Maju Cotrim

Através de ato no Diario Oficial, o Tribunal de Contas pediu a suspensão de um processo licitatório da prefeitura de Gurupi para contratação de georreferenciamento no valor estimado de mais de R$ 5,4 milhões.

O despacho trata-se de edital de licitação, na modalidade concorrência pública, autuada sob número 006/2019, tipo técnica e preço, elaborado pela Prefeitura de Gurupi/TO, visando a contratação de empresa especializada em serviço técnico de georreferenciamento para modernização dos serviços de fiscalização e da gestão territorial urbana do município de Gurupi/TO, no valor estimado de R$ 5.421.748,34, com data prevista para o dia
14 de janeiro de 2020.

Foram apontados inconsistências no edital: “Este procedimento licitatório não está inscrito e disponível no Sistema SICAP-LCO, o que já configura uma irregularidade, em clara inobservância das normas desta Egrégia Corte de Contas”, diz o ato.

Veja abaixo os questionamentos apontados pelo TCE:

A técnica de perfilamento a laser prevista no Edital e Termo de Referência é uma alternativa existente. É confiável na elaboração de Modelo Digital de Superfície (MDS), entretanto, sua utilização no contexto de planejamento urbano de pequenas cidades, como é o caso em questão, é inadequada, antieconômica e incompatível com a finalidade.

É desnecessário esse tipo avançado de tecnologia para atender
a finalidade de cadastro urbano, regularização fundiária e planta genérica de valores. Há também quantidade reduzida de empresas que
realizam esse tipo serviço. Há alternativas de aquisição de imagens aéreas de alta resolução com custos menores e que atendem igualmente ao proposto. O custo do perfilamento a laser representa um óbice ao planejamento orçamentário e financeiro de pequenas cidades.


A citação da tecnologia de perfilamento a laser no termo de referência/projeto básico de licitações pode estar atrelada ao uso de
modelos pré-definidos extraídos de licitações de engenharia cartográfica realizadas nas grandes cidades ou de Termos de Referencia elaborados por empresas especializadas, uma vez que exprimem características técnicas de geoprocessamento altamente específicas. É possível que o Termo de Referência não tenha sido construído pelos técnicos da Prefeitura de Gurupi.


O artigo 13 da Portaria 511 de 07 de dezembro de 2009 do Ministério da Cidade, que dispõe sobre diretrizes para a criação, instituição
e atualização do Cadastro Territorial Multifinalitário (CTM) nos municípios brasileiros aduz o seguinte:


Os limites físicos das parcelas podem ser obtidos por métodos topográficos, geodésicos, fotogramétricos e outros que proporcionem precisões compatíveis.


Deste modo, é admissível que qualquer outro método de alta precisão cartográfica seja empregado. Vale destacar que as orientações desta portaria para elaboração de cadastro territorial, sequer mencionam ou recomendam a utilização de MDS gerado por perfilamento a laser.
Ressalta-se ainda que, para a obtenção da “nuvem de pontos” que compõe o MDS, não necessariamente se faz necessário o emprego da tecnologia indicada no instrumento convocatório. O uso de veículos aéreos não tripulados (VANT) com tecnologia de posicionamento embarcada (RPK/PPK) tem se mostrado vantajoso sistema no contexto das cidades tocantinenses, sem prejuízos ou deméritos:


primeiramente por entregar aerofotogrametria com resolução espacial de 6,0 cm (superior ao licitado), além de dispor de “nuvem de
pontos” capazes de criar um modelo digital de superfície por estereofotogrametria.


Como exemplo, foram efetuados serviços semelhantes em dois municípios Tocantinenses:

