Apuração sobre relação com ex-gestor de Miracema pode mudar investigação do crime que completa dois anos domingo.

Família de ciganos envolvida em diversos crimes cobra, na Justiça, R$ 1,7 milhão de espólio de Moisés da Sercon. A família vive momento de dor com a perda e falta de respostas com a investigação.

O crime completa dois anos no próximo domingo, 30.

Duas cobranças judiciais contra o espólio de Moisés Costa da Silva, o Moisés da Sercon, prefeito de Miracema do Tocantins encontrado morto com um tiro na cabeça em Miranorte no dia 30 de agosto de 2018, podem dar novo rumo às investigações do crime, que completa dois anos no próximo domingo.

As ações na Justiça foram movidas por parentes de ciganos que foram alvos de emboscada em julho de 2018, na capital tocantinense. Os tiroteios registrados nas quadras Arse 71 e 91 resultaram em prisões e na morte de um homem de 22 anos. Na época, os fatos tiveram muita repercussão na capital. O ocorrido é só uma pequena parte de uma trama terrível que envolve assassinatos cruéis, cárcere privado, prisões e agiotagem. Tudo isso em família.

Em Miracema, conforme a reportagem apurou, muito se questiona nos bastidores da política, do Judiciário e nas rodas de conversa em geral, sobre o caso. O simples cruzamento de datas de fatos que envolvem tanto atitudes dos ciganos, bem como o crime que vitimou o ex-chefe do Executivo municipal de Miracema tornam a relação entre os casos, no mínimo, factível de investigação.

A polícia não confirmou nenhum dado concreto da investigação até o momento e a família aponta que o crime teria motivação política. Os familiares de Moisés sempre defenderam o legado do ex-gestor e estão na luta para que os culpados do crime sejam apontados e punidos.

As informações  abordadas nesta reportagem foram fruto de apuração junto ao sistema judiciário através do acompanhamento processual e não faz juízo de valor sobre as investigações que estão a cargo da polícia.

AS COBRANÇAS

Luciano Cerqueira Dantas, da família alvo dos crimes das quadras 71 e 91, cobra na Justiça do espólio de Moisés da Sercon R$ 1,5 milhão. A cobrança consta no processo número 0001375-21-2019.8.27.2725, na 1ª Vara Cível de Miracema do Tocantins, que tem como titular o juiz André Fernando Gigo Leme Netto. A ação de embargos à execução foi ingressada em 15 de maio de 2019.
No processo consta uma nota promissória que teria sido assinada em 9 de janeiro de 2017 por Moisés da Sercon mas há vários questionamentos.

A nota tem como data de vencimento 20 de junho de 2018.

Já em outro processo, Paloma Pereira de Almeida, também da família de ciganos, cobra um total de R$ 201 mil. Já este embargo à execução faz parte do processo 0001043-54.2019.8.27.2725/TO, da mesma 1 Vara Cível de Miracema, também a cargo do mesmo magistrado. São, ao todo, três notas promissórias que constam no processo.

Outro detalhe : nenhuma dessas notas têm data de emissão. Consta apenas o vencimento, previsto para 10 de outubro de 2018. Uma é de R$ 134 mil. Há outras duas de R$ 33,5 mil cada.

CRIMES EM FAMÍLIA

Luciano Cerqueira Dantas, que cobra o espólio, é filho de Luciano Ribeiro Dantas. Ele também foi alvo de tentativa de assassinato em Palmas, que teria sido motivada por um crime bárbaro ocorrido no interior da Bahia.

Conforme a polícia da Bahia, em 2017, Luciano Dantas participou de um sequestro do seu primo Iranildo Gama Queiroz, juntamente com outros parentes. Eles exigiram resgate de R$ 5 milhões do pai da vítima, seu tio, Zanata Dantas. Foi feito o pagamento de R$ 500 mil, mas Iranildo foi morto, esquartejado e teve sua cabeça enviada à família.
Por vingança, ainda conforme a polícia, Zanata Dantas, teria contratado pistoleiros para que matassem o maior número possível de pessoas da família de Luciano. As informações são das investigações policiais sobre o caso em questão.

Nesta época, moradores de Palmas (TO), Luciano, sua esposa Vilma e seu irmão Florisvaldo Dantas escaparam da emboscada feridos, mas o filho de Luciano, João Vitor, foi morto. Ameaçado, Luciano se mudou para o interior de Rondônia, onde foi morto dentro de um supermercado, por dois homens que usavam metralhadoras.

Sua morte ocorreu no dia 29 de setembro, por volta das 13h. Ele estava num supermercado em Cerejeiras (RO), quando foi atingido por mais de 20 tiros desferidos por dois homens que fugiram em seguida. Vídeos do momento do crime foram publicados na imprensa. Conforme a polícia de Rondônia, Dantas usava Corolla blindado. Os presos acusados pelo crime confessaram, ainda de acordo com a investigação, que foram contratados por R$ 200 mil para vingar a morte de Iranildo, na Bahia.

Essa rixa familiar contabiliza dezenas de mortos. Houve também 13 tentativas de homicídio. As mortes ocorreram nos Estados da Bahia, Tocantins, Maranhão, Rondônia e no Distrito Federal.

DEFESA

Na defesa dos processos, Camila Fernandes, viúva de Moisés, alega, conforme declaração juntada no processo, que a dívida era de R$ 500 mil e não mais de R$ 1,5 milhão. Ela garante ainda que a dívida já teria sido paga. Para isso, juntou um recibo de quitação no valor de R$ 586 mil, assinado por João Vitor Cerqueira, morto durante a emboscada contra a família na Arse 71, em Palmas. A viúva se defende na justiça das alegações sobre as tais cobranças. Em meio a dor, Camila tem sido incansável na busca por justiça pela morte do marido.

