
A Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) vem a público denunciar crimes ambientais e contínuos atos de violação de direitos humanos contra o Território Quilombola Rio Preto, localizado no município de Lagoa do Tocantins (TO), e cobrar das autoridades competentes ações imediatas para interromper essa sequência de violências e garantir a segurança das famílias.
A comunidade registrou boletim de ocorrência na Polícia Civil denunciando a empresa Lagoa Dourada por crime ambiental e continuidade da prática de esbulho possessório. De acordo com o registro policial, no dia 30 de setembro de 2025, na área da Comunidade Quilombola Rio Preto, funcionários da referida empresa, utilizando uma retroescavadeira, invadiram o território e cometeram crime ambiental.

Segundo relatos e registros feitos pelos moradores, os funcionários da empresa Lagoa Dourada lançaram entulhos dentro do brejo conhecido como Brejo Seco, com a clara intenção de intimidar a comunidade. O material foi depositado de forma a tentar tornar o local transitável para veículos, em uma ação de constrangimento e ameaça aos moradores.
Mesmo diante de sentença judicial que proíbe a empresa Lagoa Dourada de praticar qualquer ato de esbulho possessório contra os quilombolas, bem como de adentrar ou intervir na área da comunidade — sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) —, a empresa segue descumprindo a decisão.
Devido à falta de punição e de medidas efetivas de proteção à comunidade, há mais de dois anos as famílias vêm sendo vítimas de uma série de ataques criminosos e violações de direitos, incluindo incêndios, destruição de estradas e plantações com o uso de tratores, construção de cercas e instalação de placas proibindo a circulação de moradores, além de ameaças, intimidações e outros atos de violência.
Histórico
Os episódios de violência e violações de direitos humanos vivenciados pelo quilombo se intensificaram em setembro de 2023, quando o território sofreu ataques com incêndios criminosos em residências, além de novas ameaças e intimidações. Os ataques ocorreram após a Justiça revogar a decisão anterior que concedia reintegração de posse a fazendeiros e determinar a manutenção da posse pela comunidade Rio Preto, bem como o fim da prática de esbulho na área.
A comunidade, formada por cerca de 50 famílias, foi oficialmente reconhecida como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares em 25 de outubro de 2023. Contudo, mesmo após o reconhecimento, o Território Quilombola Rio Preto continua enfrentando situações de medo e insegurança.
A presidente do quilombo, Rita Lopes, relatou que a insegurança é tamanha que não tem conseguido visitar a comunidade ou realizar as atividades da associação, devido às ameaças constantes.
“Eu não estou conseguindo ir dentro do território por causa das ameaças. Já recebi ligações e áudios de pessoas querendo que eu desfaça a associação, me intimidando”, declarou.
A sequência de crimes, além de representar uma ameaça à vida das famílias, também impacta a biodiversidade local.
A COEQTO e a comunidade vêm denunciando a situação desde 2023. O caso é de conhecimento das autoridades em todas as instâncias — estadual, municipal e federal. No entanto, a situação de insegurança, ameaças e violações continua a ser praticada contra a comunidade.
A COEQTO solicita a intervenção imediata das autoridades competentes, o cumprimento da sentença judicial vigente e a garantia real e efetiva da segurança das famílias do Quilombo Rio Preto. É inadmissível que os criminosos continuem agindo impunemente, colocando em risco a vida das famílias e o meio ambiente.
O outro lado
Uma das empresa acusadas encaminhou nota à Gazeta do Cerrado sobre o assunto. Veja a íntegra abaixo:
Não houve nenhuma degradação ambiental ou intenção de prejudicar a comunidade quilombola por parte da Fazenda Lagoa Dourada. Tampouco houve esbulho possessório em qualquer área alheia. Todas as atividades desenvolvidas pela Fazenda ocorrem estritamente dentro dos limites de sua propriedade, a qual possui documentação regular e registro, estando sob a posse de seus atuais proprietários há pelo menos 10 (dez) anos.
O local apontado como alvo de “lançamento de entulhos” é, na realidade, uma estrada vicinal preexistente e consolidada há muitos anos. A atividade realizada foi a mera manutenção e arrumação dessa via para permitir o tráfego de veículos, o que não configura, em absoluto, ameaça, intimidação ou crime ambiental. Conforme o arcabouço legal vigente e a jurisprudência pátria, a manutenção de estrada em propriedade privada ou em via de acesso consolidada não se enquadra nessas tipificações penais ou cíveis, sendo certo que essa realidade será devidamente reconhecida pelas autoridades competentes.
Embora seja verídica a existência de uma demanda judicial sobre a delimitação de uma área quilombola, é imperioso destacar que tal área não se confunde com a propriedade da Fazenda Lagoa Dourada. A Fazenda reitera que nunca praticou qualquer ato de esbulho de terras alheias. As atividades diárias realizadas por seus funcionários ocorrem exclusivamente dentro dos limites de sua propriedade, sem invadir ou violar quaisquer direitos de terceiros, inclusive da comunidade quilombola. Dessa forma, inexiste qualquer descumprimento de ordem judicial ou fundamento para a aplicação de multas à Fazenda Lagoa Dourada.
A Fazenda Lagoa Dourada nega veementemente e com a maior ênfase possível todas as alegações publicadas pela imprensa que a conectam a tais atos. As afirmações são graves, infundadas e desprovidas de qualquer prova que as corroborem. A Fazenda e seus proprietários jamais praticaram ou compactuaram com qualquer tipo de violência, ameaça, intimidação ou ato criminoso, como incêndios ou destruição de bens de terceiros. Se, de fato, tais atos ocorreram na região, não podem ser imputados à Fazenda Lagoa Dourada.
Na verdade, se há uma vítima nas circunstâncias narradas, são os proprietários rurais do entorno que, muitas vezes, veem-se envolvidos em conflitos complexos e são alvo de acusações sem o devido contraditório.
Assim como já explicitado, quaisquer atos praticados contra a comunidade quilombola ou contra a Sra. Rita Lopes, conforme narrado, não podem ser imputados à Fazenda Lagoa Dourada. A Fazenda reitera seu respeito irrestrito às leis e aos direitos de todos, conforme previsto na Constituição Federal e demais diplomas legais.
Outrossim, aproveita a Fazenda Lagoa Dourada para, por meio desta, reiterar e corroborar o pleito da COEQTO (Coordenação das Associações e Comunidades Quilombolas do Tocantins) e das instâncias superiores para que se delibere urgentemente sobre a demanda de delimitação da área quilombola, a fim de pacificar a região e evitar a continuidade de conflitos e acusações infundadas.
Certos da atenção que V.Sas. dispensarão ao presente pleito, antecipadamente agradecemos.
Fonte: Assessoria de Comunicação COEQTO