o mundo mágico das redes sociais, onde ninguém tem dor de barriga ou paga boletos, onde os empregos são sempre dos sonhos e, invariavelmente, o aeroporto é “a segunda casa” de uma turma abundante, existe um espaço relevante para as oportunidades profissionais.
Há uns bons anos, LinkedIn, Facebook, Twitter e Instagram têm sido o canal principal para profissionais de idades, áreas e motivações diferentes se conectarem diariamente com recrutadores, empregadores, RHs e especialistas, em busca de vagas ou simples orientações.
Uma pesquisa do CareerBuilder de 2017 revelou, à época, que sete em cada dez empregadores já se valiam das redes sociais para rastrear possíveis contratados. E a tendência era de alta.
Além da sondagem, as plataformas são excelentes ferramentas para recrutamento: de acordo com a Betterteam, quase 95% dos headhunters usam as redes para postar e promover vagas.
O que deveria servir apenas como celeiro de oportunidades e de promoção de carreiras, contudo, vem funcionando na contramão para um número expressivo de profissionais que, sem saber lidar com a hipervisibilidade, mancham e destroem suas trajetórias numa rajada de cliques.
O Calcanhar de Aquiles, aqui, atende pelo nome de “sincericídio” – neologismo que resulta da junção das palavras “sinceridade” e “suicídio” e que significa “ser excessiva e agressivamente sincero, causando danos desnecessários e irreparáveis a si próprio”. Em suma: ser burro.
Em tempos de feridas abertas pela polarização política e ideológica e bandeiras distintas a serem defendidas, as redes sociais tornaram-se o ralo que dá vazão ao ódio que sai pelos poros dos desequilibrados, misóginos, homofóbicos, xenófobos e racistas, entre outros haters típicos.
Acontece que essas pessoas todas possuem – ou estão à procura de – empregos e, sem se dar conta, ao optar pelo discurso de ódio em posts e comentários, minam instantaneamente a sua reputação profissional.
E perdem oportunidades.
“Sem dúvida nenhuma, verificamos as redes sociais e os comentários dos candidatos a vagas aqui no McDonald’s. No mercado, todo mundo faz isso. O ponto de cautela é que a interpretação de um só comentário é muito rasa e superficial. Então, não tomamos a decisão de incluir ou não um candidato em nossos quadros em função de um comentário isolado. A busca nas redes sociais é informação para entrevistas, para conversar e entender melhor os pontos de vista daquela pessoa”, diz Marcelo Nóbrega, diretor de Recursos Humanos da Arcos Dourados – McDonald’s e autor de Você está contratado! (Editora Évora).
“É claro que, se eu tenho uma pilha de CVs, por comparação, pode acontecer de um candidato ser eliminado mais rapidamente porque tem um comportamento nocivo. Em qual situação? Se esse comportamento for contínuo e recorrente”, completa Nóbrega, que nos últimos 30 anos conduziu milhares de processos seletivos, de aprendizes a CEOs.
Só no Brasil, o McDonald’s tem 30.000 funcionários e cerca de mil são contratados todos os meses.
“Cada vez mais, o mundo virtual e o mundo real estão conectados e o nível de influência vindo primeiro permeia as reações no segundo”, observa Tais Cundari, headhunter, VP e partner da Fesa Group, e responsável pelo atendimento aos segmentos de Varejo e Serviços.
“Pelas redes sociais, fica fácil investigar a vida de um profissional e saber o que ele faz em seu tempo livre, quem são seus amigos e como se comporta em relação a temas polêmicos. Sem dúvida, se este tiver um comportamento inadequado online, ele pode, sim, ser prejudicado com uma não recomendação para uma promoção ou até com uma demissão.”
Se a rede social virou parte do processo de contratação e não há como voltar atrás, qual o espaço para a autenticidade?
“Acho importante que todos sejam autênticos em seus comentários, até porque só assim este profissional terá a oportunidade de ingressar em uma empresa que tenha fit cultural com seus valores. Por outro lado, hoje vemos excessos, uma espécie de ringue onde não se respeitam as opiniões contrárias. Este tipo de comportamento é tóxico e deve ser evitado. Daí torna-se cada vez mais importante que as pessoas compreendam o que é ser assertivo, colocando a sua opinião e respeitando sempre a do outro”, conclui Tais, da Fesa Group.
Somos também aquilo que postamos e as empresas exigem, cada vez mais, reputação e pegadas digitais limpas.
Por isso, antes de publicar um comentário ofensivo, uma foto discriminatória (ou se divertindo, enquanto você deveria estar trabalhando), de compartilhar informações confidenciais ou reclamar em público sobre o seu trabalho, pense na imagem que você está passando em público e nas implicações jurídicas de seus atos.
E tenha em mente um ditado antigo e sempre atual: “Galão que leva querosene nunca perde o cheiro”.
O comentário preconceituoso de hoje pode emergir anos mais tarde, em outro contexto, e viralizar, impedindo um avanço seu em um processo seletivo ou até contribuindo com um eventual desligamento do projeto.
Você pode até se esquecer daquilo que postou. A Internet, nunca.
Fonte:Época e Negócios