  1. Paraíso do Tocantins, cidade com população estimada em 50 mil habitantes. Foi realizado trabalho similar ao da referida licitação
    com emprego de imagens de satélite WorldView III, com resolução espacial de 30 cm georreferenciada com apoio de pontos de controle
    terrestre. Também estavam inclusos no escopo do projeto da construção da base cartográfica georreferenciada, o cadastro urbano, o Portal GISWeb e a atualização da lei que dispõe sobre a Planta Genérica de Valores do município. O projeto teve duração de dez meses a um
    custo de R$ 340.000,00 (trezentos e quarenta mil reais);
  2. Pedro Afonso, serviço similar realizado com o emprego de VANT (ao invés de perfilamento a laser), com resolução espacial de
    6,5 cm. Também estavam inclusos no escopo do projeto da construção da base cartográfica georreferenciada, o cadastro urbano, o Portal
    GISWeb e a atualização da lei que dispõe sobre a Planta Genérica de Valores do município. O projeto teve duração de sete meses a um
    custo de R$ 140.000,00 (cento e quarenta mil reais).
    Nessas cidades foram realizados serviços com as mesmas finalidades pretendidas pela Prefeitura de Gurupi, acrescidos da Planta
    Genérica de Valores, que atualizam a receita própria municipal a um custo muito inferior ao pretendido no procedimento em questão.
    Nas orientações da Portaria 511 de 07 de dezembro de 2009 do Ministério das Cidades, não há recomendações de perfilamento a
    laser ou obrigatoriedade de Modelo Digital de Superfície (MDS) para o cadastramento territorial. Entretanto tal modelo pode ser gerado
    através de “nuvem de pontos” por tecnologias diversas, precisas e mais econômicas.
    Como a Licitação é do tipo TECNICA E PREÇO, o Termo de Referência nos itens 13.1 e 13.2 aduzem que:
    13.1. No que tange à equação ponderada para o cálculo da pontuação final, privilegiar-se-á a técnica em percentual de 70%, e preço
    em percentual de 30% em relação ao todo do objeto, em razão de as demandas apresentadas distinguirem-se por conter elevada complexidade e especificidade técnica, requerendo conhecimento técnico especializado de natureza predominantemente intelectual de profissionais de variadas áreas, para a consecução dos trabalhos, a fim de atender às peculiaridades do objeto.
    13.2. Será declarada vencedora da licitação a licitante que obtiver a maior Nota Final (NF).
    Em nosso entendimento utilizar 70% como índice para Técnica e 30% para Preço na formação do valor final é inadequado, já que a
    despesa para o erário poderá aumentar de forma considerável, dado o valor vultoso da licitação.
    A sugestão é que os pesos das Notas Técnica e de Preços sejam iguais, de 50% (cinquenta porcento).
    6.3. Ao final, a Coordenadoria de Análise de Atos, Contratos e Fiscalização de Obras e Serviços de Engenharia – CAENG sugeriu a
    esta relatoria a suspensão do certame referido.
    6.4. Diante do exposto, para melhor esclarecimento dos fatos, bem como em atenção ao Princípio da Ampla Defesa e do Contraditório, determino que sejam adotadas as seguintes providências:
    a) remessa do presente expediente à Coordenadoria de Protocolo Geral – COPRO, com o fi m de que proceda a autuação do presente
    expediente como Procedimento Licitatório – Concorrência nº 06/2019, no sistema e-Contas e atualize a lista dos responsáveis conforme
    este cabeçalho;
    b) determinar a remessa dos presentes autos à Secretaria do Pleno deste Tribunal de Contas – SEPLE, para que adote as seguintes
    providências:
    I – a publicação deste despacho, nos termos do art. 341, § 3º do Regimento Interno desta Corte, para que surta os efeitos legais
    necessários;
    c) encaminhar os autos à Coordenadoria de Diligências para proceder a INTIMAÇÃO dos Excelentíssimos Senhores Mario Cezar Lustosa Ribeiro (Secretário Municipal de Planejamento e Finanças de Gurupi) – CPF: 451.734.400-53 e Marcelo Adriano Stefanello (Presidente
    da Comissão Permanente de Licitação) – CPF: 838.121.991-49, com urgência, para manifestação, em setenta e duas horas, com fundamento no art. 42[1], da Instrução Normativa nº 001, de 24.02.2010, combinado com o art. 2º[2] da Lei 8.437/1992, sobre o pedido de suspensão cautelar do processo licitatório respectivo, sobretudo pelas diferenças significativas de valores apontados no Parecer Técnico (Informaçãonº 1/2020- CAENG – ev. 2), podendo indicar possíveis sobrepreços em relação aos preços médios de mercado, violando a regra do art. 7º,
    § 2º, inciso II, da Lei 8.666/1993, além de juntar cópia integral do certame (Concorrência Pública nº 006/2019), inclusive as cotações que
    subsidiaram a formação do termo de referência mencionado;
    d) com a vinda da manifestação ou escoado o lapso temporal, apreciarei o pleito de medida acauteladora;
    e) considerando o teor da Informação 01/2020 – Relatório Preliminar da CAENG, Unidade Técnica deste Tribunal, com fundamento
    no art. 8º[3], § 9º, da Instrução Normativa 02/2008, RECOMENDA-SE O ADIAMENTO DA SESSÃO DE ABERTURA DAS PROPOSTAS PREVISTA PARA O DIA 14/01/2020, ATÉ DELIBERAÇÃO DESTA CORTE. CASO TENHA SIDO REALIZADA A SESSÃO DE ABERTURA E JULGAMENTO REFERIDA RECOMENDA-SE A SUSPENSÃO DO PROCESSO LICITATÓRIO RETRO NO ESTADO EM QUE SE ENCONTRA.

[1] Art. 42. O envio ao Tribunal de Contas dos editais, contratos ou qualquer instrumento congênere solicitado pelo Relator dar-se-á
no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas após a ciência do responsável. (NR) (Instrução Normativa nº 001, de 24.02.2010, Boletim
Ofi cial do TCE/TO de 02.03.2010);


[2] Art. 2º No mandado de segurança coletivo e na ação civil pública, a liminar será concedida, quando cabível, após a audiência do
representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de setenta e duas horas.


[3] § 9º Na eventual impossibilidade de o Tribunal de Contas concluir o exame do edital antes da data de recebimento das propostas,
e havendo necessidade de correções, manifestada pelo Corpo Especial de Auditores, pelo Ministério Público ou pelo Relator, deverá o fato
ser comunicado ao órgão respectivo para que se proceda ao adiamento do ato licitatório.


Tribunal de Contas do Estado do Tocantins, GABINETE DA 4ª RELATORIA em Palmas, Capital do Estado, aos dias 13 do mês de
janeiro de 2020.


Conselheiro Napoleão de Souza Luz Sobrinho
Relator