O presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou nesta quarta-feira (30) que o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), contou a ele em 9 de outubro que o porteiro do Condomínio Vivendas da Barra citou o nome do presidente da República em depoimento nas investigações sobre a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes.
Bolsonaro tem casa no condomínio onde mora Ronnie Lessa, suspeito dos assassinatos. O Jornal Nacional revelou, na terça (29), que o porteiro contou à polícia que horas antes do crime, em 14 de março, outro suspeito, Elcio Vieira de Queiroz, disse que iria para a casa do então deputado Jair Bolsonaro. O porteiro ligou para a casa de Bolsonaro e obteve autorização para a entrada de Elcio. Ele confirmou em dois depoimentos que identificou a voz de quem atendeu como sendo a do “Seu Jair”.
Os registros de presença da Câmara dos Deputados mostram que Bolsonaro estava em Brasília no dia. Como o nome do presidente foi citado, a lei obriga que o Supremo Tribunal Federal (STF) analise o caso.
Ainda na noite de terça-feira (29), horas após a revelação feita pelo JN, Bolsonaro culpou Witzel por repassar as informações à imprensa, o que o governador nega (leia nota abaixo).
Na manhã desta quarta, em entrevista a jornalistas em Riad (Arábia Saudita), o presidente voltou fazer a afirmação, e disse que o governador do Rio de Janeiro já havia lhe contado sobre o depoimento do porteiro, em um evento no Clube Naval do Rio de Janeiro, há 21 dias.
“Deixar bem claro também: dia 9 de outubro, às 21h, eu estava no Clube Naval no Rio de Janeiro. Chegou o governador Witzel e chegou perto de mim e falou o seguinte: ‘o processo está no Supremo’. Eu falei: ‘que processo?’ ‘O processo da Marielle.’ ‘Que que eu tenho a ver com a Marielle?’ ‘O porteiro citou teu nome.’ Quer dizer: Witzel sabia do processo que estava em segredo de Justiça. Comentou comigo”, afirmou o presidente.
“Vem de encontro aqui o que fala o Robson Bonin, do Radar da ‘Veja’. No meu entendimento, o senhor Witzel estava conduzindo o processo com o delegado da Polícia Civil pra tentar me incriminar ou pelo menos manchar o meu nome com essa falsa acusação, que eu poderia estar envolvido na morte da senhora Marielle.”
O evento no Clube Naval citado por Bolsonaro não consta da agenda oficial do presidente. Naquele dia, a agenda previa uma reunião às 17h30 com os ministros e, por volta das 21h, ele deixou um evento no Clube do Exército em Brasília.
A agenda pública de Wilson não está disponível no site do governo do RJ. Bolsonaro e Witzel estiveram juntos em um evento da Marinha dois dias depois, na tarde de 11 de outubro em Itaguaí, no estado do Rio.
Novos ataques à TV Globo
Nesta quarta, na Árabia Saudita, a repórter Delis Ortiz, da TV Globo, questionou o presidente se ele não considerava que a reportagem do Jornal Nacional foi equilibrada, porque mostrou a contradição do depoimento do porteiro e disse que Bolsonaro estava em Brasília naquele dia.
Bolsonaro reagiu com novos ataques:
“Primeiro, a Globo teve acesso ao processo que tá em segredo de justiça. Ponto final. A Globo diz que teve acesso à papeleta que mostra quem entrou no condomínio. Mentira da Globo. Tiveram acesso ao processo. Isso está dentro do processo. Resolveram se resguardar dizendo que tiveram acesso à planilha apenas. Não é de hoje que o sistema Globo me persegue e minha família, aqueles que tão do meu lado. É isso que vem acontecendo. A Globo quer destruir o Jair Bolsonaro, que acabou com a mamata da TV Globo de faturar bilhões por ano com propaganda oficial do governo”, afirmou o presidente.
Em nova nota, a Globo reitera que “teve acesso ao livro da portaria e, como deixa claro a reportagem, informou-se com múltiplas fontes sobre o conteúdo do depoimento do porteiro”.
“Não mentiu. Dada a relevância dos fatos, a Globo cumpriu a sua obrigação de informar o público, revelando o que disse o porteiro e todas as suas contradições, que ela própria apurou. A Globo não tem nenhum objetivo de destruir quem quer que seja, mas é independente para informar com serenidade todos os fatos, mesmo aqueles que possam irritar as autoridades. E assim pode agir, justamente porque não depende nem nunca dependeu de verbas de governos, embora a propaganda oficial seja legítima e legal”, diz a nota.
Bolsonaro quer novo depoimento do porteiro
O presidente afirmou ainda que o “porteiro ou se equivocou ou não leu o que assinou” e defendeu que ele seja ouvido novamente – desta vez, pela Polícia Federal.
“Pode o delegado ter feito… tomado a termo… escrito o que bem entendeu ali, e o porteiro, uma pessoa humilde, né, acabou assinando embaixo. Isso pode ter acontecido”, disse.
“Estou conversando com o ministro da Justiça o que pode ser feito pra gente tomar, via Polícia Federal, o depoimento novamente… O depoimento agora desse porteiro pela PF, pra esclarecer de vez esse fato, de modo que esse fantasma, né, que querem colocar no colo como possível mentor da morte da Marielle seja enterrado de vez.”
Nota de Witzel
O G1 procurou Witzel às 6h40 desta quarta, mas sua assessoria de imprensa informou que não iria se manifestar sobre a última declaração de Bolsonaro. Antes, o governo havia enviado a seguinte nota:
“Lamento profundamente a manifestação intempestiva do presidente Jair Bolsonaro. Ressalto que jamais houve qualquer tipo de interferência política nas investigações conduzidas pelo Ministério Público e a cargo da Polícia Civil. Em meu governo, as instituições funcionam plenamente e o respeito à lei rege todas nossas ações. Não transitamos no terreno da ilegalidade, não compactuo com vazamentos à imprensa. Não farei como fizeram comigo, prejulgar e condenar sem provas”, diz a nota.
“Hoje, fui atacado injustamente. Ainda assim, defenderei, como fiz durante os anos em que exerci a Magistratura, o equilíbrio e o bom senso nas relações pessoais e institucionais. Fui eleito sob a bandeira da ética, da moralidade e do combate à corrupção. E deste caminho não me afastarei”, continua a nota de Witzel.
Fonte: G1