Equipe Gazeta do Cerrado
Matéria atualizada em 08/03/2019 às 18h07
Um documento divulgado pelo Ministério Público Estadual (MPE), nesta sexta-feira, 8, recomenda que em casos de homicídios praticados pela Polícia Militar contra civis, as investigações sejam realizadas pela Polícia Civil, conforme mandamento constitucional.
A recomendação diz ainda que possíveis envolvidos devem ser apresentados “à autoridade policial civil, utilizando-se, se necessário, das medidas legais, sem prejuízo da investigação pelo Ministério Público, através de procedimento investigatório”.
O MPE ressaltou ainda que chegou ao conhecimento da Corregedoria Geral, que “no caso de mortes de civis causada por militares, as investigações estão sendo levadas a efeito pela Polícia Militar, através de inquérito policial militar, verificando-se, ainda, a violação do local do crime, o recolhimento de armas e projéteis em prejuízo da perícia e o aquartelamento dos envolvidos, com óbices à colheita de depoimentos pela Polícia Civil”.
A Gazeta do Cerrado tenta entrou em contato com a Polícia Militar que informou que respeita as decisões internas do Ministério Público, por isso não se manifestará, visto que a recomendação é destinada “aos membros do Ministério Público do Estado do Tocantins”.
Confira na íntegra a recomendação:
O Corregedor-Geral do Ministério Público do Estado do Tocantins, no exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo inciso IV, do artigo 17 da Lei n° 8.625/93, e inciso VII, do artigo 39, da Lei Complementar Estadual nº 51/2008 e, CONSIDERANDO que o art. 125, § 4º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 45/2004, ressalvou expressamente a competência do júri quando a vítima for civil, verbis:
“Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios
estabelecidos nesta Constituição.
(…)
§ 4º. Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos
Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra
atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a
vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do
posto e da patente dos oficiais e da graduação
CORREGEDORIA-GERAL
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade
de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
(…)
§ 4º. Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira,
incubem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia
judiciária e a apuração das infrações penais, exceto as militares.
CONSIDERANDO que a Corregedoria-Geral da Polícia Militar editou a Instrução Normativa nº 01/2018, com o objetivo de regulamentar, no âmbito da Polícia Militar do Estado do Tocantins, “os procedimentos a serem adotados pelas autoridades militares no exercício de atividade de polícia judiciária militar nos crimes militares, inclusive os dolosos contra a vida de civis praticados por policiais militares”;
CONSIDERANDO que o art. 54 da Instrução Normativa nº 001/2018, ao conferir à Polícia Militar atribuição exclusiva para investigar crimes dolosos contra a vida praticados por militares contra civis, ofende o texto constitucional acima transcrito;
CONSIDERANDO que o art. 55 da referida Instrução Normativa, ao proibir as autoridades militares, sob pena de advertência e de responsabilização administrativa e penal, de apresentarem os envolvidos em delegacias da Polícia Civil, nos casos de crimes dolosos contra a vida de civil, de igual forma, viola o texto constitucional e usurpa atribuição delegada constitucionalmente à Polícia Civil;
CONSIDERANDO que já há precedente do Poder Judiciário do Estado do Tocantins reconhecendo a inconstitucionalidade incidenter tantum do artigo 54 da
sobredita Instrução Normativa e determinando, ainda, que a 2ª Companhia Independente da Polícia Militar (Dianópolis) se abstenha da aplicá-la (autos nº 0001137-63.2018.827.2716, Vara Criminal de Dianópolis);
CONSIDERANDO que o art. 82, § 2º, do Código de Processo Penal Militar determina, em casos de crimes dolosos contra a vida praticados por militares contra civil, a imediata remessa dos autos de inquérito policial militar à justiça comum, não conferindo qualquer exclusividade à Polícia Militar para apuração de delitos desta natureza
(TJTO, RSE n.º 0006798-23.2018.827.0000);
CORREGEDORIA-GERAL
CONSIDERANDO que a jurisprudência reconhece, de maneira remansosa, a atribuição da Polícia Civil para a apuração de delitos dolosos contra a vida praticados por militares contra civis (STJ. CC Nº 144.919. Rel. Min. Félix Fischer. 3ª Seção. DJE 01/07/2016; TJMG. HC n.º 1.0000.14.060645-0/000 – Comarca de Ipatinga/MG);
CONSIDERANDO que chegou ao conhecimento da Corregedoria Geral que, no caso de mortes de civis causada por militares, as investigações estão sendo levadas a efeito pela Polícia Militar, através de inquérito policial militar, verificando-se, ainda, a violação do local do crime, o recolhimento de armas e projéteis em prejuízo da perícia e o aquartelamento dos envolvidos, com óbices à colheita de depoimentos pela Polícia Civil;
CONSIDERANDO que, diante desse quadro, a Polícia Civil vem sinalizando que não mais fará perícia no local do crime e nem promoverá a instauração do inquérito policial respectivo, em que pese sua atribuição constitucional para tanto;
CONSIDERANDO que, nos autos de Pedido de Providências nº14/2018 (Classe II), a Corregedoria-Geral do Ministério Público já firmou entendimento no sentido de que os crimes dolosos contra a vida perpetrados por militares contra civis devem
ser investigados pela Polícia Civil;
RECOMENDA aos membros do Ministério Público do Estado do Tocantins, com atribuição no controle externo da atividade policial e em feitos que envolvem crimes dolosos contra a vida, que, em casos de homicídios praticados por militares contracivis, zelem para que as investigações sejam realizadas e presididas pela Polícia Civil,conforme mandamento constitucional, inclusive diligenciando para a devida apresentaçãodos envolvidos à autoridade policial civil, utilizando-se, se necessário, das medidas legais,sem prejuízo da investigação pelo Ministério Público, através de procedimento investigatório criminal, se o caso.
COMUNIQUE-SE. PUBLIQUE-SE. CUMPRA-SE.
Palmas, 08 de março de 2019.
MARCO ANTONIO ALVES BEZERRA
Corregedor-Geral
________________________________________________________________________