Entretanto, até então, não se sabe  qual a origem dos valores, como Moisés da Sercon conheceu os ciganos e qual a sua relação com eles.

Em linhas gerais, o entrelaçamento dos casos apontam que em menos de dois meses foram três crimes.

A primeira foi a emboscada que vitimou os ciganos, em 26 de junho de 2018. Já a morte do então prefeito de Miracema ocorreu dia 30 de agosto do mesmo ano. E o assassinato de Luciano, em Rondônia, foi no dia 29 de setembro daquele ano.

A sociedade de Miracema do Tocantins cobra a conclusão da apuração da Polícia sobre o assassinato do ex-gestor. Querido na cidade e eleito com grande aprovação popular, Moisés não tinha inimigos, segundo familiares sempre afirmaram.

A indignação e sentimento de justiça da população  permeiam na busca de uma resposta para o crime bárbaro.

A família

O que diz a família

Antes da publicação da matéria o jurídico da família foi procurado pela família mas não quis se manifestar. O espaço ficou aberto para futuras manifestações.

Horas após a publicação, uma nota da viúva Camila foi encaminhada á nossa equipe.

Segue a íntegra da nota da viúva:

NOTA DE ESCLARECIMENTO

Sobre a matéria veiculada nos meios de comunicação sobre ações de execução de notas promissórias em desfavor do espólio de Moisés Costa da Silva, gostaríamos de esclarecer que tais supostas dívidas foram contestadas na Justiça, pois a família desconhece a sua existência e não as reconhece, porém não adentraremos no mérito por entender que é um assunto que cabe à justiça decidir.

Lamentamos, porém, que pessoas mal intencionadas, aproveitando-se da aproximação do período eleitoral, queiram fazer uso político de um fato que compete à justiça.

A morte do Moisés é responsabilidade da polícia esclarecer e identificar os autores e sua motivação e acreditamos que será elucidado.

Não respeitam dor da família, e tripudiam em cima de um assunto tão delicado, principalmente diante do momento.

A disputa eleitoral exige equilíbrio e respeito, não apenas aos concorrentes, mas principalmente ao povo, que espera propostas de seus representantes.

Camila Fernandes

O que diz a SSP

A secretaria se manifestou hoje sobre as investigações. Veja a íntegra da nota da pasta:

NOTA À IMPRENSA

ASSUNTO: CASO HOMICÍDIO PREFEITO MOISÉS COSTA DE MIRACEMA DO TOCANTINS

VEÍCULO: GAZETA DO CERRADO

DATA: 28.08.2020

A Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP-TO) esclarece que a Polícia Civil do Tocantins trabalha incansavelmente para esclarecer os casos de homicídios registrados em suas unidades. Num universo de aproximadamente 400 (quatrocentos) inquéritos de homicídios atualmente em curso na 1ª Divisão de Homicídio e Proteção à Pessoa de Palmas (1ª DHPP – Palmas), o caso do prefeito de Miracema do Tocantins, Moisés Costa (Moisés da Sercon), morto em 30 de agosto de 2018, tem seu andamento regular, porém em segredo de justiça, a fim de que sejam asseguradas as condições necessárias ao esclarecimento completo dos fatos, com a responsabilização dos eventuais culpados.

Tanto a Delegacia-Geral da Polícia Civil quanto ao SSP-TO, por meio de suas unidades de coordenação, têm feito esforços para dar o suporte necessário a todas as delegacias e especializadas da Polícia Civil do Tocantins em suas atividades, especialmente àquelas relacionadas ao combate ao crime organizado em quaisquer de suas modalidades.

A Segurança Pública ressalta que homicídios são, em geral, casos complexos, que muitas vezes levam tempo para serem elucidados a contento. Ainda assim, o trabalho é incansável, como demonstram os números da 1ª DHPP. Somente neste primeiro semestre de 2020, a Divisão instaurou 114 inquéritos e finalizou 55. Em 2019, foram 174 inquéritos instaurados e 64 finalizados. Entre os casos solucionados, citamos o latrocínio da empregada doméstica Leidiene Pacheco, morta em setembro de 2018, e o homicídio do empresário Elvisley Costa, em janeiro deste ano.

Em nome da 1ª DHPP de Palmas, o delegado-chefe Guido Camilo Ribeiro, reforça sua solidariedade para com a família do prefeito Moisés Costa. Informa, porém, que todos os inquéritos que tramitam na Divisão são prioridade. Afirma que entende a dor da família do prefeito e lembra que essa mesma dor é compartilhada por outras tantas famílias que também esperam a solução dos homicídios de seus entes queridos.

Apesar do sigilo das investigações respectivas, a SSP-TO Informa que a família do prefeito Moisés Costa será recebida em audiência na Delegacia-Geral da Polícia Civil para ratificar uma vez mais, entre outros, seu compromisso com a conclusão técnica do inquérito policial que apura o caso, dentro do tempo estritamente necessário para que as diligências sejam realizadas a contento.

A SSP-TO lamenta a dor das famílias tocantinenses que perderam seus entes queridos para a violência, e trabalha para dar a todas elas a melhor resposta estatal possível, apontando de forma cabal os responsáveis por tais crimes, sem qualquer tipo de discriminação ou privilégio, e valendo-se sempre dos melhores recursos disponíveis para a realização deste trabalho.

A Gazeta continua acompanhando o caso.