O Senado aprovou nessa quinta-feira, 29, por 55 votos a 19, um projeto que tem o objetivo de agilizar a quebra temporária de patentes de vacinas contra a Covid.

A proposta, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), segue para a análise da Câmara dos Deputados. O projeto altera uma lei de 1996 que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. A versão aprovada foi sugerida pelo senador Nelsinho Trad (PSD-MS), relator do texto.

O projeto também visa a dar maior celeridade à quebra temporária da patente do medicamento Remdesivir, um dos únicos remédios aprovados pela Anvisa para utilização no tratamento da doença provocada pelo coronavírus.

Pelo texto, a chamada licença compulsória temporária poderá ser concedida, de ofício (sem a provocação de alguém), quando o titular da patente “não atender às necessidades de emergência nacional ou de interesse público” ou de estado de calamidade pública nacional.

As licenças compulsórias temporárias só poderão, de acordo com o projeto, ser concedidas para instituições públicas, empresas privadas, ou organizações da sociedade civil “com efetivo interesse e capacidade econômica para realizar a exploração” dos produtos.

Segundo o texto aprovado, o Poder Executivo terá 30 dias para publicar a lista de patentes cujas licenças compulsórias atendam às suas necessidades.

Instituições de ensino e pesquisa e entidades da sociedade civil deverão ser consultadas no processo de elaboração da lista de patentes que poderão ser quebradas temporariamente.

O texto também prevê negociação entre os laboratórios e o governo para evitar essa licença compulsória. Segundo o projeto, mesmo as patentes sob risco de quebra poderão ser retiradas da lista caso os titulares se comprometam a atender às necessidades identificadas pelo Executivo.

Relator do projeto, o senador Nelsinho Trad (PSD-MS) falou à GloboNews sobre o projeto na manhã dessa quinta-feira, 29.

O projeto dá prazo de 30 dias para o governo implementar as novas regras, contados a partir da sanção pelo presidente Jair Bolsonaro. A lista de patentes a ser elaborada pelo Executivo deverá conter as seguintes informações:

  • número individualizado das patentes que poderão ser quebradas;
  • identificação dos respectivos titulares;
  • especificação dos objetivos para os quais será autorizada cada quebra de patente.

 

O titular da patente será obrigado a transmitir informações necessárias para a efetiva reprodução do objeto protegido pela patente e os demais aspectos técnicos, assim como os resultados de testes e outros dados necessários à concessão de seu registro pelas autoridades competentes.

Caso o titular da patente se negue a prestar as informações necessárias à reprodução do produto, como os desenhos industriais, poderá ser aberto processo de anulação do registro.

O texto prevê ainda que, por razões humanitárias, produtos que tiverem a patente quebrada poderão ser exportados para países em situação de emergência sanitária agravada pela carência de tais produtos.

Remuneração

 

Conforme a proposta aprovada, o titular da patente receberá uma remuneração pela concessão da licença compulsória. Para esse pagamento, serão considerados:

  • o valor econômico da licença concedida;
  • a duração da quebra da patente;
  • estimativas de investimentos necessários para sua exploração;
  • custos de produção;
  • venda no mercado nacional do produto a ela associado.

 

O pagamento deverá ser efetivado apenas depois da concessão da patente.

Defensores da proposta afirmam que a suspensão temporária das patentes permitirá a ampliação da produção de vacinas, o barateamento de custos e a contenção da pandemia. Eles também destacam a escassez de doses e ressaltam que há uma capacidade de produção de imunizantes no país que está ociosa.

Quebra de patentes no mundo

 

A suspensão temporária das patentes de imunizantes e insumos utilizados no enfrentamento da pandemia da Covid-19 tem sido defendida por países como Índia e África do Sul.

O Brasil – que historicamente se posicionou favoravelmente à quebra de patentes de medicamentos, como os utilizados no tratamento da Aids – não tem apoiado a ideia.

Debate

 

O projeto original do senador Paulo Paim previa que, enquanto vigorasse a emergência de saúde pública relacionada ao coronavírus, o Brasil não precisaria cumprir algumas obrigações previstas no Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (Trips, em inglês).

O relator do texto, senador Nelsinho Trad, entretanto, avaliou que tal medida, por estar relacionada a um tratado internacional, não poderia ser implementada por um projeto de lei ordinário.

Mesmo com as mudanças feitas por Trad, o governo orientou contra a aprovação do projeto. Para o vice-líder do governo, Carlos Viana (PSD-MG), o caminho “fácil” da quebra temporária de patentes pode levar à “destruição”.

“Quebrar patentes vai colocar o Brasil na mesma situação que nós vivemos nos anos 80, em que a América Latina, o Brasil, eram países tidos como não cumpridores de acordos, moratórias. E isso prejudicou e muito a nossa história e o nosso desenvolvimento, o enriquecimento do nosso povo”, disse Viana.

“O caminho para a vitória, para a prosperidade não passa por uma questão que parece simples como essa, não. Patentes são acordos internacionais de que o Brasil é signatário. Nós podemos quebrar, mas a transferência dessa intelectualidade, a transferência não vai ser feita; pelo contrário, o Brasil vai entrar na lista daqueles que não cumprem seus acordos”, acrescentou o governista.

Fonte: G1