De acordo com dados da Secretaria Estadual de Saúde (SES) no ano de 2018 o Tocantins registrou 11.037 partos normais contra 14.372 cesáreas. O número preocupa. Segundo a fisioterapeuta Wilma Manduca, que trabalha com preparação de mulheres para o parto há 34 anos, a Organização Mundial de Saúde (OMS) preconiza que as estatísticas em torno das cesáreas realizadas devem chegar ao número máximo de 15% do total de partos. No Tocantins, elas ultrapassam os partos normais.

A profissional explica que o crescimento de cesáreas agendadas está ligado também ao aumento de prematuridades iatrogênicas (bebês retirados sem indicação), em mulheres que fazem cesarianas agendadas ou com a avaliação incorreta da idade gestacional.

A humanização do parto, de acordo com a fisioterapeuta, não é o antônimo de ‘desumanização’, como muitos pensam. O termo vem do movimento filosófico chamado ‘humanismo’, que destaca a ideia de que o corpo pertence à mulher. Sendo assim, cabe a ela decidir quantos filhos vai ter, assim como será o processo do parto, colocando a escolha nas mãos das mães, tornando-as protagonistas do nascimento de seu bebê, com o objetivo de tornar a experiência a melhor possível para a dupla mãe e filho.

Ainda desmistificando a concepção de humanizado, Wilma esclarece que as cesáreas também podem ser feitas desta forma, desde que a escolha seja realizada de maneira consciente e que a vivência do nascimento tenha afetividade e favoreça o vínculo materno.

Deixar o bebê em contato com a pele da mãe por uma hora, incentivar a amamentação neste primeiro momento, não cortar o cordão umbilical até que ele pare espontaneamente de pulsar, só dar o primeiro banho após as 24 horas de vida da criança são algumas das características da humanização do parto, que podem ser empregadas tanto se a escolha for pelo procedimento normal ou na cesárea.

“São mais de 50% de crianças nascendo através de uma cirurgia. Sabemos que muitas são realizadas de forma desnecessária. A cesárea é ótima, veio para salvar vidas, quando ela é bem empregada. O problema é quando ela é usada fora do trabalho de parto, com a intenção de facilitar, por conveniência médica ou da paciente, sem considerar os sinais do bebê de que está pronto para sair. Quando ela é feita sem precisar você aumenta os riscos para a mulher em até seis vezes”.

E fazendo coro ao movimento de humanização do parto, idealizada com o objetivo de facilitar o nascimento de forma natural, o Hospital Palmas Medical ganhou uma sala conhecida como Delivery Room. A ideia do espaço é colocar a disposição das pacientes o máximo de recursos para que o parto seja tranquilo e com menos dor para a mãe.

Desde a iluminação, que pode ser mais intensa e de cores variadas durante o processo, até uma banheira com água aquecida e hidromassagem que pode ser utilizada para aliviar a dor ou servir como local para o parto, a sala foi toda pensada para as mães que terão os filhos de forma natural.

“O espaço tem barras para que a mulher possa fazer exercícios com posições que estimulam o processo, temos bola para ajudar, temos um gancho no teto onde podemos pendurar uma faixa para a mulher se segurar, o que também favorece a postura e os exercícios durante o trabalho de parto. A sala tem uma cama adequada para fazer as suturas, se forem necessárias. O ambiente tem privacidade, com baixa luminosidade e com música. Ele é adequado e pensado para que a mulher possa ficar naquele local com o seu companheiro, com a doula, seu obstetra e fazer com que este processo seja o mais tranquilo e menos doloroso possível”, explica Wilma, responsável pelo projeto dentro do Hospital Palmas Medical.

Dar apoio ao parto natural é um dos princípios, na opinião da profissional, para que unidades hospitalares sejam exemplos desse movimento. No Tocantins, a suíte de Delivery Room do HPM pode ser usada por pacientes de convênios ou particulares.

“O Medical tem o potencial de ser referência na questão da humanização e é a proposta que temos aqui. Não só ter a suíte, mas dar o incentivo, o apoio ao parto natural, mesmo que seja cesárea. Queremos que a UTI Neonatal seja um espaço onde os pais podem não ser apenas visitas, mas podem ter livre acesso para verem seus bebês. Que no caso dos bebês prematuros eles tenham cuidado especial, alojamento canguru. Vamos trabalhar o incentivo ao aleitamento materno e estes são passos que serão implementados para que o Hospital se torne essa referência no Estado”.

Ao longo dos anos

O movimento de humanização do parto vem ganhando forças no País nos últimos anos. Grupos de apoio de mulheres na vida real e nas redes sociais vem pautando a importância de uma assistência mais humanizada em hospitais e maternidades da rede pública e particular de todo o Brasil. Para Wilma, as possibilidades que existem atualmente está melhorando com o passar do tempo.

“Tive o primeiro contato com humanização do parto e com outras possibilidades de parir em posição vertical, sem intervenções ainda no fim da década de 80, início da década de 90. Desde então venho empregando isso em Palmas. Não tínhamos a estrutura que temos hoje, isso é um progresso. As mulheres entendem e tem acesso a uma estrutura mais adequada para que elas possam fazer dessa experiência um momento prazeroso. É isso que a OMS preconiza nas últimas recomendações de fevereiro de 2018. Que o parto possa ser uma experiência prazerosa, de alegria e felicidade para a mãe. Que essa experiência possa favorecer o vínculo dela com a família e fazer com que essa mulher influencie outras e a gente consiga mudar o cenário horroroso dos altos números de cesáreas no País”.

A mãe

Larisse Mota de Brito Nascimento, que está grávida de 37 semanas, já fez a sua escolha. Formada em nutrição, a futura mamãe conta que teve contato com o parto humanizado durante a faculdade e desde que descobriu que teria um filho, começou a pesquisar o assunto. A dúvida de Larisse, comum a tantas outras mães, era a de descobrir o que seria melhor para ela e para o bebê na experiência do parto.

“Tive um contato breve com o tema durante a graduação e agora estou fazendo pós-graduação em nutrição materna e infantil. Me interesso pelo tema. Sempre sonhei em ser mãe e por ter contato com este lado assim que engravidei procurei saber da diferenças dos partos, de poder fazer a minha escolha, de tudo que já tinha aprendido sobre parto normal. Mas até então a questão do parto humanizado, que muita gente não sabe, é que ele pode ser humanizado tanto para uma cesárea quanto para um parto normal”, explica.

A nutricionista entende que no caso de nascimentos com cirurgia, estas precisam ser recomendadas e necessárias. Para ela, independente de como o parto vai ser o que ela quer é o poder de escolha.

“Eu vou poder escolher a posição que vou parir, eu posso comer, beber, posso fazer coisas que antes a medicina dizia que não podia durante este processo. Por isso o parto se tornou algo tão trágico para as mulheres, por conta das muitas proibições. Hoje temos a realidade de saber o que é o parto humanizado, independente de como, nos deixa mais tranquila, saber que apesar de ser um momento de dor, será um momento feliz. Os bebês sabem nascer, as mulheres sabem parir, meu corpo está preparado para isso, meu filho vai saber nascer e por isso quero fazer com que esse momento seja maravilhoso, bom pra mim e para meu filho. Quero que ele venha ao mundo da maneira mais acolhedora possível”, finaliza.