Com muita emoção, expectativa e reunindo mulheres das 16 etnias do estado, o Governo do Tocantins, por meio da Secretaria dos Povos Originários e Tradicionais (Sepot), realizou nos dias 7 e 8, o 1º Fórum de Proteção da Mulher Indígena, em Palmas. A solenidade contou com a presença de mais de 150 pessoas, incluindo representantes de órgãos das esferas governamentais e lideranças indígenas. Visando discutir propostas para a implementação de políticas públicas voltadas ao enfrentamento da violência contra as mulheres indígenas, constituiu-se uma rede de proteção composta por secretarias e instituições que atuam nesta força-tarefa.

A programação foi marcada pela realização de dinâmicas de escuta e acolhimento às mulheres, com a colaboração de psicólogos, rodas de conversa, mostra de artesanato, além da palestra de letramento étnico-Cultural. Um dos pontos altos do evento foi a apresentação das cartas de intenções, que destacou as demandas e medidas que as mulheres consideram relevantes para essa pauta. Ao integrar as propostas de maneira transversal, a rede segue o caminho inverso, ou seja, as demandas dessas mulheres são discutidas de fora para dentro, através da escuta e do diálogo, com o objetivo de compreender a realidade social e cultural de cada povo.

O 1º Fórum de Proteção da Mulher Indígena conta com a parceria da Secretaria da Mulher (SecMulher), Secretaria da Educação (Seduc), Distrito Sanitário Especial Indígena Tocantins (Dsei), Poder Judiciário, Defensoria Pública do Estado do Tocantins (DPE/TO), Ministério Público do Tocantins (MPTO), Ministério Público Federal (MPF), Secretaria de Segurança Pública (SSP), Secretaria da Cidadania e Justiça (Seciju) e Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Sevidi).

Em sua fala, o secretário dos Povos Originários e Tradicionais, Paulo Waikarnãse Xerente, destacou a relevância do fórum para lidar com as diferentes formas de violência contra as mulheres nos territórios, além da criação de mecanismos de proteção com o apoio da rede de parcerias. “Neste fórum, levantamos as nossas bandeiras em defesa dos direitos das mulheres indígenas, com o propósito de construir um futuro onde suas vozes sejam ouvidas e respeitadas. Saibam que vocês inspiram outras mulheres a continuar lutando pelos seus direitos. Por meio desta rede, assumimos o compromisso de fortalecer nossas comunidades, de denunciar as violências e construir um futuro mais justo para todas”, declarou.

“É com grande satisfação que realizamos este fórum com pessoas tão engajadas e comprometidas com as políticas públicas para as mulheres indígenas. O Tocantins avança em direção a um equilíbrio entre os povos que aqui residem. Agradeço a toda a equipe da Sepot pelo trabalho incansável em defesa e segurança dos povos originários e tradicionais. Nossa parceria é fundamental para levar as demandas das mulheres para o governo”, afirmou a secretária da Mulher, Berenice Barbosa.

De acordo com o diretor de Proteção aos Indígenas, Célio Thorkã Kanela, mais do que uma oportunidade para implementar medidas de combate à violência, o fórum proporciona um diálogo sensível, uma troca de experiências a partir das vivências de cada participante que representa a voz reprimida de outras mulheres indígenas. “Reconhecemos a relevância de ouvir diretamente as vozes das mulheres indígenas, por serem elas que vivenciam essa violência em sua plenitude. Por isso, visamos criar espaços de diálogo e participação, onde elas possam compartilhar suas experiências e propor soluções”, ressaltou.

“Esperamos que este fórum seja o primeiro de muitos. É fundamental que eventos como esse se repitam anualmente para que possamos acompanhar os avanços, identificar novas demandas e fortalecer a luta por nossos direitos. A mulher indígena merece respeito e tem direito a uma vida digna”, disse o coordenador do Distrito de Saúde Indígena do Tocantins (Dsei), Hará Javaé.

INTERCÂMBIO DE IDEIAS

A Secretaria dos Povos Originários e Tradicionais (Sepot) coordena políticas públicas para 16 etnias, distribuídas em oito territórios do estado. Diante da necessidade de fortalecer a proteção a essas mulheres, foi proposta a criação da rede de apoio adaptada às realidades de cada povo indígena.

