A ave é a única da espécie e vive às margens dos rios da bacia Tocantins-Araguaia. O g1 conversou com um biólogo que falou mais sobre o pássaro.

 

Uma galinha? Um cuco? Não, uma catingueira. Essa ave diferentona faz parte da iconografia do Tocantins, estado que celebra 36 anos neste sábado (5). O pássaro que é de uma espécie típica da América do Sul chama atenção pela sua aparência com olhos vermelhos, um grande ‘topete’ e um sistema digestivo similar ao de uma vaca.

 

No Tocantins, ele pode ser avistado na região oeste, às margens dos rios da bacia Tocantins-Araguaia. Por isso ele faz parte das iconografias do estado. A ave é citada como um dos ícones tocantinenses no livro publicado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Veja aqui.

 

A catingueira também é chamada por outros nomes como cigana, jacu-cigano, hoa-zim, cigano, aturiá. Seu nome científico é Opisthocomus hoazin, que traduzido significa “pássaro grande com cabelo comprido para trás”.

 

Cigana, pássaro também conhecido como cantingueira, e sua iconografia — Foto: Renato Torres Pinheiro e Sebrae Tocantins

 

Em entrevista ao g1, o biólogo e professor da Universidade Federal do Tocantins (UFT), Renato Torres Pinheiro, também explicou que a origem da ave pode ter conexão com uma espécie que viveu no continente africano há mais de 20 milhões de anos.

 

“Essa espécie foi descoberta na América do Sul há mais de 200 anos. Porém esta e muitas outras espécies de aves brasileiras e sul-americanas possivelmente tiveram sua origem na África. Importante lembrar que a África e América do Sul se separaram há 100 milhões de anos, mas mesmo depois da separação dos continentes algumas espécies podem ter chegado até aqui voando ou flutuando em balsas naturais, mas ainda são necessários mais estudos para comprovar essa teoria”, explicou.

 

Além da origem, o parentesco da cantingueira também é discutido entre os cientistas. O pássaro é um animal único! Isso porque, segundo o biólogo, só há ele na sua espécie da ordem Opisthocomiformes, família Opisthocomidae.

 

“Ainda há controvérsias sobre seu parentesco, alguns pesquisadores a colocam próximo à família das galinhas, outros dizem que se assemelham aos cucos”, contou Renato.

 

Digestão de uma vaca?

 


Cigana é um pássaro sul-americano — Foto: Ananda Porto/TG

 

A ave se alimenta de folhas e flores e para fazer a digestão delas possui papos que chegam a ser maiores do que o próprio estômago.

 

“Sua dieta é vegetariana, ou seja, alimentam-se principalmente de folhas novas, mas podem comer flores e frutos de plantas que crescem na beira dos rios. Para digerir esse material, a cigana possui um interessante sistema de papos bem fortes, capaz de fazer a trituração mecânica dos vegetais. Os papos chegam a ser até 50 vezes maiores que o estômago do animal”, contou Renato.

 

E é justamente por causa do seu sistema digestivo que a catingueira é conhecida por ter um odor forte, semelhante ao cheiro de esterco. O biólogo explica que para digerir a massa de folhas, a ave é auxiliada por bactérias que também são encontradas no gado.

 

“A garganta e o papo da cigana servem como câmaras de fermentação. Dentro dela, há bactérias especializadas que iniciam o processo de quebra do tecido da planta. A digestão da massa de folhas é auxiliada por bactérias simbióticas, como acontece nos mamíferos ruminantes. É nesse processo de fermentação que se forma esse odor característico. Isso faz com que esta ave tenha cheiro de esterco de vaca fresco ou feno com cheiro adocicado”, disse.

 

Ribeirinhos

 

A cantingueira vive nas vegetações ribeirinhas. Elas costumam ficar em grandes colônias, exceto no período reprodutivo. Quando botam ovos, elas formam ninhos por gravetos na forma de uma tigela acima da água. A incubação dura cerca de 30 dias.

 

Jacu-cigano em rio do Tocantins — Foto: Renato Torres Pinheiro/Divulgação

 

Por ser uma ave ribeirinha, elas também usam a água para se proteger de predadores.

 

“Os filhotes quando sentem a presença de perigo ou de um predador pulam na água, por isso os ninhos são construídos em galhos sobre a água. Nossos estudos nas margens do rio Javaés mostraram que em anos de cheia intensa, alguns ninhos podem ser inundados com a subida do nível da água, causando a perda dos ovos. Por aqui o período reprodutivo ocorre entre o final de dezembro a abril”, explicou Renato.

 

No Brasil, a maior parte vive na região amazônica, mas a ave também pode ser encontrada no norte, centro-oeste, no estado de Goiás e em parte do Pantanal mato-grossense. Já no exterior, o pássaro é visto nas Guianas, Venezuela, Colômbia e Bolívia.

 

Ovos da cantingueira em ninho às margens de rio — Foto: Renato Torres Pinheiro

 

Segundo o biólogo, a espécie não é ameaçada de extinção, mas por causa do desmatamento suas populações são impactadas.

 

“O avanço da agropecuária, que provoca desmatamentos e queimadas, além da caça em algumas regiões, acabam impactando algumas de suas populações”, disse.

 

(Fonte: g1 Tocantins)