaú argumenta que sim por causa do envelhecimento da população brasileira e pelo fato de o atual regime previdenciário ter “regras generosas” para concessão de benefícios, como a baixa idade de aposentadoria em comparação com a média global, por exemplo. Isso implica que o nível atual de gasto, que já é elevado para o perfil demográfico do Brasil, crescerá continuamente ao longo do tempo na ausência de reformas.
O banco detalha que o envelhecimento da população brasileira será “rápido e intenso”. A razão entre o número de pessoas entre 15 e 64 anos e a população acima de 65 anos recuará de 9 em 2016, para 4 nos próximos 20 anos e para 2 nos próximos 40 anos, marcando o fim do bônus demográfico. Dois fatores explicam essa alta: a diminuição da taxa de natalidade (de 32% em 1980 para 14% em 2016, chegando em 10% em 2040) e o aumento significativo na expectativa de vida (em 1980, a expectativa de vida ao nascer era de 63 anos, em 2016 de 76 e chegará em 80 anos em 2040). Isso é relevante em um sistema previdenciário baseado no modelo de repartição, em que as contribuições da geração atual de jovens financiam os benefícios da geração contemporânea de idosos.
Estimamos que, sem reformas, a dinâmica dos gastos crescerá seguindo o aumento de beneficiários. Como as despesas com previdência estarão próximas de 10% do PIB em 2020 e beneficiários crescerão em média 3,0% por ano entre 2020 e 2030, a despesa com previdência crescerá em média 0,30% do PIB no mesmo período. Já se os benefícios deixarem de ter reajustes reais como o salário mínimo, haveria um alívio nessa tendência igual ao crescimento do PIB.
Segundo o Itaú Unibanco, a proposta presente na PEC busca principalmente adequar o crescimento do número de benificiários à nova realidade demográfica brasileira. A proposta também ajusta o valor de alguns benefícios com a desvinculação das pensões por morte e dos benefícios assistenciais do LOAS/BPC do salário mínimo. Entretanto as aposentadorias permanecem indexadas ao salário mínimo. Se não ocorrer no futuro alteração da regra atual de reajustes reais do salário mínimo, eventuais ganhos de produtividade da geração de jovens trabalhadores continuarão sendo incorporados para idosos aposentados, o que não é sustentável por longos períodos.
3. O atual regime previdenciário brasileiro tem distorções?
O Itaú afirma que sim e afirma que as principais distorções são a baixa idade de aposentadoria e a existência de diferentes regras e regimes especiais para acesso aos benefícios, entre outros. A reforma, segundo o banco, busca corrigir esses pontos, estabelecendo regras unificadas para uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos, regulamentando a contribuição da previdência rural e alterando regras de acesso às pensões por morte e benefícios do LOAS/BPC.
4. A Previdência Rural é a única fonte de desequilíbrio da Previdência?
Não. Segundo o Itaú, a demografia desfavorável afetará também o gasto e o déficit com a previdência urbana (0,8% do PIB em 2016) ano após ano. De todo modo, tomando como partida um déficit da previdência rural de 1,7% do PIB em 2016, a melhora nas condições de vida nas áreas rurais e a elevada judicialização na concessão dos benefícios previdenciários rurais, a adoção de medidas para o reequilíbrio da previdência rural, tanto do lado da despesa quanto do lado da receita, sob o princípio da unificação das regras, está na direção correta, avalia o banco.
5. Quando comparada a outros países, a idade mínima de 65 anos é razoável?
Sim. O Brasil é um dos países com as menores idades médias de aposentadoria no mundo, destaca o Itaú. Segundo a OCDE, dos 34 países analisados, 7 possuem idade mínima de aposentadoria abaixo de 65 anos, mas nenhum abaixo dos 60 anos, como é o caso dos 56 anos de idade média do Brasil.
6. O aumento da idade de aposentadoria afeta mais intensamente os mais pobres?
O Itaú diz que não. Para o banco, o aumento da idade afeta com mais intensidade os trabalhadores de renda mais elevada. Em tese, eles atingem o tempo de contribuição mínimo para aposentadoria mais rapidamente, em razão do grau de qualificação e de estabilidade do seu emprego. Além disso, combinada ao atingimento da idade de aposentadoria precoce, a remuneração média elevada aumenta o valor da aposentadoria recebida, representando forte pressão nos gastos com previdência. Os trabalhadores de menor renda, por sua vez, apesar de entrarem mais cedo no mercado de trabalho, estão sujeitos a um grau maior de informalidade e usualmente se aposentam por idade. Segundo o Itaú, a adoção de uma idade mínima, portanto, dificulta principalmente a aposentadoria precoce por tempo de contribuição, que gera benefícios médios maiores, e, logo, está associada à parcela mais rica da população.
7. Qual a importância da regra de transição?
A regra de transição define o impacto de médio prazo com a elevação da idade de aposentadoria no gasto com previdência. Com a regra de transição proposta, por exemplo, a partir de 2027 é esperado que o ritmo de crescimento dos beneficiários da previdência tenha um recuo mais forte, pois a maioria da população passaria a estar totalmente sujeita as novas regras.
8. Por que não fazer uma reforma apenas para quem ainda não ingressou no mercado de trabalho?
Uma reforma com mudanças apenas para os novos entrantes levaria em torno de 30 anos para gerar impacto. Dada a perspectiva de envelhecimento da população até lá e um gasto previdenciário já elevado, as consequentes trajetórias da despesa e da dívida pública alinhadas a essa transição longa seriam insustentáveis.
