om a rápida expansão do zika em território brasileiro nos últimos anos, há um tempo pesquisas na Fiocruz tentam indicar se outros vetores — além do Aedes aegypti — são capazes de transmitir o vírus.
A desconfiança maior recaiu sobre o pernilongo Culex quinquefasciatus que, como o Aedes, é comum em áreas urbanas. A Fiocruz, então, foi investigar se o mosquito é capaz de transmitir o zika – e, agora, após o sequenciamento genético parcial do vírus encontrado no mosquito, pesquisadores afirmam que há dados consistentes capazes de sugerir que o Culex é transmissor do zika em Recife.
O estudo foi publicado nesta terça-feira (9) no “Emerging Microbes & Infections”, publicação do grupo “Nature”.
“No Recife, a população de Culex é maior que a do Aedes. A hipótese era que, se o pernilongo fosse um vetor, isso poderia explicar o porquê do zika ter se espalhado com relativa rapidez aqui e no Brasil”, aponta Gabriel Wallau, pesquisador da Fiocruz e um dos autores do artigo.
A Fiocruz já sequenciou genoma do zika coletado em humanos. O artigo foi publicado na revista “PLos” em 2016. Agora, a diferença foi que o vírus sequenciado foi obtido do mosquito coletados em Pernambuco. Semelhanças entre os dois sequenciamentos se somam ao corpo de evidências de que o Culex tem potencial para ser um vetor.
Além disso, cientistas descreveram evidências microscópicas de que o vírus está se replicando na glândula salivar do Culex. Eles também identificaram várias sequencias genéticas do vírus em diferentes tecidos do mosquito com técnicas de biologia molecular.
“Se a gente comparar com todos os artigos que saíram sobre o assunto, esse é o artigo mais completo, com o maior número de evidências”, diz Wallau.
O pesquisador aponta que é a primeira vez que se faz um sequenciamento genético do vírus a partir do Culex. O sequenciamento do Zika a partir do Aedes foi feito por um grupo nos Estados Unidos.
O achado pode influenciar políticas públicas voltadas para o controle do mosquito. A Fiocruz agora pretende mapear o comportamento do pernilongo no meio ambiente para entender se o Culex de fato tem o mesmo poder de transmissão que o Aedes.
Evidência anterior foi contraditória
Até agora, pesquisas sobre se o pernilongo seria um possível vetor do zika foram dúbias — enquanto alguns estudos demonstraram que o Culex não transmite o vírus, um artigo recente publicado no mesmo periódico indicou que o pernilongo coletado em áreas urbanas da China foi infectado com cepas locais do vírus zika.
O pesquisador da Fiocruz explica que são muitas as razões para a inconsistência entre os estudos, e que diferenças na capacidade de um mosquito ser ou não vetor são comuns.
“Pesquisas com o Aedes também indicam diferenças na capacidade de transmissão”, explica o pesquisador.
Uma das explicações para essa diferença é a grande variabilidade genética entre os mosquitos — o que influencia na capacidade tanto do Culex como do Aedes serem vetores. “Sabemos que características genéticas podem bloquear a capacidade do mosquito transmitir o vírus.”
Outro ponto são as diferenças geográficas. Alguns estudos coletaram Culex dos Estados Unidos, por exemplo, enquanto que os mosquitos do estudo da Fiocruz foram coletados em Recife.
O grupo da Fiocruz de Pernambuco tem grande conhecimento sobre o comportamento do Culex, já que, em Recife, há um problema de saúde pública com a filariose, também conhecida como elefantíase e transmitida pelo pernilongo. A filariose tem por característica o inchaço de peles e tecidos.
No Recife, já existe uma política pública de controle do Culex, que se multiplica em matéria orgânica. Uma das ações públicas para o controle do pernilongo é, por exemplo, um melhor manejamento do lixo orgânico na cidade.