No último episódio do podcast Redepará, foi contada a história do senhor Carlos Marlicheschi e sua esposa e parceira, Ivone Teresinha Oliveira. Juntos, eles conheceram e adentraram no trabalho com as ostras, entenda melhor a seguir.
Ostras: das sementes à mesa com muito amor. Um processo que cumpre as etapas da cadeia produtiva. Passa pelo cultivo, pela reunião e trabalho de parceiros, pelo talento criativo, pelas receitas criadas na cozinha, pela comercialização e pela divulgação do resultado da culinária gourmetizada e harmonizada.
Trabalhar com a ostra é trabalhar com a natureza, de sol a sol, é a vida real. “Sinto um enorme prazer em acompanhar desde a colocação da semente até o crescimento total”, disse Carlos Malicheschi, produtor, empreendedor, comerciante e, atualmente, chefe de cozinha especializado em ostras. Para ele, a experiência diária com o manejo do cultivo, as peculiaridades da influência do meio ambiente e o comportamento de ostras são ensinamentos constantes e aguça a capacidade de observação que lhe trouxe conhecimento empírico sobre o assunto e momentos de grande felicidade.
A convivência com as ostras na vida de Carlos Marlicheschi vem desde a juventude, há 50 anos, quando conheceu o manuseio com o molusco ainda em Santa Catarina, no balneário de Camboriú em uma localidade chamada Laranjeiras, em um cultivo de ostras. No mesmo balneário também trabalhou em um restaurante de origem japonesa que mantinha nos pratos do cardápio a ostra.
Do sul para o Norte, depois de muitas empreitadas e já estabelecido no município de Salinópolis, no Pará, adquiriu no ano de 2009, a terceira barraca na praia do Atalaia que chamou de “Verde Mar”. O nome foi definido por conta da cor do mar que se destacou ao olhar para o horizonte em meio a imensidão do mar aberto. O colorido encantou o casal.
Logo os vendedores de ostras na praia do Atalaia chamaram à atenção e estimularam a retomada do contato com o produto despertando a vontade de voltar a trabalhar com o molusco.
Na ocasião, o casal conheceu o consultor do Sebrae, Sr Fernando Mariano, e em 2015, foram apresentados ao projeto de ostreicultura do Sebrae – Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, chamado “Ostra da Amazônia”, da Rede Nossa Pérola, que reunia produtores de ostras dos municípios de Curuçá, Maracanã, Salinópolis e Augusto Correa, formando uma cadeia de oito (8) associações que representavam o segmento econômico no estado do Pará. A Rede Nossa Pérola, naquela época, estava entrando em Salinópolis.
Estimulado por Fernando Mariano, Carlos Malicheshi iniciou a comercialização das ostras in natura e logo tomou a decisão em incluir ostras ao cardápio da barraca Verde Mar. Para garantir o produto, foi apresentado aos produtores Carlos Jorge Reis Cruz Então, e Miguel Edson Silva Reis e passou a comprar o molusco da Associação de Nova Olinda, em Augusto Correa, entidade com farta oferta de ostras de qualidade.
Com o aumento da comercialização de ostras vieram os problemas de logística que refletiram na aquisição continuada do molusco em municípios mais distantes. Ana Abreu, gestora do projeto “Ostras na Amazônia Negócios Sustentáveis” pelo Sebrae, recebendo às reclamações e percebendo a dificuldade do senhor Carlos em se deslocar constantemente para comprar as ostras, sugeriu que se tornasse um ostreicultor em Salinas. De imediato Carlos tomou um susto, mas não exitou em assumir o novo desafio em ter seu cultivo próprio de ostras para vender no seu restaurante e garantir o atendimento da própria demanda e não deixando faltar.
Ana Abreu apresentou o comerciante Carlos Malicheschi aos produtores que já estavam integrados à Associação de Aquicultores e Pescadores de Salinópolis (ASAPAQ) e o estimulou a se tornar um produtor de ostras da região do Salgado, em Santo Antônio de Urindeua. Carlos se filiou à entidade e tornou-se um produtor iniciante, porém, sua ascensão foi rápida.
