As mulheres que têm uma predisposição natural para acordar cedo apresentam menos risco de desenvolver câncer de mama. É o que afirmam pesquisadores da Universidade de Bristol, no Reino Unido.
Eles ainda não desvendaram, no entanto, o motivo.
De acordo com especialistas, os resultados são relevantes porque podem afetar o risco de toda mulher ter a doença.
Eles dizem ainda que o estudo, apresentado na NCRI Cancer Conference, em Glasgow, na Escócia, aumentou o entendimento sobre a importância do sono na saúde de uma maneira geral.
Relógio biológico
Todo mundo tem um relógio biológico interno, que determina como o corpo funciona em um padrão de aproximadamente 24 horas – processo também conhecido como ritmo circadiano.
E ele afeta tudo, desde a hora em que vamos dormir até nosso humor e risco de ataque cardíaco.
Mas nem todos os relógios internos marcam o mesmo horário.
As pessoas diurnas acordam cedo, são mais dispostas no início do dia e sentem sono no começo da noite.
Já quem é notívago tem dificuldade de levantar de manhã, é mais produtivo no fim do dia e prefere dormir tarde.
E isso está relacionado com o câncer de mama?
Os pesquisadores acreditam que sim. Eles usaram um sistema novo e inteligente de análise de dados – chamado randomização mendeliana.
E analisaram 341 fragmentos de DNA que controlam se somos propensos a ser diurnos ou noturnos.
Eles usaram esse conhecimento para realizar um experimento com mais de 180 mil participantes do UK Biobank, banco de dados do Reino Unido, e cerca de 230 mil mulheres do consórcio internacional contra o câncer de mama (BCAC, na sigla em inglês).
E constataram que pessoas geneticamente programadas para serem diurnas eram menos propensas a ter câncer de mama do que aquelas concebidas para serem noturnas.
Como esses fragmentos de DNA são definidos no nascimento e não estão ligados a outras causas conhecidas de câncer, como a obesidade, significa que os pesquisadores estão bastante confiantes de que o relógio biológico está associado ao câncer.
Qual a intensidade do efeito?
Cerca de uma em cada sete mulheres no Reino Unido vai desenvolver câncer de mama ao longo da vida.
Mas este estudo analisou apenas um pequeno recorte de oito anos da vida de uma mulher.
Neste período, duas em cada 100 mulheres com hábitos noturnos desenvolveram a doença, em comparação com uma em cada 100 com hábitos diurnos.
“As descobertas são potencialmente muito importantes porque o sono é universal e facilmente modificado”, diz Rebecca Richmond, uma das pesquisadoras da Universidade de Bristol.
“Pesquisas anteriores analisaram o impacto do trabalho noturno, mas essa pesquisa mostra que pode haver um fator de risco para todas as mulheres.”
Idade e histórico familiar são alguns dos principais fatores de risco para o câncer de mama, mas segundo a ONG britânica Cancer Research UK, dedicada a combater a doença, cerca de um quarto dos casos pode ser prevenido.
Uma boa noite de sono evitaria o câncer então?
Não é tão simples assim.
Richmond afirma que ainda é cedo para dar conselhos objetivos às mulheres.
“Ainda precisamos entender o que faz uma pessoa noturna ter um risco maior do que uma diurna… precisamos desvendar essa relação”, disse à BBC.
Tem a ver com o relógio biológico propriamente dito? Ou os notívagos são prejudicados por viverem fora de sincronia com seus relógios internos ao terem que acordar cedo e ir trabalhar? O relógio biológico afeta os níveis hormonais para alterar o risco de câncer, o sistema imunológico ou o metabolismo?
Há muitas perguntas ainda sem resposta.
Os pesquisadores estão certos?
A ciência nunca tem 100% de certeza, mas o resultado se encaixa em um panorama mais amplo.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) já alertou que passar por cima do relógio biológico em decorrência do trabalho noturno está provavelmente associado ao risco de câncer.
“Esses resultados intrigantes se somam ao crescente número de evidências de que existe alguma sobreposição entre a genética de quando preferimos dormir e o risco de câncer de mama, mas mais pesquisas são necessárias para desvendar os detalhes desta relação”, diz Richard Berks, da ONG britânica Breast Cancer Now.
Estudos semelhantes revelaram uma relação das preferências de sono e saúde mental, incluindo risco de esquizofrenia.
“O uso da randomização mendeliana neste estudo permite aos pesquisadores examinar o efeito causal no câncer de mama de diferentes padrões de sono”, afirma Cliona Kirwan, cirurgiã de mama e pesquisadora da Universidade de Manchester, no Reino Unido.
“Estas são descobertas interessantes que fornecem mais evidências de como o relógio biológico e nossa preferência natural pelo sono estão envolvidos no surgimento do câncer de mama”, completa.
Os resultados foram publicados no site dos pesquisadores, mas ainda não passaram por revisão científica pelos pares.
Fonte: BBC