Inspirados na trajetória da líder das trabalhadoras rurais da região do Bico do Papagaio, Dona Raimunda Quebradeira de Coco, falecida em novembro de 2018, estudantes da Escola Estadual Raimundo Nonato Leite desenvolvem o projeto de valorização da cultura das quebradeiras de coco: “Dona Raimunda do Coco, uma palmeira em nossas vidas”. O projeto é desenvolvido com os alunos do 7º ano do ensino fundamental à 3ª série do ensino médio e prevê a publicação de um livro.

Estudantes fazem visita de campo para realizar entrevistas com as quebradeiras de coco. Divulgação Seduc/Governo do Tocantins

Localizada no povoado Olho-d’água do Coco, município de Sítio Novo, a unidade de ensino conta com filhos e netos de quebradeiras de coco matriculados, que pouco conhecem a cultura do seu povo e que, por não conhecerem, não valorizam essa cultura. “A ideia é a gente estudar, pesquisar e escrever um livro, incluindo poemas e poesias”, apontou o professor do programa Novo Ensino Médio e idealizador do projeto, Milton Teixeira Santos Filho.

O projeto “Dona Raimunda do Coco, uma palmeira em nossas vidas” foi contemplado no Edital da Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e Assuntos Comunitários (Proex) n° 038/2019 de Premiação de atividades de Arte e Cultura em homenagem a “Dona Raimunda Quebradeira de Coco”, da Universidade Federal do Tocantins (UFT). A iniciativa contempla a proposta do Novo Ensino Médio.

As quebradeiras de coco foram convidadas para dividirem suas experiências com os estudantes. Divulgação Seduc/Governo do Tocantins

Etapas

Além da trajetória de Dona Raimunda, também tem sido usada como inspiração para o desenvolvimento das atividades a história do Pe. Josimo Tavares, que foi um dos companheiros de luta das quebradeiras de coco. “Já realizamos as oficinas de poesias, com o poeta maranhense Elson Araújo, um trabalho de campo em que os estudantes puderam fazer a escuta das quebradeiras”, ressaltou o professor.

Atualmente está sendo feita a sistematização do material produzido pelos alunos. “Após essa sistematização, vamos fazer uma pequena mostra para apresentarmos o desenvolvimento dos trabalhos. Aí vamos para a etapa final, em que daremos tratamento aos desenhos, correção dos textos e, por fim, a realização de um sarau, com o lançamento do livro e noite autógrafo”.

Participantes

Filha e neta de quebradeira de coco, a estudante Yaritsa Neves Sousa aprendeu o mesmo ofício das mulheres de sua família e, com o livro, ela sonha dar visibilidade ao trabalho de homens e mulheres do campo. “Uma das pessoas que conseguiu muita coisa foi dona Raimunda. Nós queremos falar sobre ela, pois ela nos representa. Queremos mostrar o trabalho duro das quebradeiras, a vida sofrida”, ressaltou.

A estudante Maria Gabriele Mendonça da Silva fez uma apresentação do que será o livro. “A publicação do livro é muito importante para nós, pois além de falar de uma das maiores quebradeiras de coco babaçu, ele conta com a participação de todos os alunos da escola. E é um livro cheio de poesia, versos, sonetos, cordéis. Com ele, a nossa escola também ficará conhecida em todos os lugares”, apontou.

Conhecedora da realidade das quebradeiras de coco, a estudante Danielle Velosa de Araújo teve a oportunidade de conversar com Dona Raimunda Quebradeira de Coco. “Chega a ser emocionante fazer as pesquisas mesmo depois que ela já faleceu, pois mesmo sem estudos, ela proporcionou muitas conquistas para as mulheres. Ela deixou a sua história como referência”, frisou.

Homenageada

Porta voz das quebradeiras de coco, dona Raimunda Gomes da Silva ou simplesmente Raimunda Quebradeira de Coco era a síntese das vozes que não se calam diante das injustiças dos poderosos. Filha de lavradores do sertão maranhense, em suas rugas, ela carregava as marcas de uma mulher de luta. Mãe de sete filhos, sendo um adotado. Casada, descasada, casada novamente, aposentada, despachada.

Moradora da comunidade Sete Barracas, em São Miguel do Tocantins, no Bico do Papagaio, com algumas companheiras, Raimunda organizou, em 1992, a Associação Regional das Mulheres Trabalhadoras Rurais do Bico do Papagaio (Asmubip). Elas começaram a promover encontros para discutir direitos – primeiro nos municípios mais próximos e, em seguida, nos estados vizinhos. Participaram, então, da fundação do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), que atinge os estados do Tocantins, Maranhão, Pará e Piauí.

Ao som do Xote das Quebradeiras: “O coco é para nós grande riqueza,/é obra da natureza, ninguém vai dizer que não./Porque da palha só se faz casa pra morar/Já é meio de ajudar a maior população”, música que ela gravou em um CD em homenagem a Chico Mendes, Dona Raimunda ganhou o mundo. Entoou esse hino ao babaçu na Conferência da Mulher na China, em 1995. Lá, ela também conquistou um chapeuzinho chinês e pôs-se a fazer repente nos corredores: “Vou-me embora dessa terra/ Que aqui não volto mais/ Que essa terra é longe demais”.

Ajudou a criar a Secretaria da Mulher Extrativista do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), da qual foi titular por dez anos. Mas o reconhecimento só viria anos mais tarde, ela recebeu o título de Doutora Honoris Causa da Universidade Federal do Tocantins e prêmios como o Diploma Mulher-Cidadã Guilhermina Ribeira da Silva (Assembleia Legislativa do Tocantins) e o Diploma Bertha Lutz (Senado Federal). Incansável em sua luta, Dona Raimunda não resistiu ao diabetes e se foi em 07 de novembro de 2018.