Na associação, senhor Carlos logo começou a vender mais do que conseguia produzir, o que lhe obrigou a voltar a comprar ostras fora de Salinas. Ele decidiu por comprar o produto no mercado de Nova Olinda (Augusto Correa), em Nazaré (Curuçá) e também no município de Maracanã.
A demanda foi um estímulo para decidir pela compra de terras a fim de atender a produção própria. Tornou-se sócio do produtor José Adriano Fonseca da Costa e em 2018, levado por seu espírito empreendedor adquiriu junto com seu novo sócio, um sítio de 74 hectares, banhada pelo rio São Paulo na comunidade de Santo Antônio. A propriedade ganhou o nome de “Santuário das Ostras”.
O sítio é localizado próximo a área de Reserva Extrativista (Resex) integrada ao Instituto Chico Mendes, porém, para legitimar a produção de ostras, Carlos Malicheschi destacou que teve que adequar os projetos de cultivo de ostras conforme as determinações das leis ambientais vigentes. Em curto espaço de tempo, conseguiu aprovar três projetos de cultivo ligados ao Santuário das Ostras: na Cabeceira do rio São Paulo; um segundo projeto foi aprovado e implantado em parte na área denominada Poção, também no rio São Paulo e um terceiro projeto na enseada do Barro Amarelo uma localidade próxima as comunidades do Derrubadinho e São Paulino, ambas na bacia do rio Urindeua. Todos os projetos estão em execução.
Com o investimento no cultivo de ostras veio o empenho, o foco, o trabalho diário cada vez mais intenso, a disponibilidade de tempo, a capacidade de observação, o conhecimento adquirido em relação ao manejo. Segundo seu Carlos, tudo passa pelo respeito às forças da natureza, que determinam o clima, a movimentação da maré, a qualidade da água (nutrientes, salinidade e águas limpas).
Há 5 anos lidando com ostras, desde 2016, Carlos Malicheschi e Adriano Fonseca da Costa cresceram e hoje (2021) possuem uma produção baseada em mais de 800 mil sementes de ostras na propriedade.
A dupla de produtores começou com 100 mil sementes; em 2019, a colocação de sementes de ostras atingiu 500 mil unidades; em 2020, 600mil, em 2021, aproximadamente 800 mil e para 2022 a expectativa é atingir 1,5 milhão de sementes de ostras colocadas para crescimento. O cultivo do santuário das Ostras é visto como um dos mais promissores no Estado.
É preciso entender, no entanto, que apesar do crescimento relacionado ao número de sementes, existe uma perda natural entre 30% a 35% por conta da presença de predadores como o peixe pedra e peixe tipo baiacu, a sapecuara e o mexilhão, entre outros parasitas, todos predadores naturais. Outro item que contribui para perda de ostras está relacionado ao excesso de lama. Por conta da perda natural, a produção real de ostras vivas da propriedade Santuário das Ostras, em 2021 atingiu o quantitativo aproximado de 450 mil.
Carlos Malicheschi vem do setor privado, é um visionário agregador com ampla capacidade de organização de grupos e que acredita na força do cooperativismo como indutor de negócios. Além da produção de ostras, iniciou a produção de sementes próprias desde 2020. Atualmente, a dupla de sócios, Carlos e Adriano, gera trabalho direto a 10 famílias da região e estimulam trabalhadores do “Santuário das Ostras” a terem seus próprios cultivos como opção de rendimento a mais todo fim de ano.