“Como mulher indígena, enxergo esse fórum como um momento para podermos cobrar políticas e mecanismos de proteção dos órgãos competentes pela causa”, destacou Janaína Xerente, uma das participantes.

Maria Aparecida Apinajé, professora da Educação Básica, disse que o evento incentiva a perspectiva de mudança na vida dessas mulheres. “Me sinto honrada em participar dessa rede de proteção, por ser necessário e emergente pensarmos em políticas públicas para as mulheres indígenas. Atuamos nas escolas indígenas no combate à violência e a Seduc tem buscado parcerias para somar na conscientização dos nossos estudantes”.

“Como representante do DSEI/TO e do povo Xerente, o fórum foi uma excelente iniciativa, porque mostra que o Estado está realmente sensibilizado em proteger as mulheres indígenas. “Parabenizo a Sepot e a Secretaria da Mulher por darem esse primeiro passo para a realização do fórum, por essa escuta e diálogo com as mulheres. Temos nossas particularidades em questões culturais, e este evento é para mostrar como vivemos na base, e de que forma podemos auxiliar o Estado a criar mecanismos para nos defender”, enfatizou Waithy Xerente, advogada do Distrito Sanitário Especial Indígena do Tocantins (DSEI/TO).

“Ressaltamos a importância dessa integração entre os órgãos, pois recebemos informações bastante relevantes. Espero poder compartilhar com a instituição na qual colaboro, para podermos fazer uma parceria e troca de ideias, com intuito de apoiar a população indígena do nosso estado”, comentou Suzana Fleury, delegada de polícia da Secretaria de Segurança Pública.

LEITURA DAS CARTAS DE INTENÇÕES

Entre cantos e danças, o encerramento do 1º Fórum de Proteção da Mulher Indígena ainda foi palco da leitura das cinco cartas de intenções escritas pelos grupos temáticos formados na dinâmica de acolhimento. Nesses documentos, as mulheres indígenas expressaram suas principais demandas e desafios, como violência, melhor acesso à educação e saúde, alcoolismo e questões relacionadas à vida nas aldeias. As cartas servirão como instrumentos para direcionar ações e políticas públicas específicas para atender às necessidades apontadas nessa mediação.

Tarimaru Karajá, ao ler a carta, destacou que as mulheres indígenas sofrem uma interseção de violências no âmbito histórico, físico, psicológico e sexual. “A invasão de suas terras, o alcoolismo e o machismo estrutural agravam essa situação, especialmente nas aldeias. A violência sexual, inclusive contra crianças, e os altos índices de suicídio são consequências diretas desse cenário”, pontuou.

Já a liderança feminina, Noemi Xerente, destacou que a dificuldade em denunciar casos de abuso é agravada pela falta de infraestrutura, transporte adequado e serviços de acolhimento eficazes. “A distância e o medo de retaliações impedem muitas mulheres de buscar justiça. Casamentos arranjados e filhos resultantes de abusos são realidades que marcam nossas comunidades. Jovens mães, muitas vezes sem apoio familiar e com poucas oportunidades, enfrentam uma dupla jornada: criar seus filhos em condições precárias e lidar com a falta de assistência do Estado. A ausência de escolas de qualidade, políticas de pensão alimentícia e programas de suporte social aprofundam essa desigualdade”, afirmou.

Uma das principais questões abordadas foi a violência patrimonial, que não se trata apenas de objetos quebrados ou dinheiro roubado, mas também do controle sobre o trabalho e a renda das mulheres, como reforçou Raabe Krahô. “Nós, mulheres indígenas, temos voz e queremos ser ouvidas. Podemos, e devemos, participar ativamente de conselhos, reuniões e decisões que impactam nossas vidas. É lamentável que, em muitas situações, ainda se acredite que o lugar da mulher seja apenas em casa. Este fórum é um passo fundamental para mudar essa realidade. Queremos que ele se torne um evento anual, para que mais mulheres indígenas possam participar e fortalecer suas vozes”, concluiu.