Não há dúvida de que o acesso a capital empreendedor é mais difícil para as mulheres do que para os homens. Vemos isso nas conversas com investidores e empreendedoras, nas análises de portfólios dos fundos de venture capital e nas pesquisas realizadas sobre o tema. Nos Estados Unidos, estatísticas dão conta de que 38% das startups são fundadas por mulheres, mas estas só recebem 2% de todo o capital investido.

No Brasil, a situação não é diferente. A maioria dos investidores e investidoras concorda que o quadro precisa mudar: diversidade agrega valor, aumenta a inovação e melhora os resultados das startups. A questão é como promover essa mudança. Não há uma única resposta para essa pergunta. Mas posso dar uma pista. Para que as fundadoras consigam ter mais acesso a capital, é preciso mudar a forma como jogamos o jogo, e o jogo começa no pitch.

Durante minha trajetória, assisti a muitos pitches em busca de investimento e conversei com diversos investidores que haviam se interessado ou não pelos projetos. Quando as mulheres fazem as suas apresentações, duas situações tendem a se repetir. A primeira é que as empreendedoras se mostram competentes para liderar times, são detalhistas em seus projetos e entendem profundamente a dor que a sua startup busca solucionar. A segunda é que as mulheres não apresentam os números do negócio, não costumam ter métricas definidas e não mostram informações financeiras detalhadas.

Para que uma startup cresça, o empreendedor precisa ter métricas claras e fazer um acompanhamento minucioso desses indicadores. A fórmula da startup enxuta, criada por Eric Ries, faz toda a diferença — é preciso construir, medir e aprender. Não basta conhecer profundamente o mercado e construir uma proposta de valor matadora. É necessário acompanhar de perto os indicadores financeiros.  Capital é sempre um recurso escasso para uma empresa que tem como objetivo crescer 20% ao ano por vários anos. Ou seja: para empreendedoras em busca de investimento, ter domínio de métricas e finanças faz toda a diferença. Mas só isso não é suficiente.

Um estudo publicado em 2017 no Academy of Management Journal, mostra que os investidores têm expectativas diferentes quando veem pitches de empreendedores do sexo masculino e do sexo feminino, e isso se expressa na forma como as perguntas são feitas. Para chegar aos resultados, a pesquisadora Dana Kanze analisou mais de 140 pitches que ocorreram durante uma competição de startups do TechCrunch Disrupt, em Nova York. Ela dividiu as perguntas que os investidores faziam aos empreendedores em dois tipos: questões de promoção (relativas ao potencial de crescimento) ou de prevenção (referentes às possíveis perdas com o negócio). Depois, analisou as diferenças entre as questões feitas aos homens e às mulheres. A conclusão foi surpreendente: os homens haviam recebido mais perguntas sobre o potencial de ganhos, enquanto as mulheres ouviram mais questões sobre a possibilidade de perdas.

Investidores-anjo e fundos de venture capital estão sempre focados em empresas com alto potencial de crescimento. Para esse tipo de investidor, uma empresa que esteja concentrada apenas em atingir o equilíbrio não interessa. Dessa maneira, todas as vezes que um empreendedor do sexo masculino responde sobre o potencial de ganho, ele tem a chance de dar respostas alinhadas com as expectativas dos investidores. No caso das mulheres, as questões sobre perdas fazem com que falem apenas sobre o que pretendem fazer para que a startup não dê errado. O resultado é que, mesmo quando as empresas lideradas por homens e mulheres têm potenciais similares, os homens conseguem levantar muito mais capital.

Entender esse ponto é fundamental para que as mulheres possam virar o jogo. Nada de ficar na defensiva, tentando provar que sua empresa não será um fracasso. Em vez disso, elas devem responder de maneira inspiradora, transformando as questões de prevenção em oportunidades de promoção. Quando um investidor perguntar como fará para não ser engolida pela concorrência, explique suas estratégias para gerar valor e bater os competidores. E, se alguém questionar quando sua empresa atingirá o break even, você pode responder que, mais do que equilíbrio, está buscando um faturamento de tantos milhões. Mostre, com números, como esse faturamento fará que atinja o equilíbrio em 18 meses, e como pretende escalar a partir desse ponto. Quebre os paradigmas. Reverta as expectativas. Dessa maneira, você estará contribuindo para acabar com o preconceito de gênero e transformar o ecossistema empreendedor.

Maria Rita Spina Bueno é diretora-executiva da Anjos do Brasil, rede de investidores-anjo com sede em São Paulo. É fundadora da Mulheres Investidores-Anjo, MIA, movimento de fomento ao investimento-anjo feminino para apoio a empreendedoras de alto potencial de crescimento. 

Fonte: Pequenas Empresas e Grandes Negócios