Por Pérola Venâncio

No dia 1º de maio de 2022, em pleno feriado do Dia Internacional dos Trabalhadores, a ativista do Coletivo Mulheres Negras do Estado do Tocantins (Ajunta Preta), Charleide Matos, afirmou ter sido covardemente agredida por agentes da Guarda Metropolitana de Palmas enquanto frequentava uma distribuidora de bebidas no setor sul de Palmas. O caso, que repercutiu nas mídias regionais e até despertou uma ação da gestão municipal ao abrir uma sindicância, é mais um exemplo de racismo estrutural e violência arbitrária contra a população negra.

De acordo com os dados do Fórum Brasileiro de Segurança, a taxa de letalidade em operações policiais é 2,8 vezes maior entre pessoas negras do que entre brancos. Dos 6.416 brasileiros mortos por intervenção policial em 2020, 78,9% eram negros. Pessoas negras são as principais vítimas de ações violentadas em pelo menos 36 das 50 cidades com mais ocorrências de operações policiais no país.

O advogado e vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-TO, Cristian Ribas, argumentou sobre o caso em entrevista à Gazeta. “O caso da Charleide demonstra como a atuação das forças de segurança é muito mais violenta e arbitrária contra a população negra territorialmente periférica”, disse o advogado que também criticou e apontou uma omissão da gestão municipal da capital.

“Esse contexto também reflete a omissão sistêmica da Prefeitura de Palmas em implementar medidas concretas para coibir abusos cometidos pela Guarda Metropolitana. Enquanto prevalecer a indiferença para com a existência do racismo institucional no âmbito da segurança pública de Palmas, os poderes executivo e legislativo da nossa Capital, continuarão sendo coniventes com a brutalidade policial contra homens e mulheres negras. A sociedade precisa que a Prefeitura de Palmas e a Câmara Municipal apresentem respostas para mudar essa realidade” concluiu


Cristian Ribas


Charleide
Em entrevista a Gazeta, Charleide desabafa e agradece o acolhimento que recebeu após a agressão. “Primeiro quero agradecer a todas as instituições, coletivos, movimentos negros, jornalistas e as pessoas que vieram no meu privado me apoiar, acolher e me dá forças. E também agradecer a prefeita Cintia Ribeiro por repudiar o ato de violência contra meu corpo e também contra todas as instituições de direitos humanas que represento” disse a ativista, que também também deixou uma dura crítica ao sistema criminal tocantinense.


Charleide Matos

“Quero falar também em nome de todas as mães pretas periferias que tem seus corpos dos seus filhos e maridos violentados pelo estado e dizer que nos estamos cansada com esse sistema criminal do Tocantins. E não é com violência que construímos uma cidade inclusiva para todos e todas e sim com formação nas instituições e comunidades. Esse sistema criminal do Tocantins já provou que todos os tipos de violência só aumenta no estado, tendo em vista que os dados mostram o encarceramento de pessoas pretas e pardas são de 80% nos presídios, onde a maiorias dos crimes cometidos são de pouca relevância e as vezes nem se querem foram julgados, estamos apenas enxugando gelo” criticou Charleide.

Apelo pela melhoria do sistema.
“Eu acredito que os cursos de agentes comunitário de segurança pode ser o caminho para diminuir a criminalização nas periferias esse modelo já foi aprovado em vários estado do Brasil está dando certo. Esse projeto já foi aprovado pelo governo do Estados antes da pandemia. Vários agentes de segurança já fizeram e algumas pessoas e lideranças comunitárias” disse Charleide, se referindo ao Projeto de lei (PL 5245/2020) (PT-ES) que obriga cursos de capacitação de agentes de segurança pública e privada a apresentarem conteúdos relacionados a direitos humanos e combate ao racismo e a outras formas de discriminação.

O também advogado, Marcos Castilho, falou sobre a “Insegurança pública” sofrida pela população negra. “A violência vivida por Charleide revela, mais uma vez, que a questão do racismo da (In)Segurança Pública, exercida pelas mais diversas instituições que compõe o chamado ‘Estado Democrático de Direito’, não é individual, isolado, mas engendra o pensamento e ação daqueles que detém o poder. A classe trabalhadora, além de ver o seu trabalho ser progressivamente precarizado, também lida com as formas de violência, que são instrumento de proteção da burguesia e de seus privilégios.”, concluiu Marcos.

Caso Vinicius Lucas
O Coordenador Estadual do Movimento Negro Unificado – Seção Tocantins, Stânio Vieira, relembrou o caso de Vinicius Lucas, que também sofreu violência por parte da Guarda Metropolitana ainda neste ano, em fevereiro.


Stânio Vieira

“O fato ocorrido com a Charleide Matos mostra o processo de intolerância social que alguns grupos sociais passam cotidianamente no Brasil.No caso os negros são alvos dessa intolerância que é o ódio racial . As ações de violência sofridas por Charleide e em fevereiro com Vinícius Lucas mostram que há muitas instituições coniventes com essa barbárie. A guarda metropolitana vem praticando esses atos há muito tempo , no entanto continuam porque não há interesse do poder público municipal solucionar. É a forma típica do racismo institucional que por sua vez se estende ao racismo estrutural que é o enraizamento cultural do racismo na sociedade. O Movimento Negro Unificado, assim como no caso do Vinícius Lucas, irá acompanhar esse caso, inclusive juridicamente. Racismo é crime!” Disse Stânio.