Em função do crescimento do negócio e a fim de gerar novas possibilidades voltadas ao mercado nacional, Carlos Malicheschi, buscou em 2021, o início das tratativas com a Universidade Federal do Pará (UFPa), a Secretaria Estadual de Meio Ambiente entre outros órgãos para seguir em busca da certificação artesanal do produto ostra, junto Agência de Defesa Sanitária Animal e Vegetal do Estado do Pará – Adepará, que prevê a regularização da atividade da ostreicultura no Estado do Pará, através da portaria 3036 de 01 de agosto de 2017, que regulamenta a atividade técnica de “Identidade e Qualidade para Produção de Moluscos Bivalves Congelada para produção de Carne e Ostras Vivas”. O regulamento atende às exigências da Lei 7.565 de outubro de 2009, que trata da produção de produtos artesanais de origem animal e vegetal. A regulamentação gera novas possibilidades de comercialização, estimulando o aumento da produção e ganho para os produtores.
Em favor das etapas para buscar a certificação, a confirmação da qualidade da água na propriedade Santuário das Ostras, é mais uma etapa avançada. Segundo técnicos do Instituto Evandro Chagas, no Pará, às águas na localidade em questão possuem uma grau de limpeza em torno de 99%, fator essencial para adquirir qualidade ao cultivo de ostras que passam pelo processo de depuração nas águas em análise. A confirmação da qualidade ocorreu no primeiro trimestre de 2021.
O Santuário das Ostras é uma propriedade localizada em ambiente adequado para o cultivo do molusco. A qualidade da água, o manejo e a maré são elementos que influenciam no crescimento das ostras, por exemplo, quanto mais tempo imersa em água salgada mais propício o ambiente para o crescimento.
Carlos explicou que quanto maior a ostra maior valor agregado. As ostras passam por uma classificação. As ostras gordas, são as bem cheias e quanto maiores ficam, menor quantidade de ostras por “travesseiros”. De 70 a 100 mm as ostras estão em tamanho adequada para o consumo. Acima de 100 mm são consideradas como ostra máster – uma casca maior e uma carne mais espessa. Os produtores da região trabalham vislumbrando o valor agregado das ostras balizado pelo crescimento.
Com o apoio do Sebrae acompanhado do cenário favorável ao crescimento; uma produção de origem conhecida; a busca pela certificação artesanal em andamento e ainda com o incentivo de instituições como o Rotary 4720 e o Rotary Internacional tomou-se a decisão em implantar a Cooperativa de Ostreicultores do Estado do Pará, fato que aconteceu em outubro de 2021, reunindo, inicialmente mais de 20 cooperados. Carlos Malincheschi tornou-se o primeiro presidente da Cooperativa recém criada em Salinas.
Entre os benefícios da organização dos produtores, destaque para saída da informalidade. Eles se tornaram empreendedores do próprio negócio. Um exemplo de empreendimento que gera melhoria da qualidade de vida às famílias envolvidas e o crescimento da economia baseada no desenvolvimento de uma cadeia produtiva sustentável, ambientalmente correta e socialmente justa.
Em breve, os cooperados poderão se utilizar do beneficiamento do produto ostra a partir da aquisição de material, implantação do frigorífico de uso coletivo aos produtores, do acesso ao crédito e entre outras facilidades.
“Produtores ribeirinhos percorrem rotineiramente o caminho da produção de ostras”, disse Dionízio de Souza Sampaio, professor da Universidade Federal do Pará. “Um trabalho árduo que exige muita dedicação. Do cultivo ao prato, um longo caminho que merece destaque e visibilidade”, declarou o professor.
MANEJO DE OSTRAS
– Coloca-se as sementes em quantidade dentro das telas de 1 metro por 50 cm (travesseiro) e a cada 45 dias faz-se o manejo que implica na limpeza, retirada de ostras mortas e de invasores e a substituição de telas conforme o tamanho das ostras.
– É comum começar o cuidado das ostras em travesseiros com telas de 4 mm, 6 mm, 8mm, 14 mm podendo chegar a utilização de travesseiros com telas com até 21 mm, estágio, este, que as ostras já cresceram, portanto, espaçamento maior é necessário para uma lavagem adequada que garantirá a qualidade das ostras vivas.
