
Desde o início do ano letivo de 2025, sete professores da Escola Municipal Polo Matas, localizada no quilombo Kalunga do Mimoso, em Arraias, têm vivido uma rotina desafiadora e precária para garantir o direito à educação dos estudantes quilombolas. Sem transporte para se deslocarem diariamente, os docentes estão morando, de segunda a sexta-feira, em barracas improvisadas dentro da unidade escolar, distante cerca de 120 quilômetros da zona urbana do município.
A denúncia, inicialmente foi divulgada pelo portal Brasil de Fato.
“Pegaram uma salinha bem pequenininha ali e colocaram os professores para morar. Prometeram fazer um alojamento e não fizeram”, relata Alexandre de Paula Meirelles, professor de História e coordenador pedagógico da Escola Estadual Girassol de Tempo Integral Agrícola David Aires França, que possui uma extensão funcionando no Polo Matas.
A reportagem diz que, além dessa pequena sala, outros dois espaços do prédio foram adaptados como dormitórios. Em um deles, três barracas dividem espaço com sapatos, roupas, toalhas e utensílios. Um fogão de duas bocas e uma cafeteira elétrica são usados para preparar refeições à noite, sempre do lado de fora. e ainda diz que o banheiro disponível é um cubículo localizado do lado de fora da escola, sem acabamento, pintura ou estrutura adequada.
“Na parte da noite, nossa alimentação nós fazemos juntos. Colocamos nosso fogãozinho lá fora e fazemos nossa janta”, conta uma das professoras, que pediu para ser identificada como Dalva. Durante o dia, os docentes fazem suas refeições com base na merenda escolar.
Promessa não cumprida de kitnets
Segundo Dalva, os professores foram contratados com a garantia de que teriam onde morar. “Fizeram até uma reunião garantindo que no mês de março, assim que iniciassem as aulas, estariam construindo três kitnets. Março já acabou, abril tá quase finalizando e por enquanto nenhum engenheiro e ninguém nunca foi olhar lá a área que está destinada à construção”, lamenta.
Transporte escasso e longas distâncias
Dos sete professores, cinco são contratados pela prefeitura e dois pelo Estado. Muitos não têm veículo próprio e dependem de caronas esporádicas ou transporte escolar para se deslocarem à cidade. A viagem de ônibus pode levar até três horas.
“Quem tem condições, vai. Quem não tem, tenta carona. Mas um carro exclusivo para nos trazer todo final de semana para a cidade, não temos”, afirma Dalva.
Sucateamento da educação quilombola
A escola Polo Matas atende aproximadamente 60 crianças e adolescentes. Até 2024, os alunos do território Kalunga do Mimoso eram atendidos em cinco escolas da região, mas a maioria delas foi desativada após a inauguração do novo polo.
Apesar de oferecer mais estrutura física, como mais salas e banheiro, a centralização causou um aumento drástico na distância percorrida pelos estudantes. Crianças enfrentam até quatro horas de deslocamento diário.
Em 2025, enquanto o calendário escolar começou em fevereiro em outras regiões, o Polo Matas só iniciou as aulas em março, com mais de 40 dias de atraso, devido à alegação da prefeitura sobre as más condições das estradas em época de chuvas.
“Ela [a prefeitura] falou das chuvas. Mas todo ano tem as chuvas, e a responsabilidade de deixar a estrada boa é da prefeitura”, critica Meirelles.
O que diz a prefeitura?
A Gazeta entrou em contato com o prefeito de Arraias, Herman Gomes de Almeida, que esclareceu que realmente não há alojamento, mas que pretende iniciar a construção assim que possível, pois depende de orçamento e do fim do período chuvoso. “Se fosse por mim eu já começava a construção segunda-feira, mas por enquanto não está dentro da possibilidade”, disse.
Herman ainda destacou que foi oferecido alojamento a 6km da atual escola, porém, os professores não aceitaram. “Foi oferecido para eles ficarem na outra escola, mas eles disseram ser muito longe, e transporte, eu não tenho condições de fornecer”.
“Outro ponto, eles colocaram as barracas, mas é dentro da sala de aula, não estão ao léu, estão em ambiente fechado”, esclareceu o prefeito.
*Os nomes de Dalva e Antonio foram trocados para preservar a identidade dos entrevistados.