9. Existem exceções nas novas regras de aposentadoria?
Sim. A principal exceção é o regime especial dos militares tanto da União, quanto dos governos estaduais, que devem ser tratados em proposta a parte ou nas assembleias legislativas estaduais. Além dos militares, a proposta manteve as aposentadorias especiais por exposição de agente nocivo e para pessoas com deficiência.
10. Se aprovada, a partir de que ano a reforma da Previdência começa a ter impacto nos resultados fiscais?
Segundo o Itaú, o impacto começa em 2018, principalmente em razão das medidas de receitas na Previdência rural, e é crescente ao longo do tempo. A economia com a idade mínima deve se acentuar a partir de 2020 e atingir o ponto máximo entre 2027 e 2034.
11. Qual o impacto das medidas propostas no ritmo de crescimento de beneficiários da Previdência?
Sem a reforma, o número de beneficiários da Previdência cresce em média 3,5% ao ano, em linha com a população acima de 55 anos, a idade média de aposentadoria atual. Com a reforma proposta, o Itaú projeta que o número de beneficiários da previdência cresceria em média 1,5% ao ano entre 2018 e 2030.
12. Qual o impacto das medidas propostas no gasto e no déficit da Previdência?
A reforma proposta permite uma economia de cerca de 1,4% do PIB no gasto com previdência e de 1,5% do PIB no déficit da Previdência, até 2025, em relação ao cenário sem reformas, segundo cálculos do Itaú. Se as medidas forem aprovadas, o gasto e o déficit da Previdência estarão em torno de 8,9% e 3,1% do PIB em 2025, contra 8,2% e 2,5% do PIB em 2016 e 10,3% e 4,6% do PIB, caso nenhuma reforma seja aprovada.
O banco estima que, se além da reforma, o salário mínimo se mantiver apenas constante em termos reais, o gasto e o déficit ficarão em torno de 7,8% e 2,0% do PIB, ligeiramente abaixo dos níveis de 2016. Dos gastos da previdência, 66% estão indexadas ao indicador. E o salário mínimo teve reajustes reais significativos nos últimos anos. Assim, avalia o Itaú, a regra incorporou ganhos de produtividade da geração de jovens trabalhadores para idosos aposentados. Isso não é sustentável economicamente por longos períodos e exerceria forte pressão para a inviabilidade do cumprimento do teto de gastos.
13. A Reforma da Previdência proposta possibilita o cumprimento do teto de gastos até 2025?
O Itaú estima que, se no futuro o valor das aposentadorias crescer na média com inflação, isso é possível. Sem a reforma, a instituição financeira projeta que a previdência, que em 2016 equivale a 40% do total dos gastos primários, corresponderia 65% dos gastos em 2025. Com a reforma e mantendo a regra de ganhos reais para o salário mínimo, o banco calcula que essa despesa seria de 55% dos gastos, enquanto seria de 48% se o valor das aposentadorias crescer apenas com a inflação.
Adicionalmente, vale notar que possíveis flexibilizações na PEC realizadas pelo Congresso, sobretudo na regra de transição para a adoção de uma idade mínima, postergariam os impactos no gasto previdenciário, podendo inviabilizar o cumprimento do teto. Sem a garantia de que o teto permanecerá factível ao longo do tempo, a taxa real de juros aumentaria e o crescimento da economia diminuiria, o que poderia levar a um retorno a trajetória insustentável de aumento da dívida pública, destaca o relatório.
14. A reforma da Previdência ajudará a resolver a situação dos estados?
A avaliação do Itaú é que isso será possível. Como o banco destaca, a reforma engloba os servidores públicos estaduais e elimina regimes especiais de aposentadoria para os servidores civis (professores, por exemplo), que pressionam o gasto dos estados. Além disso, o gasto com inativos é a principal fonte de desequilíbrio do gasto primário estadual e o crescimento real médio anual dessa despesa saltou de 3% entre 2000 e 2009 para 20% entre 2012 e 2016. Segundo o Itaú, o envelhecimento da população e a baixa idade de aposentadoria foram uma das principais razões para tal desequilíbrio e estão sendo atacados na proposta. Por outro lado, o fim da equiparação dos reajustes entre ativos e inativos, aumentos da alíquota de contribuição dos servidores e a previdência dos servidores militares estaduais não estão incluídos na proposta e devem ficar a cargo das assembleias legislativas estaduais, observa a instituição financeira.
15. O que ocorrerá se o Congresso rejeitar a proposta de Reforma da Previdência?
Sem reforma da Previdência, o governo não conseguirá cumprir o teto de gastos ao longo do tempo e a trajetória da dívida pública se tornaria insustentável, na avaliação do Itaú. Sem a perspectiva de estabilização da dívida no médio prazo, o crescimento da economia seria menor e as taxas reais de juros seriam maiores. Eventualmente, o ajuste seria por meio de aceleração forte da inflação ou alguma iniciativa com fortes impactos negativos para a população, como ocorreu na Grécia, estima o banco. O desajuste fiscal do país gerou uma contração acumulada de cerca 32% na sua economia desde 2008 e retirou direitos da sociedade. Além disso, entre outras medidas compensatórias, muito provavelmente teríamos um aumento de pelo menos 4 pontos percentuais do PIB na carga tributária, para financiar o déficit crescente da Previdência, o que dificultaria sobremodo a recuperação da economia, afirma o relatório.