– Conforme o crescimento da ostra, vai diminuído a quantidade de ostras nos travesseiros onde elas crescem e engordam (travesseiros).
– A ostra para ser comercializada deve ter de 40 a 70 mm, chamada de ostra baby; de 70 a 100 mm as ostras estão em tamanho adequada para o consumo. Quanto maior a ostra maior valor agregado. Acima de 100 mm são consideradas como ostra máster. Ganham valor.
Do cultivo à mesa do consumidor
O cultivo logo cresceu e a demanda também. Com a projeção senhor Carlos Malincheschi, seguiu em busca de mais qualificação e em 2018 retornou para Santa Catarina (SC) a fim de fazer um estágio dentro do Ostradamus, um dos melhores e mais famosos restaurantes do mundo especializados em ostras.
Eis que surgiu uma mestre de cozinha especializado em ostras e ele, Carlos Malincheschi, com base na criatividade, experimentação diária, qualificação e muito amor agregou múltiplas possibilidades de sabores às ostras.
A impressão que dá é que tudo se transforma em suas mãos. Carlos, ao descortinar as ostras encobertas por trás das duras carcaças consegue promover a leveza e a delicadeza de sabores quando às apresentam a públicos diversos para degustação em meio aos mais diversos cruzamentos de sabores das ostras com produtos regionais da floresta, da terra, dos rios e mares. O resultado é inevitável. O cardápio cai no gosto de mais e mais consumidores de ostras que se dizem encantados com o sabor diferenciado do molusco.
“Cozinhar é a arte de inventar e exige acima de tudo simplicidade, conhecimento e criatividade para transformar. Aliás, deliciosa arte! Uma verdadeira alquimia que precisa de energia para enfeitiçar e encantar diariamente aqueles que provam de suas criações gastronômicas. Quero fazer valer essa arte”, declarou o Rei das Ostras.
Hoje, Marlicheschi está conceituado entre os grandes produtores de ostras do Pará com um diferencial, tornou-se um mestre em pratos à base de ostras, sua especialidade. Assumiu o novo talento tornou-se um cozinheiro valoroso. Seu amor pela arte de cozinhar e por sua esposa, parceira de vida e de alma, o levou a criação, execução e divulgação de mais 100 receitas criativas, harmonizados e gourmetizados a base de ostras. Atualmente o produtor e cozinheiro também ´referendado como o Rei das Ostras.
Sua performance o levou a receber convites para eventos gastronômicos e turísticos. Sempre motivado e com a presença incondicional de dona Ivone, sua musa inspiradora para criação de pratos inovadores, nunca deixou de participar. Sua especialidade chegou aos olhos da imprensa e foi valorizado. Vários foram os prêmios que recebeu por conta da cozinha a base de ostras protagonizando pratos salgados e sobremesas (parte dessas receitas estão destacadas no livro).
Seu talento ganhou destaque no V Prêmio de Jornalismo de Turismo, Comendador João Marques dos Reis (2019), da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo (Abrajet Pará). Participou de eventos como Comidinha de Praia (todas as edições), Rota do Avoado, Circuito das Ostras, Sala de Negócios do Sebrae e Sessão Especial da Comissão de Turismo da Assembleia Legislativa do Estado do Pará e, entre tantos eventos que participou, em outubro de 2021, foi foco de atenção de jornalistas e comunicadores de todo Brasil que participaram do Encontro Nacional de Jornalistas e Comunicadores (Encomtur Pará), em Santarém.
O Pará reconhece a representatividade de Carlos Marlicheschi e acompanha sua história transformadora, certamente o turismo agradece por conta da significância que passou a ser para o segmento. Ele reúne em torno de si toda uma cadeia produtiva, movimenta a economia; gera trabalho, renda e negócios; contribui com a qualidade de vida de famílias; estimula o ir e vir de pessoas e promove o destino. Sem dúvida, uma importante referência para o turismo associado a produção e ao turismo gastronômico.
Veja o podcast aqui
por: redepará