Justiça suspende obra da Hidrovia Araguaia-Tocantins por risco a comunidades e falhas em licenciamento

A Justiça Federal no Pará determinou a suspensão imediata das obras de derrocamento do Pedral do Lourenço, etapa considerada central para a viabilização da Hidrovia Araguaia-Tocantins. A decisão foi assinada na quarta-feira, 25, pelo juiz federal substituto André Luís Cavalcanti Silva, da 9ª Vara Federal Ambiental e Agrária, e impede qualquer avanço físico no trecho de 35 quilômetros do leito do Rio Tocantins, entre Santa Terezinha do Tauiri e a Ilha do Bogéa.

O magistrado atendeu parcialmente à ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF), que aponta falhas no licenciamento ambiental emitido pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e na condução do projeto pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).

MPF denuncia violações legais e ameaça a comunidades

O MPF sustenta que a Licença de Instalação concedida pelo Ibama em fevereiro de 2025 é nula, pois desrespeita uma decisão judicial anterior que exigia a entrega de estudos específicos sobre o impacto da obra na pesca artesanal — atividade essencial à subsistência de comunidades ribeirinhas.

Além disso, o órgão aponta que o licenciamento foi concedido sem consulta prévia, livre e informada às populações indígenas, quilombolas e ribeirinhas potencialmente afetadas, o que viola diretamente a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), com força de lei no Brasil.

O MPF também critica o que chamou de “fatiamento irregular” do licenciamento, que ignora impactos cumulativos e sinérgicos ao longo dos 560 km do projeto da hidrovia. Para o órgão, os efeitos ambientais podem incluir erosão das margens, alteração de habitats aquáticos, poluição hídrica e prejuízos graves à biodiversidade local.

Juiz ordena inspeção judicial no rio

Como parte da decisão, o juiz André Luís Cavalcanti determinou a realização de uma inspeção judicial in loco no trecho impactado. As partes terão até dez dias para indicar os pontos a serem visitados e os especialistas que irão acompanhar a diligência. A data da visita será definida após articulação com órgãos de segurança pública.

“A visita é relevante para captar peculiaridades que não podem ser totalmente traduzidas em documentos técnicos”, explicou o magistrado.

Ibama e DNIT defendem legalidade da obra

O DNIT e o Ibama defenderam, em manifestação conjunta, a regularidade do processo e alegaram que as comunidades citadas pelo MPF estão fora da área de influência direta da intervenção. Os órgãos destacam a importância estratégica da hidrovia para o escoamento de até 20 milhões de toneladas por ano de grãos e minérios do Cerrado até o Oceano Atlântico.

A licença emitida pelo Ibama tem validade de cinco anos, prevê a execução de 32 programas ambientais, impede a retirada de vegetação nativa e reserva R$ 5 milhões para compensações ambientais.

Obra continua paralisada

Com a nova decisão, todas as atividades no trecho do Pedral do Lourenço seguem suspensas por tempo indeterminado. A Justiça Federal ainda vai analisar o pedido principal do MPF, que é a anulação definitiva da Licença de Instalação.

O DNIT já recorreu de decisões anteriores no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), mas o caso ainda não tem julgamento final. Até lá, a obra continua sem data para retomada.

Brener Nunes

Repórter

Jornalista formado pela Universidade Federal do Tocantins

Jornalista formado pela Universidade Federal do Tocantins