(Divulgação)

Em dezembro de 2015, a então presidente Dilma Rousseff chegou ao fim do ano aparentemente fortalecida e capaz salvar o mandato. No Ano Novo de 2016, analistas questionavam se o impopular Michel Temer seria capaz de sobreviver até o próximo réveillon. No final, Dilma caiu e Temer sobreviveu a três episódios que por pouco não lhe custaram o mandato. Fazer qualquer exercício de previsão no Brasil tem sido um desafio considerável nos últimos anos.

Uma das únicas certezas políticas para 2018 são as eleições. Embora postos de governador, senador e deputados federais e estaduais também estejam em disputa, as atenções devem se voltar para a corrida pela Presidência e a substituição de Temer. E assim como ocorreu com o cenário político, várias incógnitas embaralham as previsões.

No início de 2014, outro ano de disputa presidencial, a Lava Jato não existia, a economia ainda não havia entrado em marcha ré, o senador Aécio Neves era uma figura popular, Dilma havia deixado claro que tentaria a reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva era considerado um estadista de prestígio praticamente incontestável. O dinheiro sujo de empreiteiras e de grandes empresas ainda irrigava campanhas, e a polarização política ainda era concentrada na clássica rivalidade PSDB x PT.

Já neste ano, a economia continua a passos lentos. A disputa que se avizinha tem seu líder nas pesquisas, Lula, em uma situação legal precária e um presidente impopular que terá dificuldades para influenciar diretamente na escolha do seu sucessor. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) tenta ocupar o espaço de Aécio Neves, mas o tucano paulista ainda patina nas pesquisas. O PT e o PSDB também sofreram com escândalos nos últimos anos.

Ocupando o segundo lugar nas pesquisas, um radical de direita, Jair Bolsonaro, tenta dissipar dúvidas se a sua candidatura é realmente competitiva. Há ainda o risco de pulverização do cenário, repetindo o que aconteceu em 1989, quando duas dezenas de concorrentes se apresentaram. O dinheiro das empresas, por sua vez, foi proibido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e a polarização e guerras culturais se expandiram para outros aspectos da sociedade.

O fator Lula e a recomposição do establishment

“Nem mesmo o grid de largada da eleição está definido. A começar pelo primeiro colocado nas pesquisas. Ninguém á capaz de afirmar se Lula será candidato ou não. Nem mesmo, individualmente, cada um dos membros da Justiça, envolvidos com seu processo”, afirmou o cientista política Carlos Melo, do Insper.

A candidatura de Lula, que aparece com mais de 30% das intenções de voto em algumas pesquisas, por enquanto parece depender do resultado de um julgamento. Marcado para o dia 24, o caso envolve o recurso do petista em relação a sua condenação pelo caso do tríplex no Guarujá. Ainda não se sabe se o petista será mesmo impedido de concorrer com uma eventual nova sentença desfavorável, mas sua candidatura pode ficar vulnerável.

Em um cenário com o petista enquadrado na Lei da Ficha Limpa, aumentam os temores de que o radical Bolsonaro assuma a liderança ou de que o espaço seja ocupado por aventureiros. Segundo o analista Oliver Stuenkel, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), com Lula fora da disputa, pode ocorrer um cenário de pulverização, distribuindo os votos do petista em diversas candidaturas no primeiro turno, repetindo o que ocorreu em 1989.

No entanto, Stuenkel aponta, que o establishment político, mesmo acossado pela Lava Jato, ainda demonstra força para influenciar a disputa, e que nas eleições deste ano ainda não haverá vez para radicais como Bolsonaro e eventuais outsiders fora do universo político.

“Os partidos tradicionais ainda não implodiram como na França, o que abriu espaço para um Emmanuel Macron. Eles ainda contam com dinheiro, influência e a presença nos Estados e municípios que são fundamentais em uma disputa nacional. Não é a vez dos paraquedistas na política”, disse.

Stuenkel aponta ainda que, mesmo com o cenário marcado pela imprevisibilidade e pelo radicalismo, um candidato que se promove como alternativa de centro e faz parte de uma velha máquina partidária, como Alckmin, deve terminar como vencedor por ter mais capacidade de aglutinar diferentes forças. Portanto, algo com que um Bolsonaro ou um novato não contam.

