Memorial Dona Raimunda – Foto – Gazeta do Cerrado
Do Bico do Papagaio – Maju Cotrim, Gazeta do Cerrado
Descendo pra Palmas após cobertura especial no Bico do Papagaio neste sábado, 25, passamos para visitar as quebradeiras de coco no Povoado Sete Barracas, em São Miguel do Tocantins. (Assista o vídeo no final).
Pela janela, visualizamos o “museu” da Dona Raimunda ao lado da casa onde ela viveu até seus últimos dias. Um memorial que precisa ser revitalizado, virar ponto turístico e de história para alunos e visitantes! Instituições precisam juntar forças para ajudar a família a cuidar das memórias dela no local!
Já é a terceira vez que passamos pelo povoado e o local está fechado. Da janela vemos fotos históricas, objetos que ajudam a contar a história da luta de Dona Raimunda e muita coisa ainda como ela deixou.
O Memorial é um lugar sagrado para a comunidade e amigas de Dona Raimunda que lutam todos os dias para manter seu legado. Todas fazem questão de falar da saudade da líder e da inspiração que ela é para todas!
Na casa de Dona Raimunda mora um familiar que cuida do local e as simpáticas bisnetas gêmeas, Cecília e Julia que acenam na janela dando tchau.
Na última entrevista que concedeu à Gazeta ela disse uma frase marcante: “ tô aqui cheia de diploma e homenagem na parede e quase ficando cega”. A fala demonstra o quanto o
Tocantins precisa despertar urgente para preservar suas histórias vivas e mulheres guerreiras através de políticas de cuidado e Saúde para que elas possam viver cada vez mais e melhor!
O atual Memorial foi feito com incentivo do cineasta Marcelo Silva, que foi amigo pessoal de Dona Raimunda e eternizou a história dela através de um famoso curta documentário. Ele, como já disse em entrevista à Gazeta, continua se dedicando para que a história dela seja preservada e a causa das quebradeiras tenha a visibilidade que merece.
Dona Raimunda vive!
Dona Raimunda Quebradeira de Coco foi uma trabalhadora rural, líder comunitária e ativista política brasileira e tocantinense.
Nascida e criada em Novo Jardim (MA), filha de agricultores, com 10 irmãos, casou-se aos 18 anos, teve uma vida difícil, decidiu abandonar o marido 14 anos depois e criar sozinha os seis filhos, trabalhando como lavradora. Baixinha de traços e personalidade fortes, na sua fala simples, mistura temas do cotidiano e toca em feridas sociais em seus discursos, em comunidades agrícolas ou palácios, sem perder o tom. Foi uma líder nata, de visão política apurada.
Em 1991, fundou junto à outras mulheres a Associação Regional das Mulheres Trabalhadoras Rurais do Bico do Papagaio (Asmubip). Começaram a promover encontros para discutir seus direitos, primeiro nos municípios mais próximos e, em seguida, nos estados vizinhos. Logo, em 1992, criaram o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), que hoje é atuante nos estados do Pará, Tocantins, Piauí e Maranhão.
Milhares de mulheres vivem da coleta do coco babaçu, nativo da região. Da amêndoa, extraem o óleo vegetal, com o qual cozinham e produzem sabão. Da casca do coco, fazem lenha; da palha da árvore, cestos. Nada se perde. Essas mulheres só utilizam para si o que sobra da produção. O trabalho da coleta e a quebra do coco é uma tarefa difícil, pouca é a amêndoa comercializada no final do dia.
Aos 20 anos aprendeu a assinar o nome e tornou-se porta voz de 400 mil trabalhadoras rurais extrativistas, em defesa do meio ambiente e dos direitos das mulheres. Em sua trajetória, foi responsável pela Secretaria da Mulher Trabalhadora Rural Extrativista do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS).
Devido a atuação na defesa dos direitos das mulheres trabalhadoras da região do Bico do Papagaio, recebeu o título de Doutora Honoris Causa da Universidade Federal do Tocantins e prêmios como o Diploma Mulher-Cidadã Guilhermina Ribeira da Silva (Assembleia Legislativa do Tocantins) e o Diploma Bertha Lutz (Senado Federal) concedido às mulheres que ofereceram relevante contribuição na defesa dos direitos da mulher e questões de gênero no Brasil. Em 2005, integrou a lista mundial das mil mulheres que concorreram ao prêmio Nobel da Paz.
Na luta incentivou o povo a se organizar e crer em sua própria força, embasada na fé.
Ela é autora de várias poesias e músicas, onde denuncia a injustiça imposta ao povo do campo pela estrutura opressiva e expressa a esperança de um mundo diferente. A sua trajetória virou a trama central do vídeo-documentário “Raimunda, a quebradeira” e tem muito de sua história e das companheiras quebradeiras de coco contadas na produção do cineasta Marcelo Silva.
Uma frase marcante de Dona Raimunda: “O fato de ganhar esses prêmios todos não mudou em nada na minha vida, eu continuo da mesma forma, vivendo do mesmo jeito. O reconhecimento só me fez ter ainda mais responsabilidade. A luta continua. Eu não quero morrer matada, quero morrer na cama, sou feita do pó da terra, e é pra lá que voltarei.”