Jalapoeira Apurada estreia no dia 7 de dezembro em Palmas, Tocantins, e conta com peças
suspensas por pés metálicos que formam uma grande instalação artística


Mulheres de três associações quilombolas do Tocantins – Associação Comunitária dos
Artesãos e Pequenos Produtores de Mateiros (ACAPPM), Associação de Artesãos e
Extrativistas do Povoado do Mumbuca e Associação Quilombo do Prata se reuniram, pela
primeira vez, para criar uma série de esculturas feitas com capim dourado e buriti.

Jalapoeira Apurada é o nome da coleção inédita que conta com objetos suspensos por
pés metálicos que chegam até um metro e oitenta de altura. As peças carregam memórias
e contam histórias de um saber ancestral passado de geração em geração, remetendo a
valores como coletividade, senso de pertencimento e ancestralidade.

Com o apoio do WWF-Brasil, Instituto A Gente Transforma (IAGT) e Central do Cerrado, as
três associações se empenharam em um processo criativo desafiador ao longo de quase
2 anos.

“Foi um projeto maravilhoso, muito desafiador no primeiro momento porque
ficamos com medo de não conseguir fazer”, relembra Railane Ribeiro da Silva, de 28 anos,
presidente da associação do Mumbuca, “Os modelos que ele (Marcelo Rosenbaum) trazia
nunca tinham sido feitos de capim dourado, então a gente ficou com medo de arriscar”.

Uma vez deixado de lado o receio de tentar, elas aprenderam que eram capazes de fazer
e fizeram muito bem feito. “Esse projeto proporcionou ainda muita união entre as três
associações, muita força e muita garra de nós todas”.

A proposta foi a de utilizar os mesmos materiais e técnicas que as artesãs já utilizavam
no dia a dia, porém em grandes proporções para trazer novos produtos e encontrar novos
mercados. “Durante a imersão que fizemos para este projeto, entendemos que tratava-se
de um exercício de escuta, de trazer o protagonismo das mulheres quilombolas e exaltar
esse saber fazer manual que é uma arte ancestral. Buscamos construir uma identidade
que partisse das suas memórias com o capim dourado e motivá-las a falar neste lugar de
conhecedoras desse universo amplo de arte e de resistência na luta pelo território.

O próprio nome Jalapoeira Apurada, criado por elas, remete à reivindicação pela autoria do
artesanato do capim dourado e ao orgulho de pertencer ao Jalapão. O que queremos trazer
aqui é a força dessa união de mulheres que trabalham pela conservação do Cerrado”,
ressalta Marcelo Rosenbaum, presidente do Instituto A Gente Transforma.
“Esse não é um projeto que veio pronto, nós construímos juntos. E tem mesmo que ser
com todo mundo, tem que ser o melhor para as nossas artesãs”, comemora Laudeci
Ribeiro de Souza Monteiro, 45 anos, presidente da ACAPPM.

“Antes, quantos projetos
não chegaram aqui com tudo pronto, sem ouvir a gente? Não à toa, não iam para a frente.”
O objetivo foi fomentar a produção das artesãs e, consequentemente, melhorar a
qualidade de vida de toda comunidade. “Já está provado que povos e comunidades
tradicionais são os grandes protetores dos ambientes naturais”, explica Ana Carolina
Bauer, analista de conservação WWF Brasil.

“Queremos chamar a atenção para esse
Bioma e mostrar que a valorização das comunidades e dos saberes tradicionais são
essenciais para a conservação e manutenção do Cerrado. Além dessa coleção, o projeto
também inclui ações de orientação para o manejo correto do fogo, treinamento sobre
precificação e apoios na estruturação física e administrativa das associações e suas
lojas”, completa Bauer.

Luzia Passos Ribeiro, 35 anos, presidente da Associação Quilombo do Prata, conta que
em sua comunidade, 90 famílias vivem da agricultura familiar e do extrativismo. “Poucos
aqui têm salário, a pesca paga muito pouco, então o capim representou um trabalho
diferenciado em termos de renda”, conta. Ainda sem a titularidade oficial emitida pelo
governo, o Quilombo do Prata hoje sofre pressão do agronegócio, que avança pela região
principalmente com a monocultura da soja. “Também por isso precisamos manter essa
cultura viva, para preservar a nossa região, a nossa casa. Já imaginou o Jalapão sem o
capim dourado? Não existe”, desabafa Luzia.

Maria Aparecida Ribeiro de Sousa, presidente da Central do Cerrado, também uma artesã
do quilombo do Prata, celebra a conquista. A Central, que acompanha as três associações
há 18 anos, sabe da importância desta coleção. “O Capim dourado não é novidade, mas
agora ele chega com um novo olhar e traz novas perspectivas”, diz ela. “Nossa expectativa
é que ela amplie os horizontes das associações, que aumente o mercado para elas. É isso
que ajuda a manter uma cultura em pé. Afinal, as principais guardiãs do Cerrado são essas
mulheres”.