O número de candidaturas religiosas cresceu 11% este ano em relação às últimas eleições gerais, segundo levantamento com base nos dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em 2018, eram 595 candidatos. Em 2022, 659.
A maior parte dessas candidaturas está vinculada ao universo das igrejas evangélicas (89%). Os dados incluem aqueles que utilizam títulos religiosos nos nomes de urna ou se identificam como membros de grupos religiosos.
A maior parte das candidaturas de religiosos é formada por aqueles que se identificam como pastores (392). Esse grupo cresceu 19% este ano.
Entre as candidaturas religiosas identificadas, 16 são de católicos, o equivalente a 2,4%. Também há 13 candidatos que usam nos nomes de urna títulos associados a religiões de matriz africana, o que representa 2% do total.
Há ainda 43 candidatos que declaram como principal ocupação “sacerdotes, membros de ordem ou de seita religiosas”, mas não usam no nome títulos que permitam a identificação da religião.
Lula x Bolsonaro
Os dados mostram ainda uma divisão entre os candidatos de partidos que apoiam o presidente Jair Bolsonaro (PL) e aqueles de legendas que estão com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na disputa pela presidência da República.
A disputa do presidente Jair Bolsonaro e do ex-presidente Lula pelo voto no segmento religioso chegou também na distribuição das demais candidaturas nesta eleição.
Entre os candidatos religiosos em partidos que apoiam Bolsonaro, 88% usam títulos evangélicos, enquanto na base de Lula, são 76%. O ex-presidente é apoiado ainda por 4,1% de candidatos que utilizam títulos religiosos da igreja católica, enquanto Bolsonaro, por 2,3%. Lula tem mais candidatos que se identificam com títulos de religiões de matriz africana (5,5%) do que Bolsonaro (0%).
Na avaliação do professor Frank Antonio Mezzomo, da Universidade estadual do Paraná (Unespar) e pesquisador do Grupo Pesquisa Cultura e Relações de Poder , a distribuição das candidaturas dos religiosos sinaliza um maior alinhamento dos evangélicos com Bolsonaro e dos católicos com Lula.
Para ele, o número total de candidatos religiosos, contudo, deve ser maior que o identificado na base do TSE:
“Muitas candidaturas, inclusive por incentivo e dinâmica das suas religiões, não levam expresso a titulação religiosa no nome de urna. Temos várias experiências, em várias unidades da federação, em que candidatos já tomados como oficiais por suas igrejas, e são pessoas bastante conhecidas no seu universo religioso, que o uso do termo ou o título não agregaria mais votos. Ao não utilizar o termo, essas candidaturas podem, inclusive, buscar ainda mais votos (fora do universo religioso). O uso do título religioso no nome de urna expressa, portanto, uma parte do total que estamos falando”, explica Mezzomo.
O professor da Unespar destaca outro ponto. Segundo ele, os campos político e religioso historicamente promovem um “trânsito de interesses”, e isso explica em parte a associação desses dois grupos nas eleições:
“O universo político busca junto às religiões apoios e, ao mesmo tempo, o universo religioso busca catapultar candidaturas que levem para as assembleias legislativas as suas pautas e bandeiras. Há, nesse sentido, um trânsito de interesses. Isso ocorre porque os dois universos buscam candidaturas que expressem a dinâmica de alinhamento ideológico nas pautas políticas ou por interesses bastante pragmáticos de ambos os grupos.”
O cientista político Dirceu André Gerardi, pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e pós-doutorando em Direito pela FGV SP, considera que o crescimento dos candidatos religiosos é resultado de uma série de fatores, como crise política, pandemia, entre outros:
“Em 2018 apenas 8% da população estava satisfeita com a democracia. Aliado a isso, a recessão econômica, agravada pela pandemia de Covid-19, a polarização política, a ruína dos velhos partidos de centro-direita e o baixo de apreço pelas instituições democráticas, desgastadas pelos sucessivos ataques da direita e do próprio presidente, explicam o aumento significativo das candidaturas de religiosos em 2022. Nesses contextos de crise a religião ressurge como uma alternativa, como discurso, prometendo soluções”, acrescenta Girardi.
“Mais do que falar em divisão (entre Bolsonaro e Lula), verifica-se que não é mais possível falar da construção da democracia brasileira sem considerar a participação de atores religiosos na arena pública. O discurso religioso empregado por Bolsonaro busca conter a fidelidade de sua principal base política e eleitoral, assim como de pastores que apoiam a sua candidatura. Lula mudou sua posição depois de chamar Bolsonaro de demônio”, lembra Girardi.
Títulos mais comuns
Refletindo o maior número de candidaturas evangélicas, o título de “pastor” usado no nome de urna é o mais popular entre os candidatos do levantamento.