“É mais provável um cenário chileno, em que parece não ter mudado nada e em que um político tradicional [Sebastián Piñera] venceu. No entanto, alguma renovação deve acontecer, como no Chile, em que surgiram novos movimentos na sociedade. No Brasil, devemos ver a mesma coisa, só não vai ser desta vez que eles vão assumir o protagonismo. Isso deve ficar para 2022”, diz.

Por fim, Stuenkel aponta que mesmo a possível vitória de um candidato de centro não será suficiente para frear a polarização da sociedade brasileira, que só se acentuou depois das eleições de 2014.

“Uma eleição não necessariamente acalma as coisas. Basta ver o que aconteceu nos EUA a partir de 2008. A vitória de Barack Obama, um candidato de centro, deu início à radicalização de grupos opositores, um fenômeno que culminou em 2016 com Donald Trump”, conclui.

Carlos Melo, do Insper, concorda. “Há poucas esperanças de que a eleição, com o cardápio de candidaturas que se tem, venha a consertar o processo desses anos tortos.”

Sem perspectiva de renovação do Congresso

Mesmo acossada pela Lava Jato, a classe política conseguiu se defender. As próximas eleições não vão contar oficialmente com o dinheiro das empresas, mas deputados e senadores conseguiram desenhar novas regras que devem ajudar a manter seus mandatos.

Entre elas estão a criação de um bilionário fundo eleitoral, que vai distribuir gordas fatias para os partidos que já possuem bancadas na Câmara, e a diminuição do tempo de campanha, que beneficia candidatos já conhecidos. As propagandas caras com imagem de cinema devem sair de cena, mas o tempo de TV ainda vai ser dominado por velhos rostos.

Um estudo do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) projetou um índice menor de renovação do Congresso nas próximas eleições, abaixo da média de 49% dos últimos cinco pleitos. O grupo ainda aponta que mais deputados e senadores devem tentar a reeleição do que em pleitos anteriores. O motivo: manter o foro privilegiado.

“O desgaste dos atuais detentores de mandato certamente irá diminuir suas votações individuais, mas não terá o condão de evitar a reeleição. E quem não conseguir se reeleger terá sua vaga ocupada, majoritariamente, por ex-prefeitos, ex-governadores, ex-deputados federais, estaduais ou distritais, ex-vereadores, ex-secretários, ex-ministros, por endinheirados, por parentes de caciques regionais e por celebridades, como os jogadores de futebol”, afirmou Antônio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Diap.

A saída de Temer

Temer chega ao seu último ano de mandato ainda mais distante da sua promessa de compor um ministério de “notáveis”. Nos primeiros dias de 2018, ele nomeou Cristiane Brasil – notável apenas por ser filha do cacique partidário Roberto Jefferson, protagonista do escândalo do mensalão – para a pasta do Trabalho, acentuando o fenômeno de troca de tecnocratas ou políticos de expressão nacional por membros do baixo clero do Congresso.

O presidente também voltou a aumentar o número de ministérios, criando pastas sob medida para figuras como Moreira Franco, que garantiram a concessão de foro privilegiado para aliados. A partir de abril, o governo deve registrar um novo número de baixas, quando uma dezena de ministros deve deixar os cargos para concorrer nas eleições.

Desde que Temer assumiu, o governo aprovou duas grandes reformas importantes: o teto de gastos públicos e a reforma trabalhista. Mas as mudanças na Previdência ainda estão longe de serem concretizadas. A votação da emenda está marcada para 19 de fevereiro na Câmara. O Planalto já aceitou submeter uma versão mais leve do texto, mas consultorias internacionais apostam que é bastante improvável que o governo consiga aprovar qualquer versão. O assunto corre o risco de ficar para o sucessor de Temer.

Sem força para aprovar mais reformas conforme se aproxima o calendário eleitoral, que vai monopolizar as atenções do Congresso, o governo deve tentar capitalizar a melhora da economia. Segundo relatório da  Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), o Brasil deve crescer 2% em 2018. Para 2017, a comissão prevê que a economia brasileira avance 0,9%, pondo fim aos dois anos de recessão que marcaram 2015 e 2016.

Os números na economia, no entanto, não têm sido suficientes para tirar o governo do fosso da impopularidade. Com expectativas baixas, o Planalto chegou ao ponto de celebrar, em dezembro, o fato de a aprovação de Temer ter subido de 3% para 6%. O índice é mais baixo que os 9% de José Sarney no final de 1989, quando o país era castigado pela hiperinflação.

Fonte: DW