Ministério Público Federal no Tocantins - Divulgação
Ministério Público Federal no Tocantins - Divulgação

O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com uma ação na Justiça para anular a licença de instalação concedida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para o derrocamento do Pedral do Lourenço, no rio Tocantins. O licenciamento é considerado uma etapa estratégica para a implantação da hidrovia Araguaia-Tocantins, cujo objetivo é permitir a navegação em um trecho de 500 km ao longo do rio, viabilizando o escoamento de grãos e minérios até o oceano Atlântico.

Segundo o MPF, a autorização concedida pelo presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, no último dia 26 de fevereiro, é ilegal por violar uma decisão judicial vigente, descumprir condicionantes da licença prévia e ignorar completamente a necessidade de consulta prévia, livre e informada às comunidades tradicionais potencialmente afetadas — entre elas indígenas, quilombolas e ribeirinhos.

Violação de decisão judicial

De acordo com o MPF, a licença desrespeita uma sentença anterior que exigia, entre outras medidas, a apresentação de estudos sobre o desembarque pesqueiro, fundamentais para dimensionar os impactos socioeconômicos da obra sobre populações que dependem diretamente da pesca artesanal.

Além disso, a Procuradoria aponta que o processo de licenciamento ambiental foi “fatiado” de maneira indevida, ou seja, conduzido de forma fragmentada, sem considerar os impactos acumulados e sinérgicos do empreendimento completo. Isso, segundo o órgão, fere o princípio da precaução e impede uma análise realista dos danos ambientais e sociais.

Falta de consulta a comunidades

Outro ponto central da ação do MPF é o descumprimento da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que exige que projetos com potencial impacto sobre comunidades tradicionais sejam precedidos de consulta prévia, livre e informada. O MPF afirma que não houve qualquer tipo de diálogo com as populações afetadas, o que compromete a legalidade do processo.

“O licenciamento ignorou completamente a obrigação de ouvir aqueles que vivem há gerações às margens do rio e dependem diretamente de seus recursos”, destacou o MPF em nota.

Impactos ambientais

O projeto do DNIT prevê o derrocamento de afloramentos rochosos e dragagem ao longo de cerca de 560 km do rio Tocantins, afetando trechos que passam por estados como Tocantins, Maranhão e Pará. O objetivo é permitir a passagem de comboios de embarcações durante todo o ano, inclusive no período de estiagem.

Entretanto, especialistas ouvidos pelo MPF alertam que a obra pode provocar erosões nas margens, turbidez da água, alterações nos habitats aquáticos, perda de biodiversidade, queda na produção pesqueira e impactos na segurança alimentar de milhares de famílias ribeirinhas.

“O projeto foi classificado como de baixo impacto ambiental, o que é tecnicamente insustentável diante da magnitude das intervenções previstas”, afirma a ação.

Defesa da obra

Apesar das críticas, autoridades do Executivo defendem o empreendimento como crucial para o desenvolvimento econômico da região. O governador do Tocantins, Wanderlei Barbosa, celebrou a emissão da licença e destacou que a hidrovia tem potencial para movimentar até 20 milhões de toneladas anuais de carga, consolidando o Araguaia-Tocantins como uma nova rota logística para o agronegócio.

A licença de instalação possui validade de cinco anos e impõe ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) a execução de 32 programas ambientais. Estão previstas, ainda, medidas de mitigação e compensações no valor aproximado de R$ 5 milhões.

Brener Nunes

Repórter

Jornalista formado pela Universidade Federal do Tocantins

Jornalista formado pela Universidade Federal do Tocantins