Comunidade Quilombola Rio Preto fica em situação de vulnerabilidade após decisão; "julgamento antecipado", diz advogado

Uma decisão recente da Justiça Federal reacendeu a preocupação de moradores e defensores da Comunidade Quilombola Rio Preto, localizada no município de Lagoa do Tocantins, ao retirar os efeitos que protegiam a posse do território tradicional ocupado pela comunidade. Embora não determine despejo imediato, a sentença coloca as famílias em situação de vulnerabilidade jurídica.

Em entrevista à Gazeta do Cerrado, o advogado popular e assessor jurídico de movimentos sociais e comunidades tradicionais, Cristian Ribas, explicou que a decisão não implica retirada imediata das famílias, mas representa um risco concreto. “A decisão retira, elimina, o que protegia a posse da comunidade, mas ela vai ser recorrida. Não é algo imediato, do tipo ‘saiu a decisão e amanhã a comunidade será expulsa’. Não funciona assim. Mas a comunidade passa a ficar numa condição de vulnerabilidade”, afirmou.

Segundo o advogado, a defesa da comunidade já articula recursos para tentar reverter o entendimento judicial.

Cristian Ribas destacou que a sentença, com cerca de 20 páginas, reconhece em parte a condição quilombola da comunidade, mas levanta questionamentos quanto à ausência de informações individualizadas sobre os moradores. No entanto, ele aponta que o cerne do problema jurídico está na forma como o processo foi conduzido.

“A questão jurídica central é que a magistrada decidiu fazer o julgamento antecipado da lide. Esse processo é de alta complexidade e deveria ter sido devidamente instruído, como foi requerido pelo Ministério Público Federal, pela Defensoria Pública da União e pela Defensoria Pública do Estado”, explicou.

De acordo com o advogado, as instituições haviam solicitado a produção de um laudo antropológico, fundamental para reconhecer formalmente a territorialidade da comunidade, além da oitiva de testemunhas. Para ele, a ausência dessas etapas compromete a análise do caso.
“Ao nosso ver, o julgamento antecipado foi um grande equívoco”, avaliou.

PSOL manifesta apoio e repúdio à decisão

Diante da decisão judicial, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) divulgou nota pública de apoio e solidariedade à Comunidade Quilombola Rio Preto. No documento, o partido afirma acompanhar com “extrema preocupação” as denúncias de violações de direitos humanos e socioambientais que atingem as famílias quilombolas.

O PSOL lembra que o direito ao território tradicional é garantido pela Constituição Federal de 1988, por meio do Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), e regulamentado pelo Decreto nº 4.887/2003, que obriga o Estado brasileiro a reconhecer, demarcar e titular as terras quilombolas.

Na nota, o partido repudia qualquer tentativa de remoção forçada e cobra medidas imediatas das autoridades, incluindo o Poder Judiciário, o Incra, a Fundação Cultural Palmares, o Governo do Estado e órgãos de defesa dos direitos humanos.

Entre as exigências estão a suspensão da sentença, a interrupção de qualquer ordem de despejo, a garantia da permanência da comunidade no território e a celeridade no processo de regularização fundiária.

“A luta da Comunidade Quilombola Rio Preto é a luta pela preservação de um patrimônio cultural, histórico e ambiental de todo o Brasil”, afirma o PSOL na nota, reforçando que continuará vigilante na defesa dos direitos da comunidade.

Brener Nunes

Repórter

Jornalista formado pela Universidade Federal do Tocantins

Jornalista formado pela Universidade Federal do Tocantins